quinta-feira, 10 de março de 2016

Autores C

1.     CANDAU, Vera Maria:>Didática em Questão
2.     CANDAU, V. M.>Didática  Intercultural
3.     CARBONELL, J. >A Aventura de Inovar: A Mudança na Escola
4.     CARDOSO, Beatriz (Org.) >Ensinar: Tarefa Para Profissionais
5.     CARDOSO, M. S. > A Integração/Inclusão de Alunos com Necessidades Educativas Especiais: Implicações Psicopedagógicas
6.     CARRETERO, Mario > Construtivismo e Educação
7.     CARVALHO, Rosita E. > Removendo Barreiras para a Aprendizagem: Educação Inclusiva
8.     CARVALHO, Rosita E.> Educação Inclusiva:  Com os Pingos nos Is.
9.     CARVALHO, Rosita E. > Escola Inclusiva: A Reorganização do Trabalho Pedagógico
10.  CASTORINA, J.A > Piaget Vygotsky: Novas Contribuições para o Debate
11.  CAVALCANTI, Zélia > Os Cadernos da Escola da Vila
12.  CHAUI, Marilena > Convite À Filosofia
13.  COLL, Cesar > O Construtivismo Na Sala De Aula
COLL, C, MARCHESI, A; PALACIOS J. > Desenvolvimento Psicológico E Educação
14.  CORRÊA, Rosa Maria > Dificuldades No Aprender : Um Outro Modo de Olhar    
15.  COSTA, Marisa Varraber (Org.) > A Escola Básica na Virada do Século: Cultura, Política e Currículo
16.  CRAIDY, C;  KAERCHE G. E. > Educação Infantil, Pra que te Quero?
CANDAU, Vera Maria
Didática em Questão
No primeiro tema a autora Vera Maria Candau (13-24) com base na sua experiência pessoal, apresenta uma analise crítica da evolução do ensino da Didática, desde a década de 60 até hoje, aliada à Evolução político – social que passou e passa nosso país. Caracteriza as fases escolanovista, tecnicista e política, enfatizando a necessidade de uma Didática Fundamental que assuma a multidimensionalidade do processo ensino – aprendizagem e que profira suas três dimensões que são: humanista, técnica e político social, superando desta forma a Didática exclusivamente instrumental.
Ainda com relação ao primeiro tema, Cipriano Carlos Luckesi (25-34), caracteriza e descreve o educador contextualizado, construtor da história ressaltando o papel político da Didática.
         Carlos Alberto Gomes dos Santos (37-42), no segundo tema, levanta questões relativas aos pressupostos teóricos da Didática, especificando também que a Didática enquanto teoria e instrumentalização técnica não deve ser tratada isoladamente, mas dentro de determinado contexto.
O trabalho de Oswaldo Alonso Rays (43-52), com referência ao segundo tema, faz analise crítica dos programas de Didática por sua preocupação psicopedagógica e sua dimensão técnica pela ausência de espaço para críticas do modo de educar.
No terceiro tema, Zaia Brandão (55-65), chama a atenção para uma nova fase, a descoberta e proposição de alternativas didáticas visando o alcance da competência técnica por parte do professor que desta forma poderá superar a fase crítica da educação. Examina a didática que se ensina, a que os professores usam, os desafios do sistema de ensino, apresentando algumas reflexões que puderam subsidiar uma revisão do como se realiza a formação de professores. Ainda dentro do terceiro tema, a contribuição de Margot Bertolucci Ott (66-75), caracteriza criticamente a escola em seus diversos aspectos, e afirma que o aluno não é preparado para lidar com os problemas da comunidade que está inserida, trabalhando os problemas da comunidade que está inserida, trabalhando, ficando á margem do que acontece por não possuir o instrumental adequado para interferir.
Diz que a escola deve partir do contexto problemático em que a comunidade esta inserida, trabalhando problemas reais. Relata uma experiência de ensino por meio da solução de problemas, segundo a autora constitui uma alternativa válida para o ensino, uma vez que possibilita ao professor o alcance da competência técnica, além de sensibiliza-lo para o real.
No quarto tema, Menga Ludke, (79-93) contribui com a pesquisa em didática que reforça suas colocações descrevendo o caminho percorrido por dois pesquisadores americanos, Gage e Eisnes, com relação a seus estudos sobre o ensino, considera a pesquisa como fundamental na busca de novos caminhos e lista problemas que emergiram dos debates durante o seminário e que foram incluídas no texto, como sugestões à pesquisa.
Newton CesarBalzan, (94-117) também deu sua contribuição no quarto tema, faz colocações sobre a realidade educacional, pautando-se em dados coletados entre estudantes e questiona os cursos e especialistas da área, sugerindo alternativas para superar os problemas detectados.
No final da obra (119-128), traz o documento que foi analisado, debatido e aprovado na sessão plenária final do seminário, que contém as principais questões sobre cada um dos temas debatidos.
Concluindo, o livro tem o mérito de divulgar as ideias, preocupações e sugestões de um grupo de estudiosos da Didática, possibilitando, desta forma, o envolvimento de outros educadores.


CONVERSAS COM... SOBRE A DIDÁTICA E A PERSPECTIVA MULTI/INTERCULTURAL
[1]VERA MARIA CANDAU*
ADÉLIA MARIA NEHME SIMÃO E KOFF**
RESUMO: Focaliza como a perspectiva multi/intercultural está sendo incorporada pelos profissionais do campo da didática. A partir da análise de 20 depoimentos, discute-se como esses profissionais estão percebendo as contribuições e os temas que emergem quando se analisam as relações entre didática e multiculturalismo e também os riscos e os desafios inerentes a essa temática. Entre preocupações e possibilidades, os entrevistados apontam questões de particular importância, tais como: tensão entre social e cultural, articulação igualdade e diferença, bem como a problemática do universalismo versus relativismo cultural. São aspectos relevantes que vimos trabalhando em diferentes projetos de pesquisa, em particular no projeto Ressignificando a didática na perspectiva multi/intercultural, com o objetivo de ultrapassar uma visão dicotômica entre esses pólos. Nossa intenção é contribuir para a construção de uma didática crítica “atravessada” pela perspectiva multi/intercultural.
Vimos desenvolvendo, desde 1996, com o apoio do CNPq, uma linha de pesquisas que se vem desdobrando em diferentes projetos, cujo objeto central tem sido o estudo das relações entre educação e cultura(s) em diferentes espaços educativos, tendo por principal finalidade contribuir para o aprofundamento dessa problemática e oferecer elementos para que as práticas pedagógico-didáticas possam ser repensadas e/ou reinventadas, incorporando, de maneira crítica, a questão das diferenças culturais, na pluralidade de suas manifestações e dimensões.
Nesse contexto, o projeto intitulado Ressignificando a didática na perspectiva multi/intercultural desenvolveu-se motivado pela busca de respostas a questões como: O que significa uma didática “atravessada” pela perspectiva multi/intercultural? Como essa perspectiva está penetrando esta área de conhecimento? Que elementos básicos devem ser considerados na realização de um processo de ressignificação da didática nessa perspectiva?
Como trabalhá-los nos cursos de didática voltados para a formação inicial e continuada de professores?
Dada a abrangência e a complexidade destas questões, bem como a riqueza dos dados obtidos como fruto da referida pesquisa, propomo-nos a apresentar, neste texto, apenas uma análise parcial desses dados, procurando responder, principalmente, a uma de nossas questões – como a perspectiva multi/intercultural está sendo incorporada pelo campo da didática e, no caso específico, na visão de seus próprios protagonistas, ou seja, professores, pesquisadores e estudiosos do campo.
Assim, este trabalho tem como objetivo central apresentar e analisar como esses profissionais se posicionam com relação à construção de uma didática marcada pela perspectiva multi/intercultural. 
Perspectiva multi/intercultural: eixos de discussão
Muitos têm sido os suportes teóricos sobre os quais nos temos apoiado para fundamentar nossas reflexões, estudos e pesquisas. Vale dizer que inúmeros textos elaborados pelos diferentes integrantes de nosso grupo de pesquisa, e que se encontram à disposição para consulta, seja em anais de diferentes seminários e/ou encontros, dentre os quais destacamos aqueles relacionados aos ENDIPEs, seja em nosso próprio banco de dados (consultar http://www.gecec.pro.br), seja como artigos ou capítulos de livros (Candau, 2000; 2002; 2003; 2005), já apontaram os referenciais teóricos e/ou autores com os quais estamos dialogando desde o início do nosso trabalho e que têm servido para fundamentar nossas análises.
Todavia, consideramos oportuno e necessário apresentar, no âmbito deste trabalho, uma síntese, mesmo que breve, dos principais eixos sobre os quais vimos trabalhando. São eles:
a) globalização e multiculturalismo;
b) relação entre igualdade e diferença;
c) tensão universalismo – relativismo cultural; d) didática e perspectiva multi/intercultural.
Atualmente, o fenômeno da chamada globalização representa um verdadeiro quebra-cabeças para pensadores e cientistas de diferentes áreas do conhecimento. Parece-nos que não há como negar que se trata de uma realidade complexa, que nos afeta a todos e que não pode ser reduzida a uma única variável. Ao contrário, acreditamos que a globalização envolve diferentes dimensões – econômica/social, política, cultural, tecnológica, incluindo, neste caso, os avançados meios de informação e comunicação –, que se entrelaçam e não podem ser analisadas de modo isolado.
Vale lembrar que há autores os quais afirmam que se trata de um processo profundamente padronizador das sociedades, dos imaginários coletivos e das mentalidades. E que outros destacam que, porque gera resistência e uma renovada consciência das identidades culturais, a globalização provoca uma nova emergência e a mobilização de movimentos identitários de caráter local e internacional.
Por isso, reconhecemos que a globalização é um fenômeno complexo e plural. E em consonância com as reflexões e contribuições de Santos (1997), que nos alerta para o fato de que existem vertentes da globalização, que podem ser agrupadas em duas categorias, ou seja: uma globalização de “cima-para-baixo” que tende à homogeneização e outra de “baixo-para-cima” que reconhece a diversidade, assumimos uma perspectiva dialética e multidimensional para lidar com as questões da relação entre globalização e multiculturalismo, reconhecendo que não há uma só globalização e que, dependendo de suas características, ela vai se relacionar de diferentes maneiras com o multiculturalismo.
Entretanto, não podemos deixar de destacar que o processo de globalização de “cima-para-baixo” ainda é hegemônico, parece irreversível e vem suscitando muitas discussões, resistências e críticas radicais. Também inspiradas em Santos (2003), assumimos a ideia de que é preciso articular igualdade e diferença, entendendo que o que se opõe à igualdade é a desigualdade e à diferença é a padronização. “As pessoas e os grupos sociais têm o direito de ser iguais quando a diferença os inferioriza, e o direito de ser diferentes quando a igualdade os descaracteriza” (p. 10). E, neste sentido, acreditamos que é oportuno acrescentar que “não se pode pensar numa igualdade que não incorpore o tema das diferenças, o que supõe lutar contra todas as formas de desigualdade, preconceito e discriminação” (Candau, 2003, p. 6).
Quanto à tensão entre universalismo e relativismo cultural, de grande relevância para a ação educativa, em especial para as questões curriculares, entendemos que, nos dias de hoje, é preciso que nos situemos de maneira crítica, seja no que se refere aos chamados conhecimentos e valores universais, seja no que diz respeito ao relativismo cultural radical. O que estamos querendo afirmar é que é necessário, ao mesmo tempo, questionar a ideia da existência de conhecimentos e valores considerados universais (quase sempre centrados na cultura ocidental e europeia), e cuidar para não cair

Num relativismo absoluto, reduzindo a questão dos conhecimentos e valores veiculados pela educação formal a um determinado universo cultural, o que nos levaria inclusive a negar a própria possibilidade de construirmos algo juntos, negociado entre diferentes, e à guetificação. (Candau, 2003, p. 6)

Cientes de que existem diversos modos de entender o multiculturalismo e, consequentemente, modelos de educação multicultural, e, ainda, levando em conta diferentes conceitos de cultura e que esses conceitos e abordagens precisam ser permanentemente explicitados, nossos trabalhos de pesquisa, nesse contexto de intensa pluralidade de concepções, privilegiam a perspectiva intercultural. Neste ponto, vale afirmar que podemos encontrar na literatura um amplo debate sobre as diferenças e aproximações entre multiculturalismo e interculturalismo, bem como sobre seus impactos na educação. A respeito disso há uma série de reflexões, dentre as quais podemos citar as obras de Jordan (1996), Bartolomé Pina (1997), McLaren (1997 e 2000), Banks (1999), Forquin (2000), Abdallah-Pretceille (2001), entre outros, mas que no âmbito deste trabalho não nos cabe aprofundar. Todavia, consideramos oportuno destacar que, sintonizadas com Forquin, assumimos, que “o multiculturalismo é, de um lado, um dado da realidade – vivemos em sociedades multiculturais. Por outro lado, supõe uma tomada de posição diante dessa realidade, do ponto de vista teórico e das práticas sociais e educativas” (Candau, 2003, p. 18).
No que se refere ao interculturalismo, nós o consideramos
Como um enfoque que afeta a educação em todas as suas dimensões, favorecendo uma dinâmica de crítica e autocrítica, valorizando a interação e comunicação recíprocas, entre os diferentes sujeitos e grupos culturais.
A interculturalidade orienta processos que têm por base o reconhecimento do direito à diferença e a luta contra todas as formas de discriminação e desigualdade social. Tenta promover relações dialógicas e igualitárias entre pessoas e grupos que pertencem a universos culturais diferentes, trabalhando os conflitos inerentes a esta realidade. Não ignora as relações de poder presentes nas relações sociais e interpessoais. Reconhece e assume os conflitos procurando as estratégias mais adequadas para enfrentálos. (Idem, ibid., p. 19)
Educar na perspectiva intercultural implica, portanto, uma clara e objetiva intenção de promover o diálogo e a troca entre diferentes grupos, cuja identidade cultural e dos indivíduos que os constituem são abertas e estão em permanente movimento de construção, decorrente dos intensos processos de hibridização cultural .
Neste sentido, a abordagem intercultural que privilegiamos se aproxima do multiculturalismo crítico e revolucionário de McLaren (1997 e 2000), que parte da afirmação de que o multiculturalismo tem de ser situado a partir de uma agenda política de transformação, sem a qual corre o risco de se reduzir a outra forma de acomodação à ordem social vigente. Entende as representações de etnia, gênero e classe como produto de lutas sociais sobre signos e significações. Privilegia a transformação das relações sociais, culturais e institucionais nas quais os significados são gerados. Recusa-se a ver a cultura como não-conflitiva, argumenta que a diversidade deve ser afirmada “dentro de uma política crítica e compromisso com a justiça social” (1997, p. 123).
Nos últimos 20 anos, uma ampla produção científica tem sido desenvolvida na área de didática. E, com frequência, tal produção tem sido objeto de sínteses e análises críticas, apresentadas, especialmente, durante os Encontros Nacionais de Didática e Prática de Ensino – ENDIPEs. Neste sentido, Oliveira, durante o X ENDIPE, faz referências aos diferentes eixos que nortearam os vários simpósios realizados por ocasião do IX ENDIPE, em 1998, destacando um eixo sobre novos desafios às práticas em sala de aula, que representaria
Um anúncio de um espaço agora mais formalizado, para as questões atuais das novas tecnologias, a discussão do multiculturalismo e da educação para a cidadania e os direitos humanos. Essas questões vinham batendo às portas dos ENDIPEs, buscando conquistar espaço, desde o VII Encontro, quando já aparecem em alguns dos conteúdos de alguns dos estudos apresentados. (McLaren, 2000, p. 172)
A partir dessa afirmação, fica evidente o lento e recente processo de incorporação das questões relativas ao multiculturalismo nos estudos e nas pesquisas no campo da didática, podendo ser situadas a partir, praticamente, da segunda metade da década de 1990, já que o VII ENDIPE realizou-se em 1994.
Em síntese, estas são algumas anotações que expressam o suporte teórico que vem fundamentando nossas análises e que, no caso específico deste trabalho, ajudaram-nos a “olhar” para os depoimentos dos profissionais da área de didática, buscando perceber como as questões do multiculturalismo estão ou não sendo apropriadas por eles/elas e, se estão, como estão.
O caminho percorrido
Cabe aqui registrar que, do ponto de vista metodológico e no que tange à plena realização da pesquisa Ressignificando a didática na perspectiva multi/intercultural, adotamos diferentes e amplos procedimentos que incluíram a análise de conteúdos – no caso, dos trabalhos apresentados nas reuniões anuais da ANPED e nos ENDIPEs de 1994 a 2002 – e entrevistas individuais com diferentes especialistas – professores(as) e pesquisadores(as) do campo da didática –, assim como o desenvolvimento de um curso de didática para futuros(as) professores(as) atravessado pela perspectiva multi/intercultural, e inspirado na metodologia da pesquisa-ação.
Vale reiterar que vamos nos deter apenas na análise desses depoimentos que foram coletados, entre 20 profissionais, durante o XII ENDIPE, que aconteceu em Curitiba, em 2004, e durante a Reunião Anual da ANPED, realizada nesse mesmo ano, em Caxambu.
Para a seleção desses(as) especialistas foram adotados critérios que podem ser assim sistematizados: frequência significativa e contínua no GT de Didática da ANPED, participação sistemática nos ENDIPEs, comprovação de expressiva produção acadêmica na área e representatividade regional.
O roteiro utilizado nas entrevistas semiestruturadas foi objeto de um intenso e detalhado processo de elaboração com a participação de todos os componentes da equipe. As entrevistas foram realizadas após prévio contato via e-mail com os(as) professores(as) selecionados(as). Realizaram- se em um clima de diálogo e cordialidade, tendo em média uma duração de 60 a 80 minutos, sendo todas gravadas, com prévia autorização dos(as) entrevistados(as). As transcrições das fitas foram realizadas por diferentes membros da equipe e outros profissionais com preparação adequada, e foram revisadas pelas entrevistadoras, sempre que estas não foram as responsáveis pelas transcrições. Quando solicitado, enviou-se a transcrição aos(às) próprios(as) entrevistados(as).
Caracterização dos entrevistados
Nossos entrevistados podem ser assim caracterizados: quatro (4) professores e dezesseis (16) professoras que atuam em universidades públicas e/ou privadas nos estados de São Paulo, Rio Grande do Sul, Minas Gerais, Goiás, Paraná, Mato Grosso, Pernambuco e também em Brasília. Seus depoimentos foram realizados a partir de um roteiro semiestruturado de entrevista, em um clima marcado pela cordialidade, disponibilidade e pelo interesse em contribuir para o desenvolvimento da pesquisa.
São professores(as) que, em geral, possuem uma ampla experiência e uma trajetória profissional que, para um número significativo deles(as), tem aproximadamente 30 anos e está intimamente relacionada com o desenvolvimento do campo da didática, a partir, principalmente, do final dos anos de 1970 e início dos anos de 1980. Vários(as) deles(as) são protagonistas e atores centrais no processo de ressignificação da didática que emerge no contexto nacional nesse período. Há também um grupo de entrevistados(as), menos numeroso, que se inseriu no campo a partir dos anos de 1990. Contudo, é importante dizer que nenhum(a) dos(as) entrevistados(as) tem menos de 10 a 15 anos de experiência profissional.
Todos(as) têm doutorado em educação, dezesseis (16) realizados no Brasil e quatro (4) no exterior. A quase totalidade possui mestrado também na área de educação. Apenas um realizou o mestrado em filosofia, ao passo que um outro, que afirma ter feito o mestrado no exterior, não especificou a área. No que tange à formação de graduação, catorze (14) são licenciados em pedagogia, dois (2) têm dupla licenciatura – em pedagogia e em letras e em pedagogia e música – e um (1) em ciências sociais. Três (3) não mencionaram na entrevista as áreas de sua formação na graduação Neste sentido, podemos afirmar que as trajetórias acadêmicas são consistentes e todos(as) possuem uma formação avançada na área educacional. Um número significativo dos(as) entrevistados(as) cursou a escola normal e foi professor(a) do Ensino Fundamental.
Em geral, são professores(as) com ampla experiência de ensino de graduação em disciplinas como Didática Geral, Metodologias de Ensino, Práticas de Ensino, Trabalho Docente e outras afins. Também atuam na pós-graduação, lato e stricto sensu, e estão envolvidos(as) em projetos de pesquisa e outras atividades próprias do âmbito universitário (participação em comissões, funções de coordenação em diferentes níveis, projetos de extensão etc.).
Uma característica significativa do grupo entrevistado é sua inserção em diferentes associações profissionais, sua participação em comissões de órgãos federais como a CAPES e outros órgãos do MEC, o CNPq, assim como em órgãos de níveis estadual e municipal (secretarias de Educação, conselhos etc.) e organizações da sociedade civil.
Como se situam com relação ao campo da didática e à perspectiva multi/intercultural
Analisando os depoimentos, podemos constatar que o grupo entrevistado manifesta como tendência dominante uma forte identificação com o campo e sua evolução. Suas trajetórias parecem se misturar com as construções e tendências que vão marcando e/ou configurando a área de didática, principalmente a partir dos anos de 1970, quando muitos(as) deles(as) “começam” a contar suas histórias pessoais e profissionais.
Sobre o campo da didática
Na tentativa de melhor sistematizar as diferentes considerações feitas pelos(as) nossos(as) entrevistados(as) sobre o desenvolvimento do campo da didática, agrupamos suas reflexões em três períodos: anos de 1980, anos de 1990 e momento atual.
Assim sendo, observamos que a grande maioria deles(as) assinala a importância da década de 1980, podendo ser esta considerada o momento de uma verdadeira “refundação” da reflexão e pesquisa da didática no país. O significado do “movimento da didática em questão” e a relevância da perspectiva crítica parecem expressar um consenso na área.
Alguns(mas) entrevistados(as) apontam, também, a questão do confronto, na época, entre a pedagogia crítico-social dos conteúdos e a pedagogia libertadora como um aspecto marcante.
Os seguintes depoimentos expressam de modo significativo a postura que permeia o grupo como um todo:
O campo na década de 80 é um campo que busca muito a sua identidade.
Acho que é marcado pela busca da sua identidade.
Acho que o nosso movimento da didática acompanhou esse processo [dos movimentos políticos, sociais e culturais do final da década de 1970 e início dos anos de 1980], foi sujeito e objeto. Acho que ele não foi assim um fenômeno isolado, ele veio junto do que se discutia, se misturaram um pouco a nossa didática com a questão da CBE e depois mais tarde a ANPED e aquilo vinha num processo, assim, acho que foi um momento intelectual muito rico que a gente viveu no país com todas as suas tensões.
No campo da didática nos anos de 1980 eu tive a oportunidade de estar participando por dentro um pouco (...) num movimento muito forte, muito intenso que nós tivemos na década de 1980, sensacional, porque eu acho que a produção foi extremamente rica e nós tivemos várias elaborações e vários trabalhos que nos deram, embora tivéssemos objetivos comuns todos voltados para o desenvolvimento de uma proposta mais progressista de trabalho, essa busca de articulação de teoria e prática que era uma questão muito forte, e essa prática focalizando mesmo a prática social do sujeito Eu acho que a produção nessa época foi muito fecunda, ela se ampliou bastante, nós tivemos grupos significativos que trabalharam essas questões.
O início da didática em questão se deu em 1982 e 1983; foram os anos da crítica da didática. Na verdade, essa análise do campo da didática começou na década de 1970, já com aquele evento que houve em Brasília
(...). Assim, acho que esse movimento que começou em 1970, e depois ganhou muita força em 1980, veio culminar nisso que a gente está tendo aqui hoje (...). A primeira fase foi a da denúncia, da análise do que estava sendo o ensino da didática. A partir daí, toda a denúncia do tecnicismo.
Na sequência, acho que a didática passou por uma fase romântica (...), aquele sonho da transformação, a didática transformadora, que tem toda uma relação com a reorganização do país, abertura etc., e toda a movimentação social.
Na década de 1980, eu diria que a didática em questão, primeiro, para mim foi um marco muito grande em termos da sistematização, do processo ensino-aprendizagem, da multidimensionalidade do fenômeno educacional.
Acho que isso deu uma organizada muito grande no campo. Eu acho que, para boa parte dos professores, foi um indicador forte na identidade da didática, que estava ou tecnicizada ou receituada, não sei, mais ou menos isso, ou mesmo colocada na periferia.
Oliveira, membro da mesa-redonda que no X ENDIPE, realizado no Rio de Janeiro, foi dedicada à análise dos 20 anos de produção dos ENDIPEs, na mesma perspectiva, afirma com relação à década de 1980:
Pode-se constatar, então, o fato de que, para além das diferentes posições sobre o objeto de estudo das áreas, o que existe é um grande consenso. Ele se refere à luta em defesa da legitimidade do saber didático-pedagógico, enquanto constituindo um campo de conhecimento e enquanto conteúdo do currículo da formação do educador, no contexto da luta pela especificidade e importância do papel dos processos da educação e do ensino, no movimento de recuperação e democratização da escola pública e na transformação social. (2000, p. 164-165)
Quanto aos anos de 1990, percebemos nos depoimentos analisados uma menor convergência de ideias e, embora possamos dizer que há uma continuidade das reflexões em torno da perspectiva crítica, naquele momento, isso acontece de modo mais frágil. Sobre essa década, os(as) entrevistados(as) parecem concordar com o fato de que existe uma incorporação de novos temas, a partir de outros enfoques teórico-metodológicos, por exemplo: professor reflexivo, professor-pesquisador, identidade docente, questões relativas ao cotidiano escolar são temas que ganham força.
Poucos(as) apontam, nesse período, a permanência dos conflitos internos ao próprio campo, ao passo que outros(as) fazem referência à tensão e/ou confronto entre os campos do currículo e da didática. Para alguns(mas) entrevistados(as) começa a aparecer aqui o tema do multiculturalismo, mas ainda de modo bastante tangencial. Os depoimentos a seguir evidenciam estas posições:
Eu acho que foi uma fase de transição, no meu ponto de vista, porque, de repente, nós tivemos grandes acontecimentos que modificaram inclusive as bases referenciais e passou a se negar muitos referenciais até então constituídos para todos os trabalhos – vamos dizer assim, que era exatamente a questão do materialismo histórico-dialético, toda aquela referência mais marxista. E isso, de certa maneira, passou a ser negado, negado assim, pelo menos teve uma retração e (...) houve uma mudança nesse referencial, nesse momento. O que eu posso perceber é isso.
Eu acho que existe um avanço interessante na produção do conhecimento, reflexão, na busca de novos referenciais e agora nas últimas décadas, de 1990 ou da metade da década de 1990 para cá, tem todo esse movimento da reflexividade no trabalho do professor, na formação do professor.
Eu acho, assim, que dos anos de 1990 para cá, eu tenho percebido uma pulverização (num sentido positivo) de diferentes tendências. Surgiu um momento em que eu estava querendo discutir era mesmo esse objeto e tal...
Eu acho que... a impressão que eu tenho é de um diálogo muito grande com diferentes perspectivas.
Acho que continua essa perspectiva de tentar discutir um objeto da didática, mas eu acho que isso perde força com o tempo e isso fica claro, apesar de ser um tema que retorna, que aparece, mas você vê ali... é tanto uma articulação com as questões de currículo, com as questões de formação de professores, ora isso sendo discutido dentro do GT de didática, ora sendo discutido no GT de currículo, ora no GT de formação de professores.
É uma dificuldade muito grande de limitar, de não perceber essas relações, onde é que começa uma coisa e acaba a outra, principalmente nesses três campos.
E tem uma questão: acho que tem a questão toda ligada ao multiculturalismo e acho que isso aparece tanto na reflexão, nos trabalhos que a gente observa no GT, mas a gente vê as explicações, nas discussões por aí. Acho que tem toda a questão da teoria crítica que também vem via multiculturalismo, mas também tem outras aberturas que se dão, a partir daí, então, toda uma perspectiva de discutir, acho que vem muito mais pela questão do currículo, mas não deixa de estar presente na hora em que é discutida a didática, tanto que mais uma vez esses campos não estão muito limitados.
No que diz respeito ao momento atual, os depoimentos possibilitam- nos afirmar que é uma fase de muito menos confluências; alguns chegam mesmo a caracterizá-lo como um momento de “risco de dispersão”: “Eu prefiro dizer, com convicção, que há um risco de dispersão. Acho que é um risco de dispersão. Acho que até o momento estamos conseguindo sustentar uma espinha dorsal do campo do didático”.
Esta realidade está motivada, para alguns, por uma mudança de contexto e de referenciais teóricos:
Há uma mudança, digamos, de referencial e de contexto mesmo. Você está vivendo um novo momento agora, você já tem agora essa questão da globalização, essa questão do novo modelo, digamos, um novo momento do próprio capitalismo, com novos focos de exploração e tudo o mais, e isso muda toda uma expectativa global em termos assim “que trabalhador agora eu preciso formar? O que é importante? Qual o perfil desse trabalhador para dar conta desse momento? Etc.”. Para atender exatamente os interesses do capitalismo hoje, sempre. Então, claro que isso interfere, mas eu ainda não tive tempo para poder fazer essa elaboração, digamos.
Para outros, esse risco tem outras origens:
Mas vamos um pouquinho mais no tema do risco da dispersão. Eu tenho uma teoria pouco desenvolvida ainda que é a seguinte: no nosso país, já há uns bons anos, vem ocorrendo um processo extremamente desgastante para o campo da educação. A desqualificação econômica do magistério se projeta numa desqualificação social da profissão e acaba desqualificando o campo investigativo da área. Eu tenho essa teoria de que há algum tempo não tem dado prestígio estudar sala de aula, escola. Então, a dispersão temática que pode estar ocorrendo (...) se dá por razões de prestígio, na academia e tal, acabam largando a sala de aula. Porque falar didática é falar em sala de aula. E deslocam seus estudos para campos academicamente mais prestigiosos. E isso dá muito pano pra manga pra conversar (...). Quer dizer, a dispersão que está ocorrendo é menos teórica e mais social neste sentido, sociológica (...). Um outro fator desse risco de dispersão é o modismo.
É evidentemente que a nossa área é uma área demasiadamente submissa aos modismos (...). Se nós formos falar de dispersão temática, nós temos que criticar o campo da educação como um todo. Então, o risco da dispersão também existe à medida que segmentos de pesquisadores entram na onda do antimarxismo. Que eu acho que é uma questão também crucial. Porque, quando colegas nossos abandonaram ou flexibilizaram a sua relação com o marxismo, claro, você perde uma referência. Podia ser marxismo, podia ser outra, se houvesse outra. No nosso caso, era o marxismo.
Então, justamente por isso é que eu acho que a garantia de você segurar, vamos dizer, um núcleo duro da teoria didática está em não abandonarmos as questões epistemológicas.
Entretanto, as falas permitem-nos apontar certos elementos de continuidade, tais como: a perspectiva crítica, embora agora apareça com menos força e sob um olhar mais crítico da própria perspectiva; o cotidiano escolar; a tensão currículo-didática; e a formação de professores, com destaque para uma progressiva preocupação com as questões relativas à didática do Ensino Superior.
Por sua vez, novos elementos parecem “afetar” o campo da didática, segundo nossos(as) especialistas. São eles: a tentativa da retomada de uma visão tecnicista, em consonância com as atuais políticas de caráter neoliberal; a necessidade de busca de novos referenciais para lidar com novos contextos, novos sujeitos, novas problemáticas, como, por exemplo, a violência, os impactos provocados pelas novas tecnologias e pelos meios de comunicação de massa. Além disso, as questões relativas ao multiculturalismo ganham maior presença, seja quando apontam o tema da diferença como uma possibilidade de enriquecimento da reflexão e ação didática, seja quando destacam suas preocupações pelo deslocamento social para o cultural.
Nos últimos anos, a partir de 1995, 1996, a gente começa a perceber novas temáticas permeando essa discussão da didática, da prática de ensino. E quais são esses novos requerimentos que começam a aparecer? A questão da cultura, a questão dos diferentes saberes e também a questão da violência no espaço escolar e não-escolar, enfim, então são temas que começam a aparecer que antes a gente não via. E aí justamente toda a discussão do multiculturalismo, da questão da raça, da questão de etnia, de gênero, então começa a aparecer, ainda, eu diria, meio tangencial.
Acho que, depois de 1997, eu colocaria assim: uma visão de um sujeito histórico na área, os debates “didática e currículo”, onde o conhecimento científico e as questões epistemológicas foram fundamentais para a didática incorporar um pouco mais e repensar temas ligados às questões de cultura
(...). E você começa a ter uma nova agenda. Não é à toa que, se o ENDIPE de Águas de Lindóia foi a sala de aula; e se o ENDIPE de 2000 foi múltiplos olhares – então a palavra plural no multi (múltiplos olhares, múltiplas linguagens) –, se cria um cenário favorável. E o XI ENDIPE, qual foi o tema? Igualdade e diversidade.
Quando ocorreu esse deslocamento do social para o cultural – deslocamento mesmo: do contexto para o texto, da externalidade para a internalidade, de uma visão de totalidade para uma visão de particular –, na minha maneira de ver, ocorreu um reducionismo temático, quer dizer, a questão da didática ou do currículo hoje é a cultura.
Em decorrência desses dados, cremos que podemos afirmar que, em geral, nossos(as) entrevistados(as) não parecem situar-se numa relação de ruptura da perspectiva crítica, embora a adesão a ela seja menos enfática. Em contrapartida, um número significativo parece apontar para a necessidade de repensá-la e/ou ressignificá-la, em consequência dos novos desafios postos pela contemporaneidade.
Diante dessas nossas observações e/ou análises, somos provocadas a levantar algumas novas questões: Estaríamos vivendo um momento de crise paradigmática e/ou de desestabilização do campo? Trata-se de identificar germens da emergência de um novo paradigma1 ou de caminhar no sentido da ressignificação da perspectiva crítica?
No âmbito deste trabalho, acreditamos que é suficiente ou apenas possível fazer estas perguntas. Suas respostas, certamente, exigirão novas pesquisas e reflexões. Nossa intenção, neste caso, é apenas abrir mais uma porta para o debate.
Sobre as relações entre didática e multi/interculturalismo
Para alguns(mas) de nossos(as) entrevistados(as), apesar de o tema do multiculturalismo ter aparecido no campo da didática na segunda metade da década de 1990, ainda é hoje objeto de preocupação de poucos grupos e sua presença pode ser caracterizada como uma temática que se situa à margem, embora num movimento de afirmação.
O depoimento a seguir ilustra estas considerações. “Em geral eu acho que sim... Na didática é que está muito amarrado ainda. Eu acho que é um grupo muito pequeno ainda que está tentando... com sensibilidade para essa questão”.
Alguns(mas) entrevistados(as) observam também que o multiculturalismo afeta mais o plano teórico do que a prática educativa. E, neste sentido, estes outros relatos são bem expressivos.
Eu diria que sim, está presente no discurso profissional dos formadores e das instituições. Quando você tem o relato de como as disciplinas estão sendo desenvolvidas e de como os cursos estão sendo avaliados, eu não percebo isso (...). Em termos institucionais, no discurso está muito presente.
Agora, as práticas continuam as mesmas.
(...) quando você fala de multiculturalismo e didática, o fato de ainda estarmos nesse ponto que nós estamos [ela/ele está se referindo ao fato de o multiculturalismo ainda estar na academia e sob o domínio de poucos grupos], isso incomoda. Porque a didática exige uma ação prática. Só o discurso sobre o multiculturalismo não é suficiente para dizer a didática está assim... está assim...
Os(as) especialistas dizem também que o multiculturalismo está mais na academia que nas escolas. E, especificamente, mais na pesquisa que no ensino. Na escola ou no ensino sua presença é caracterizada como pontual.
Aprofundando essa relação entre didática e multiculturalismo, os(as) professores(as) e pesquisadores(as) entrevistados(as) ressaltam outros aspectos que cremos poderem ser assim explicitados: o multiculturalismo lida com um referencial teórico complexo e mais vinculado ao discurso da desconstrução. Além disso, seria necessário enfrentar a tensão entre Teoria Crítica, Multiculturalismo e Estudos Culturais. Para alguns (mas), o conhecimento organizado sobre multiculturalismo é algo recente, no entanto as discussões entre educação, escola, sociedade e diferentes grupos socioculturais já estariam postas pela teoria crítica.
Todavia, os(as) entrevistados(as) apontam, embora de modo bastante disperso, possíveis contribuições da perspectiva multi/intercultural, como, por exemplo: mesmo considerando que há diferentes visões sobre a diferença, ela está presente no cotidiano escolar e é preciso trabalhá-la. A perspectiva multicultural pode ajudar nesse enfrentamento, assim como pode auxiliar a compreender melhor como se dá o fracasso escolar.
Além disso, tal perspectiva favoreceria a retomada da discussão sobre os conteúdos escolares, ofereceria elementos para se trabalhar questões como violência e disciplina, preconceito e discriminação, bem como poderia desvelar questões étnicas e de gênero presentes na escola, ajudando a “ver” e “lidar” com as diversidades presentes na sala de aula e, neste sentido, ajudaria a romper com o que Cortesão e Stoer (1999, p. 56) chamam de “daltonismo cultural”.
E mais, estimula a ruptura com a homogeneização – lógica que configura de modo bastante cristalizado a cultura escolar e que, talvez, seja difícil de romper, já que a busca pela homogeneização das turmas, sabemos, é cultural e secular.
Outras contribuições estão associadas à possibilidade que essa perspectiva tem de despertar para as questões relativas às diferentes linguagens presentes no cotidiano escolar, bem como de articular o social e o cultural. Alguns depoimentos, em particular, parecem expressar o “tom” dessas contribuições: “O multiculturalismo é uma atitude, um modo de ver a realidade e a sociedade e, portanto, um olhar que impregna toda a prática pedagógica”; “Ele ajuda a ressignificar a prática didática”.
Em contrapartida, podemos ainda ressaltar que nossos(as) entrevistados( as) apontam alguns riscos no que tange à adoção de uma perspectiva multi/intercultural. Assim alguns(mas) deles(as) falam sobre o perigo de: ser um modismo, situar-se em uma lógica de importação, sem dialogar de modo mais profundo com as diferentes configurações do multiculturalismo na nossa sociedade; ser disciplinarizado e reduzido a um conhecimento específico; exacerbar a diferença, provocando certos antagonismos ou ficar somente no respeito à diferença, sem com ela dialogar; ficar no plano conceitual e esquecer de que a diferença é inerente à dinâmica concreta das nossas escolas e salas de aula; desvincular a dimensão cultural da questão social/de classe e, assim, absolutizar a questão multicultural.
Ao lado desses riscos, quando o tema é a relação entre didática e multiculturalismo, assinalam que alguns desafios podem também ser constatados. Quando, por exemplo, registramos depoimentos que apontam a necessidade de romper com a ideia de que a diferença é um problema, ou seja, uma dificuldade, uma vez que, no imaginário presente na cultura docente, a homogeneização seria um fator de facilitação do trabalho pedagógico. Outro desafio está associado à necessidade de buscar trabalhar de modo mais efetivo a articulação entre multiculturalismo e os chamados temas próprios da didática – planejamento, seleção de conteúdos, técnicas de ensino, avaliação etc. O que significa dizer que os estudos e as pesquisas sobre o multiculturalismo ainda não teriam afetado o núcleo central da didática e da prática pedagógica. Também se configuram como questões desafiadoras a concepção e a produção de materiais didáticos mais adequados.
Gostaríamos ainda de assinalar uma preocupação explicitada com maior veemência por um(a) de nossos(as) entrevistados(as). Trata-se da necessidade de enfrentar a discussão entre a função social da escola e o multiculturalismo, principalmente no que se refere à apropriação de conhecimentos.
(...) ainda não desmontei isso da minha cabeça... A melhor maneira das escolas ajudarem a democracia, dar instrumentos de luta para os pobres... A melhor coisa que a escola pode fazer é produzir alunos que tenham uma sólida formação científica, cultural e competências, capacidade de pensar, para poder se integrar ao mercado de trabalho, para poder participar politicamente e culturalmente da sociedade... Tudo aquilo que desfaz, tudo aquilo que não leva a isto, tudo aquilo que compromete isso... Tudo que é contra isso é excludente... Você pensa que são formas includentes, mas acabam sendo, novamente, políticas compensatórias.
E, mais especificamente, de enfrentar a tensão entre universalismo e relativismo cultural: “O relativismo cultural e ético é uma bomba na educação e na escola, e esse relativismo está penetrando na cabeça do professor... É uma bomba na sua cabeça...”.
Para concluir esta etapa de análise do material das entrevistas, cremos que ainda vale sublinhar uma outra tensão que nos parece também objeto das preocupações dos(as) especialistas. Ao mesmo tempo em que reconhecem a importância da dimensão cultural, estão sempre se referindo às desigualdades sociais, de classe, de oportunidades sociais e educacionais e de sua relação com o contexto de pobreza estrutural da sociedade brasileira. Parece-nos que o confronto social versus cultural está na base desses comentários, ora percebido como uma questão: “Será que no Brasil temos de falar de multiculturalismo ou de desigualdade social?”, ora como um desafio, já que tal perspectiva pode provocar-nos no sentido de mobilizar processos de articulação entre igualdade e diferença e não de considerá-los pólos contrapostos.
Considerações finais
Por intermédio da análise dos depoimentos dos protagonistas do campo da didática, é possível afirmar que o impacto da perspectiva multi/ intercultural é reconhecido por estes atores, apesar do seu aspecto ainda frágil e embrionário. Várias contribuições são identificadas no sentido de problematizar a cultura escolar dominante nas nossas escolas, de caráter homogeneizador e monocultural, e de enfrentar a questão da relação entre diferença e ação educativa. Afinal, como afirma um(a) dos(as) entrevistados( as): “A diferença está no chão da escola”. Esta expressão condensa de modo particularmente rico uma afirmação básica para a construção de uma didática na perspectiva multi/intercultural: a questão da diferença não é um componente externo, recentemente incorporado à reflexão pedagógica, mas um componente configurador de sua própria realidade.
Negada, naturalizada ou reduzida a uma dimensão psicológica ou social, a diferença é constitutiva da prática pedagógica. De fato, a questão da diferença na educação não é um problema inédito, tampouco se pretende ignorar as importantes teorizações já construídas a esse respeito. Como afirma Gimeno Sacristán, referindo-se a essa mesma discussão: “Não convém anunciar esses problemas como sendo novos, nem lançá-los como moda, perdendo a memória e provocando descontinuidades nas lutas para mudar as escolas” (2002, p. 15). No entanto, a reflexão atual enfatiza o caráter histórico e sociocultural da construção das diferenças. Elas se constituem no âmago das relações sociais, nas lutas por reconhecimento dos diferentes grupos sociais e étnicos. Neste sentido, a dimensão cultural adquire especial relevância.
Junto de uma posição de valorização das contribuições da perspectiva multi/intercultural, também são colocadas pelos(as) entrevistados(as) questões de fundo de particular importância. Queremos assinalar principalmente três: a articulação entre igualdade e diferença, a tensão entre o social e o cultural, assim como a problemática do universalismo versus relativismo cultural em suas relações com a escolarização.
Estes são aspectos que consideramos fundamentais e que vimos trabalhando em nossa linha de pesquisa na perspectiva da superação de uma visão dicotômica e da afirmação da necessidade de trabalhar estas tensões e a articulação entre esses diferentes pólos. Isso supõe um processo de desconstrução da visão dominante na cultura escolar, em que os chamados valores e conhecimentos considerados universais não são problematizados: muitas vezes são vistos numa abordagem a-histórica e consensual, a afirmação das variáveis de caráter social não é articulada com questões de etnia, gênero, grupo sociocultural de referência e orientação sexual, e a defesa da igualdade silencia e nega as diferenças.
Discutir esses temas, ser consciente de que a escola realiza uma seleção cultural que não é neutra, é uma tarefa urgente.
Neste horizonte de preocupações, afirmamos a necessidade de ressignificar a perspectiva crítica no âmbito da educação e da didática.
Não se trata de negá-la – nossos entrevistados e nós mesmas estamos arraigados nesta tradição –, mas sim de favorecer um processo de reconfiguração em que propomos que a perspectiva multi/intercultural constitua o eixo central desse processo. Para tal, tendo presente os depoimentos analisados, reafirmamo-nos em alguns componentes que consideramos fundamentais na construção de uma educação e de uma dididática na perspectiva multi/intercultural (Candau, 2005, p. 33-35):
Em recente trabalho, apresentado no II Seminário Internacional sobre Educação Intercultural, Gênero e Movimentos Sociais, promovido pela Universidade Federal de Santa Catarina, realizado em Florianópolis, de 8 a 11 de abril de 2003, enumeramos alguns dos desafios que temos de enfrentar se quisermos promover uma educação intercultural na perspectiva crítica e emancipatória, que têm emergido das pesquisas e dos trabalhos que vimos realizando. Foram agrupados em torno de determinadas ações que consideramos fundamentais: desconstruir, articular, resgatar e promover. São eles:
DESCONSTRUIR
- Penetrar no universo de preconceitos e discriminações presentes na sociedade brasileira.
Essa realidade se apresenta entre nós com um caráterdifuso, fluído, muitas vezes sutil, e está presente em todas as relações sociais.
A “naturalização” é um componente que a faz em grande parte invisível e especialmente complexa. Para a promoção de uma educação intercultural é necessário reconhecer o caráter desigual, discriminador e racista da nossa sociedade, da educação e de cada um(a) de nós. Desenvolver estratégias nessa perspectiva é fundamental.
- Questionar o caráter monocultural e o etnocentrismo que, explícita ou implicitamente, estão presentes na escola e nas políticas educativas, e Em recente trabalho, apresentado no II Seminário Internacional sobre Educação Intercultural, Gênero e Movimentos Sociais, promovido pela Universidade Federal de Santa Catarina, realizado em Florianópolis, de 8 a 11 de abril de 2003, enumeramos alguns dos desafios que temos de enfrentar se quisermos promover uma educação intercultural na perspectiva crítica e emancipatória, que têm emergido das pesquisas e dos trabalhos que vimos realizando. Foram agrupados em torno de determinadas ações que consideramos fundamentais: desconstruir, articular, resgatar e promover. São eles:
DESCONSTRUIR
- Penetrar no universo de preconceitos e discriminações presentes na sociedade brasileira.
Essa realidade se apresenta entre nós com um caráter difuso, fluído, muitas vezes sutil, e está presente em todas as relações sociais.
A “naturalização” é um componente que a faz em grande parte invisível e especialmente complexa. Para a promoção de uma educação intercultural é necessário reconhecer o caráter desigual, discriminador e racista da nossa sociedade, da educação e de cada um(a) de nós. Desenvolver estratégias nessa perspectiva é fundamental.
- Questionar o caráter monocultural e o etnocentrismo que, explícita ou implicitamente, estão presentes na escola e nas políticas educativas, e coletivos. O “empoderamento” começa por liberar a possibilidade, o poder, a potência que cada pessoa tem, para que ela possa ser sujeito de sua vida e ator social. O “empoderamento” tem também uma dimensão coletiva, trabalha com grupos sociais minoritários, discriminados, marginalizados etc
Nota
1. Entendemos paradigma, na perspectiva de Kuhn (1962), como “toda constelação de crenças, valores, técnicas etc. partilhadas pelos membros de uma comunidade determinada
(...). Um paradigma é aquilo que os membros de uma comunidade científica partilham e, inversamente, uma comunidade científica consiste em homens que partilham um paradigma” (p. 218-219).


[1] * Professora Titular do Departamento de Educação da Pontifícia Universidade Católica do
Rio de Janeiro (PUC-RIO). E-mail: vmfc@edu.puc-rio.br
** Doutoranda do Departamento de Educação da PUC-RIO.


CARBONELL, JAUME
A aventura de inovar: a mudança na escola

O primeiro capítulo “A inovação educativa hoje” do livro Aventura de Inovar enfoca a necessidade de inovação na escola, delineando os fatores que impulsionam e que dificultam o processo.
            A forma de discorrer sobre a inovação educativa num paralelo entre o passado, a necessidade do presente e a incerteza do futuro mostra um paradoxo com o conceito atual de modernização nas escolas.
            O texto de Carbonell inicia-se com uma crítica sobre a capacidade de sobrevivência da escola, apesar da crise em que sempre esteve no cumprimento contraditório do seu papel de controle da desigualdade social da cultura.
Embora não negue a existência de algumas mudanças na instituição escolar, o autor insiste na necessidade de um novo modelo formativo onde os seres humanos possam receber uma aprendizagem sólida, uma educação integral que o prepare para enfrentar criticamente o futuro incerto de produção acelerada do conhecimento e de mudanças imprevisíveis, isto tudo, com a escola sofrendo forte imposição do neoliberalismo onde a economia sobrepõe á cultura e a política. Mesmo considerando o poder do neoliberalismo o autor se reveste de esperança e afirma a possibilidade de experiências múltiplas e ricas iniciativas dos professores que escapam ao controle neoliberal. Não esquecendo que a escola é um espaço de confronto e de resistência em que é possível prosperar projetos inovadores.
Carbonell se mostra insatisfeito quando se refere à mudança ocorrida na escola, pois a caracteriza como epidérmica, muda o formato, a paisagem escolar, mas não modifica as concepções sobre o ensino e a aprendizagem. A tecnologia cumpre a mesma função dos livros, mesmo durante as insistências históricas das pedagogias inovadoras como os quatro pilares de educação definido pela UNESCO.
Antes de listar um quadro com treze elementos que compõe o processo de inovação educativa, o autor se preocupa em conceituar inovação como um processo de mudanças nas escolas e reforma como mudança na estrutura do sistema educativo em seu conjunto. Ratifica a sua insatisfação sobre o conceito de inovação atual, derrubando a ideia de que nem sempre a reforma é sinal de mudança ou melhoria e pode até atrapalhar, pois além de ser parcial, é de caráter apenas estrutural, lideradas e executadas por pessoas com visão do passado e as novas ideias demoram tanto chegar às escolas que quando isso acontece já se tornaram antigas.
É interessante a crítica tecida neste texto sobre a superficialidade da inovação, “centra mais no processo que no produto, mais no caminho que no ponto de chegada”.
Para o autor a mudança não é tão fácil, precisa ser abordada de forma sistêmica, inteirando diversas ações coordenadas e complementares que afetam toda instituição escolar, além de saber lidar com culturas, visões e interesses distintos dentro da equipe. Sem a colaboração de todos os agentes não há possibilidade de construir um projeto global e coerente de mudança na escola, mudanças essas que devem ocorrer continuamente, descobrindo sempre novas rotas. Ainda deve se levar em consideração a fase de turbulência e de descanso, de avanços e de recuo. Requer tempo e persistência para modificar práticas e atitudes incrustadas num processo ideológico e cultural.
O paradoxo da mudança é constantemente enfatizado neste texto, salientando que apesar do consenso de que as mudanças requerem tempo, na prática exige resposta de impacto que atende apenas ao imediato, com reformas verticais, concebidas de cima para baixo, onde uns planejam e outros executam mecanicamente. A situação se agrava com as dificuldades de estabelecer critérios de valoração e avaliação sobre o êxito, o fracasso, avanços e retrocessos.
Carbonell acredita que se as inovações forem planejadas a partir do coletivo tem mais possibilidades de êxitos continuado, porém não descarta, de às vezes, ocorrer necessidades de estímulos externos para despertar a equipe adormecida na rotina. As inovações têm de ser pensadas, geridas e realizadas autonomamente pelos professores e os espaços formativos são seus grandes aliados onde se produzem o maior grau de inovação.
Porém, para impulsionar a inovação é importante que a administração seja mais sensível ao reconhecimento e apoio das experiências de base e criem um clima mais favorável para a liberdade de ação docente e renovação pedagógica, uma vez que a principal força impulsora de mudança são os trabalhos dos professores de forma coordenada e cooperativa nas escolas.
No seu intercâmbio entre a crítica e propostas o autor assinala vários fatores básicos para promover a inovação e vale apenas citar pelo ao menos algumas delas: equipe receptiva e cúmplice que compartilha ideias e projetos; que coopera com outros professores e escolas formando uma rede de intercâmbio; clima de bem estar e confiança; inovações e mudanças como fazer parte da vida da escola; conquista de tempo e espaço para vencer os efeitos internos e externos das exigências administrativas e burocráticas; acompanhamento, valoração e avaliação dos resultados.
O autor insiste em alertar o leitor por todos os lados sobre o processo de inovação, agora citando os elementos que podem dificultá-la. Vejam alguns: debilidade no relacionamento interpessoal, ausência de compromissos firmes, falta de planejamento e coordenação, as condições de sua aplicabilidade, disponibilidade de envolvimento dos professores e seus saberes, resistência às mudanças, centralização excessiva, individualismo e duplo currículo.
Contrário ao que a maioria pensa coloca o conflito como um elemento imprescindível ao processo e extraordinariamente produtivo porque dá vida à inovação e faz com que apareçam as divergências. Ao se confrontar complementa-se e enriquece em benefícios da inovação. Essa, cheia de contradições é a oscilação entre o caráter reprodutor do Estado com seu poder e o potencial libertador da escola.
Com sua maneira simples e clara de expressar o autor consegue levar seus leitores à reflexão da necessidade de uma real inovação no processo educativo, sem panaceias e ilustrações, apontando críticas e vários caminhos possíveis, mesmo dentro das contradições do contexto.



Beatriz Cardoso (org.)
Ensinar: Tarefa para profissionais
Ensinar: Tarefa para profissionais é fruto de um árduo trabalho. Ele traz resultados do Programa Escola que Vale, uma parceria que existe desde 1999 entre a Fundação Vale do Rio Doce, o Centro de Educação e Documentação Comunitária (Cedac) e diferentes Secretarias Municipais de Educação, que hoje está presente em 23 cidades e tem como foco a formação de profissionais de educação. Mas o livro está longe de ser apenas o relato de uma experiência bem sucedida. Pelo contrário — Ensinar: Tarefa para profissionais vai muito além e difunde os conhecimentos adquiridos e sistematizados a partir da tal experiência bem sucedida. Organizado por Beatriz Cardoso, Delia Lerner, Neide Nogueira e Tereza Perez, o livro tem como recorte a formação de professores, uma das vertentes do Programa Escola que Vale. Beatriz Cardoso, educadora desde 1978 e doutora em educação pela USP, explica que as autoras do livro "têm origem na sala de aula" e que acreditam que a reflexão sobre a prática é fundamental.
Como foi o trabalho de compilação dos textos que compõem o livro? 
Foi trabalhoso encontrar o caminho adequado. Nossa ideia era colocar uma experiência concreta, o Programa Escola que Vale, à disposição para, a partir dela, produzir conhecimento pedagógico. Então, o manuseio de tanto material, relatos e relatórios demorou bastante. O "Escola que Vale" hoje está presente em 23 municípios e é voltado para a formação de profissionais de educação. Trabalhamos com a formação de diretores, de equipes técnicas de secretarias, de formadores, entre outros. Mas, para o livro, tivemos que fazer um recorte e nos debruçamos sobre a formação de professores. A produção em si durou em torno de um ano e meio. Nosso maior receio era que não tínhamos, como objetivo, apenas contar uma experiência bem-sucedida, não queríamos fazer marketing a partir do sucesso. Queríamos, sim, produzir um material que servisse para formadores de professores e outros profissionais da educação.  
Qual é a importância da formação continuada de professores, sobre a qual vocês se debruçam? 
Acreditamos que a formação continuada dos profissionais da educação é uma das frentes mais importantes para a superação do quadro educacional atual. É fundamental ter instâncias de aprendizagem permanente, reflexão sobre a própria prática, o estudo e a atualização.
Os programas de formação inicial de professores, de modo geral, deixam a desejar? O que faz um programa de formação de professores de ensino básico ser eficaz?
É complicado dar uma resposta genérica. Existem bons e maus cursos, existem problemas associados aos currículos, ao conhecimento da didática propriamente dita, enfim são muitos fatores. O que na nossa opinião faz a diferença é criar um contexto de formação vinculado ao trabalho real, que desenvolva a cultura do estudo e da reflexão sobre a própria prática. 
O livro, em um primeiro momento, trata da profissionalização do professor. O professor hoje não consegue se enxergar como um profissional?
Não é que o professor não consiga se enxergar como um profissional, porque, de fato, ele é um. Nossa intenção era valorizar a função e chamar atenção para o fato de que esta não é uma tarefa ordinária. Não é qualquer um que, apenas por gostar de criança, pode ser professor. Trata-se de todo um campo de conhecimento. O professor é um profissional, quer queira ou não, ele passa por um concurso, é contratado... Está dentro de um sistema para executar um papel. Mas o professor vem sendo desvalorizado e isso, claro, pode ser percebido através de seu salário, de sua formação empobrecida etc. Nós achamos necessário trabalhar nos sistemas públicos para criar essa identidade profissional. Não mexemos nos salários dos professores com os quais trabalhamos, mas temos como foco deixar claro para as secretarias que esses profissionais precisam de hora para estudar, para planejar suas aulas, para produzirem material. 
Por que é importante o professor se enxergar como um profissional? 
Isso faz toda a diferença. A primeira delas é que ele passa a se comprometer e a se responsabilizar por sua tarefa. É uma profissão que implica na constituição de um repertório e assim deve ser tratada.
O livro também dá grande importância ao ensino e à prática da leitura e da escrita. Por que esses assuntos mereceram tanto espaço em Ensinar: tarefa para profissionais?
O destaque se deve em função dos índices nacionais. A leitura e a escrita são o conteúdo central, que atravessará toda a escolaridade e definirá, em grande medida, a capacidade do sujeito frente aos outros componentes curriculares. 
Em determinado trecho, o livro trata também não só da formação de professores, mas da formação do formador de professores. Qual é a avaliação da atuação deste profissional? 
Este quadro é central num sistema de ensino, pois é ele que mantém a engrenagem funcionando. É preciso haver um quadro qualificado de formadores de professores para que esta cultura profissional seja mantida. Tratamos do assunto no último capítulo do livro e ele pode ser considerado apenas um "aperitivo". Optamos por fazer um livro sobre formação de professores, mas sabemos que isso não existe sem todo o resto da estrutura. Tem que haver um bom quadro de formadores, por exemplo. Mas só esse assunto já daria um outro livro inteiro. Os formadores de professores existem nas escolas, mas, normalmente, como supervisores ou orientadores. Assim, estão incumbidos de outras funções e o seu papel acaba sendo pouco pedagógico. Este capítulo serve para mostrar que as coisas não existem de forma independente: é necessário existir um bom quadro de formação de formadores, para que a formação de professores seja bem-sucedida. 
Quais são, enfim, as maiores contribuições que o livro traz para os profissionais da educação? 
Nossa ideia era que a publicação fosse um material útil principalmente para alunos de pedagogia e formadores de professores. É dedicado aos que vão assumir a tarefa de formar professores. Ele não é tanto um livro para o professor, apesar de também poder ser bem aproveitado por esses profissionais. Acredito que entre as principais contribuições que ele traz está a noção de que é possível trabalhar em grupo, estudar e aprender sobre o processo de aprendizagem, sobre os objetos de ensino e sobre o como ensinar. Além disso, ele aporta caminhos possíveis para que os programas de formação alcancem resultados. 
A INTEGRAÇÃO/INCLUSÃO DE ALUNOS COM NECESSIDADES EDUCATIVAS ESPECIAIS: IMPLICAÇÕES PSICOPEDAGÓGICAS
Prof. Mestre em Educação Marilene da Silva Cardoso
Professora da Faculdade de Educação da Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul, Av. Ipiranga 6681, CEP 90619900, Porto Alegre – RS
RESUMO
O presente trabalho possui como objetivo apresentar um estudo de caso de duas crianças portadoras de Síndrome de Down que estão integradas em escolas regulares da rede pública e privada de ensino.
A investigação visou descrever, compreender e explicar o percurso dessas duas crianças com Síndrome de Down desde o período que frequentavam o programa de estimulação precoce, passando pelos atendimentos na área clínica de fonoaudiologia, psicomotricidade, psicopedagogia e psicoterapia. Juntamente à pesquisa na área educacional e clínica, os familiares desses dois sujeitos foram entrevistados com o intuito de contribuírem com dados gerais sobre o diagnóstico da Síndrome e os encaminhamentos posteriores.
Os rumos das políticas e serviços para Educação Especial apontam na direção da integração do maior número possível de alunos com necessidades educativas especiais nas classes comuns, tendo em vista esse referencial, decidi investigar como ocorre essa integração no meio escolar, para tanto, acompanhei dois sujeitos que foram atendidos desde bebê por profissionais da área da saúde.
Este estudo caracteriza-se por uma abordagem de cunho qualitativo, contou com a participação de oito profissionais de duas instituições de ensino regular, localizadas nos municípios de Guaíba e Porto Alegre, quatro profissionais da área da saúde, de uma clínica de Porto Alegre, e dois familiares. Os dados foram coletados através de entrevistas semiestruturadas, que foram gravadas e, posteriormente, transcritas, observações na sala de aula e nos atendimentos de Psicopedagogia e fichas de acompanhamento evolutivo.
Para análise dos dados, obtidos por meio das entrevistas, foi utilizado o método de análise de conteúdo, proposta por BARDIN (1995), que proporcionou as seguintes categorias finais A Integração e a Escola, O desenvolvimento Potencial do sujeito com NEE e Integração/Inclusão: Família e Sociedade. As outras informações obtidas serviram como complemento à investigação, que favoreceram os achados sobre o problema da pesquisa.
Ficou evidenciado, através das falas dos entrevistados, que os alunos com Síndrome de Down, que participaram de um programa de estimulação precoce e são integrados desde a educação infantil apresentam significativos progressos no seu desenvolvimento potencial. Também, destacou-se que o ambiente, altamente estimulador proporcionado pelas crianças ditas normais, colabora efetivamente para adaptação, sociabilidade e construção do conhecimento dos alunos com necessidades educativas especiais.
Sendo assim, a investigação mostra novas propostas para que a Educação Especial transforme sua práxis até então segregadora e excludente, em uma prática que contemple as capacidades dos alunos especiais, desse modo, integrando-os na escola comum.
INTRODUÇÃO
Devido a minha trajetória profissional e acadêmica na Educação Especial, percebi que seria muito importante para o desenvolvimento do meu trabalho, bem como para o aprofundamento teórico executar uma pesquisa com essa temática. Embora reconheça que as pesquisas sobre o desenvolvimento cognitivo dos deficientes mentais precisam ser multiplicadas, alguns estudos já apontavam que a integração escolar dessas pessoas no ensino regular poderia contribuir, significativamente, para que superassem os desafios do meio escolar e social. Portanto, esta pesquisa teve por objetivo analisar como alunos com necessidades educativas especiais (Síndrome de Down) desenvolvem sua escolarização no ensino regular e como acontece o processo de integração do aluno diferente na escola e a inclusão social.
REFERENCIAL TEÓRICO
Conforme relata CORREIA (1997), a história assinala, desde a Idade Antiga, as políticas extremas de exclusão de crianças deficientes. Em Esparta, na antiga Grécia, essas crianças eram abandonadas nas montanhas, em Roma, atiradas nos rios. A literatura de Educação Especial, conforme FERREIRA (1994), registra a história do atendimento à pessoa com necessidades especiais no mundo ocidental, incluindo o deficiente mental, a partir de meados do século XVI, quando a questão da diferença ou a fuga ao padrão considerado normal vai passar da órbita de influência da Igreja para se tornar objeto da Medicina.
De acordo com que relata JIMÉNEZ (1993), ao final do século XVIII e início do século XIX, inicia-se, nos países escandinavos e na América do Norte, o período da institucionalização especializada das pessoas com deficiências e, a partir daí, surge a Educação Especial. A sociedade toma consciência da necessidade de atender essas pessoas, mais com caráter assistencial que educativo. A assistência era proporcionada em centros, onde pessoas com deficiências eram atendidas e, assim, a sociedade era protegida do contato com os anormais.
No Brasil, segundo BUENO (1993), até a década de 50, praticamente não se falava em Educação Especial, mas na educação de deficientes. Na década de 70, a Educação Especial sofreu uma ampliação com a instalação de um verdadeiro subsistema educacional, com a proliferação das instituições públicas e privadas de atendimento aos deficientes e a criação de órgãos normativos federal e estaduais. Nos últimos cem anos, verificou-se um processo dolorosamente lento de integração e participação das crianças com deficiência. A Educação Especial passa, neste século, por grandes reformulações, crises e mudanças.
Devido à inquietação que a exclusão do sujeito portador de deficiência causava nos países da Europa e também para reafirmar o direito de educação para todos, foi que, em 10 de junho de 1994, representantes de 92 países e 25 organizações internacionais participaram da Conferência Mundial de Educação Especial. Esse encontro foi patrocinado pelo governo espanhol e pela UNESCO.
A Declaração de Salamanca (1994, p. 09) partiu do seguinte pressuposto:
"As escolas regulares com orientação para a educação inclusiva, são o meio mais eficaz no combate às atitudes discriminatórias, propiciando condições para o desenvolvimento de comunidades integradas, base da construção da sociedade inclusiva e obtenção de uma real educação para todos."
Para BUENO (1993), a Educação Especial tem cumprido, na sociedade moderna, duplo papel de complementaridade da educação regular. Isto é, atende, por um lado, à democratização do ensino na medida em que responde às necessidades de parcela da população que não consegue usufruir dos processos regulares de ensino; por outro, responde ao processo de segregação da criança diferente, legitimando a ação seletiva da escola regular.
Quando se aborda o tema da educação de crianças e jovens com dificuldades especiais, utiliza-se o termo Integração, querendo com isso significar a colocação de pessoas com necessidades educacionais especiais juntamente com pessoas que não as têm no mesmo contexto. A integração escolar é um movimento que visa acabar com a segregação,
favorecendo, assim, as interações sociais de estudantes com necessidades educativas especiais (NEE) com estudantes considerados normais.
A integração de alunos com necessidades educativas especiais na escola regular, como caminho fundamental para se atingir a integração social, constitui uma meta cada vez mais firme dos diferentes sistemas educativos, quando se pretende educar alunos com necessidades educativas especiais na escola regular. Isso pressupõe que é o sistema educacional como um todo que assume a responsabilidade de Educação (e não uma parte dele, a Educação Especial).
JIMÉNEZ (1993) define a integração escolar como um processo que pretende unificar a educação regular e especial, com o objetivo de oferecer um conjunto de serviços a todos os alunos, com base nas suas necessidades de aprendizagem.
A partir da década de 70, iniciaram-se uma série de estudos multidisciplinares, com o fim de obre maior conhecimento acerca do desenvolvimento cognitivo dos portadores da Síndrome de Down (SD). Em linhas gerais, os portadores da SD apresentam consideráveis atrasos em todas as áreas. Porém, estes sujeitos que participam desde os primeiros meses de vida de programa de estimulação precoce, desenvolvem ao máximo o seu potencial psicomotor, cognitivo e afetivo-social. Essa abordagem ambiental de Estimulação Precoce ou Intervenção Precoce visa maximizar as potencialidades e minimizar o acúmulo de déficits do bebê com síndrome de Down. No que refere-se a escolarização e aprendizagem do aluno com SD, PUESCHEL (1993, p.181) comenta:
“É muito importante que crianças com SD sejam colocadas em uma situação em que consigam um desempenho escolar. Cada criança tem o seu próprio potencial, que deve ser explorado, avaliado e depois desafiado. Sua integração no ensino regular é um fator que as encoraja, aumenta sua autoestima e estimula novas tentativas”.
É, nessa perspectiva que, enquanto psicopedagoga, tenho referido-me aos alunos portadores de necessidades educativas especiais, que, antes de serem especiais, são alunos e crianças, e que suas necessidades só são especiais porque a sociedade assim as considera, isso não significa que esses sujeitos não devam receber um atendimento escolar adequado, pelo contrário, suas potencialidades precisam ser desafiadas, já que ainda há muitos preconceitos acerca da capacidade intelectual dessas crianças.
METODOLOGIA
O presente estudo foi construído numa abordagem qualitativa, supondo o contato direto e prolongado do pesquisador com o ambiente e a situação que está sendo investigada, através do trabalho intensivo em campo. Pretendi, neste estudo, retratar a realidade de forma complexa e profunda, focalizando o problema da pesquisa como um todo. Para isso, recorri a uma variedade de dados coletados em diferentes momentos e situações diferenciadas.
A escolha do estudo de caso, um método naturalista de pesquisa educacional, teve como intenção contribuir neste estudo, pelo menos em parte, para que profissionais da psicopedagogia, da área da saúde e do ensino regular ampliassem seus conhecimentos sobre como ocorre a integração dos alunos com necessidades educativas especiais (NEE) com os alunos ditos normais. O propósito também foi de desmistificar certas concepções.
„Neste estudo, tive o interesse de acompanhar a trajetória de dois alunos com necessidades educativas especiais, com Alteração Cromossômica do par 21 (Trissomia do 21 ou Síndrome de Down), que frequentam o ensino regular. Uma menina com nove anos, atualmente aluna da terceira série de uma escola de ensino fundamental e médio da rede privada de Porto Alegre, e um adolescente de quatorze anos que frequenta a sétima série de uma escola da rede municipal do município de Guaíba-RS.
Também, participaram desta pesquisa:
- equipe diretiva das escolas (Diretora e Vice-diretora);
- equipe pedagógica (Supervisora, Orientadora Educacional e Coordenadora Pedagógica);
- professores (matemática, português e de séries iniciais);
- profissionais da área da saúde (Médico Foniatra, Psicóloga, Fonoaudióloga e Estimuladora Precoce) que acompanham esses dois sujeitos com necessidades especiais no processo de integração; e
- mães dos sujeitos com NEE.
As informações coletadas a partir das entrevistas foram primeiramente transcritas pela própria pesquisadora, a fim de uma melhor impregnação com o assunto. Nas entrevistas, optou-se pela metodologia de análise de conteúdo, considerando-se como “(...) um conjunto de técnicas de análise das comunicações.” (BARDIN,1995). As unidades de significado e temas que emergiram da exploração do conteúdo das entrevistas foram agrupadas, por analogia de temas, em categorias.
Nesta categoria final A INTEGRAÇÃO E A ESCOLA, destaco com ênfase as manifestações dos profissionais da área educacional sobre a integração do aluno com NEE na escola regular. Desse modo, incluí os temas (unidades de significado) relatos que se referem ao processo de integração do aluno com necessidades educativas especiais na instituição escolar como um todo, incluindo equipe diretiva, pedagógica, professores, pais e alunos. As idéias expressas pelas supervisoras pedagógicas, orientadoras educacionais e profissionais da área clínica mostram que é evidente a preocupação desses profissionais no sentido de acolher esse aluno diferente ao chegar na escola. Aparece na fala da Coordenadora Pedagógica da escola de F, “se perguntar a escola está acolhendo? A gente também quer poder acolher e também nós queremos compreender bem como trabalhar com esse aluno” (CP7).
O aluno com NEE, na escola regular, também, possibilita fazer aflorar o aspecto afetivo entre docentes e alunos, numa convivência mais abrangente. Como cita a supervisora pedagógica da escola de A, “(...) a escola procura mostrar esse lado mais humano e afetivo com todos os alunos. Principalmente a aceitação de alunos diferentes, não só com Síndrome de Down, mas outros problemas que surgem no dia-a-dia” (SP5).
A escola trabalha em seu espaço, com a heterogeneidade nas relações cotidianas e a convivência com os diferentes mostra que o mundo é composto pela diversidade. Destaca a Professora de A, “também para os colegas, ditos normais, é muito importante conviver com um colega com Síndrome de Down, pois crescem vendo que existem as diferenças e que as pessoas não são iguais. Que todos têm diferenças e ao mesmo tempo cada um é singular” (PM12).
Essa circulação entre as diferenças e a normalidade, através do convívio diário no espaço educacional, é de suma importância porque os colegas vivenciam, nesse cotidiano, a chance de aceitar as limitações, pois as crianças apresentam facilidade em aceitar e conviver com as diferenças, como aparece destacado no posicionamento da Coordenadora Pedagógica da escola de F “(...) eu acho que isso vem até a favorecer e enriquecer o trabalho, digamos a vivência das outras crianças, elas vão aprendendo desde cedo a conviver com todos, e a criança, digamos portadora de necessidades especiais, vai se sentir mais integrada, mais participante desta sociedade ela vai crescer mais forte, e terá muitas outras oportunidades, porque ela participou deste grupo numa integração normal” (CP 3).
Ao ouvir todos os professores e profissionais da Equipe Pedagógica desses dois sujeitos com SD integrados, percebe-se que a integração com os colegas trouxe crescimento ao grupo em geral, como no depoimento a seguir da Supervisora Pedagógica, “porque além do crescimento pessoal aparece o crescimento da turma, do grupo. E para o aluno com NEE ele sente-se bem integrado, e não ver só deficiência na mesma sala. Há mais empolgação, podem chegar mais longe, porque juntos com outros alunos, isso ajuda não há discriminação. A convivência com colegas e professores é importante para eles. Há trocas de ambas as partes, para o professor é um trabalho novo” (SP1).
Cada uma das escolas pesquisadas tem a sua particularidade, a escola do menino A faz parte da rede pública municipal e desenvolve essa proposta desde 1992, quando o aluno A ingressou na primeira série do ensino fundamental. A escola da menina F faz parte da rede privada de ensino, ela iniciou sua escolarização na Educação Infantil em 1996, numa turma de nível B (Pré-Escola).
Atualmente, o processo de integração escolar é um acontecimento verdadeiro nessas duas escolas e todos os profissionais que foram pesquisados mostraram-se engajados na proposta, como afirma a Supervisora da escola do aluno A “(...) é importante essa integração, para mostrar para a sociedade que são capazes de ir além do que pensamos que eles fazem” (SP2).
Na categoria OS PROFISSIONAIS DA ESCOLA E A PROPOSTA DE TRABALHO COM O ALUNO INTEGRADO, os profissionais da área educativa manifestaram-se, sobre esse tema, salientando que o professor da sala de aula comum tem sido identificado como um dos principais elementos para o êxito da integração escolar de crianças com NEE. Relatam em suas falas que é comum que esses professores não possuem experiência significativa ou relevante de lidar com as NEE, nem gozam de metodologias de ensino e práticas pedagógicas que garantam sua integração. Em qualquer situação de aprendizagem formal é o professor o elemento chave para favorecer o desenvolvimento das potencialidades do aluno.
Dentro dessa categoria O DESENVOLVIMENTO POTENCIAL DO ALUNO COM (SD) foram incluídas as falas dos profissionais da área da Saúde que acompanham os dois casos em estudo, o Médico, a Psicóloga, a Fonoaudióloga e a Estimuladora Precoce.
No relato do Médico, ficou explícito que é fundamental a identificação o mais precoce possível do distúrbio que a criança é portadora “(...) em qualquer momento, é importante que o distúrbio seja logo identificado e proposto a melhor alternativa terapêutica para essa criança” (M16), pois, dessa forma, far-se-á o encaminhamento necessário para o acompanhamento clínico.
FONSECA (1995, p.53) infere a respeito:
“A identificação precoce sistemática é uma condição imprescindível da intervenção, não só porque evita problemas futuros, como tende a eliminar condições que agravam o desenvolvimento. A identificação precoce permite ainda o controle e a facilitação de fatores de desenvolvimento, quer motores, quer linguísticos, perceptivos, cognitivos e sócio-emocionais.”
VYGOTSKY (1991) aponta que, mesmo nas deficiências de natureza orgânica, as consequências mais importantes para o indivíduo estão mediadas pelos fatores sociais e psicológicos do desenvolvimento alterado. Para ele, é na parceria de trabalho que poderemos auxiliar a desenvolver, como educadores e parceiros mais experiente, as funções psicológicas superiores de nossos alunos, atuando na zona de desenvolvimento potencial, que deveria valer no ensino dos alunos com NEE.
Nesse sentido, a importância dos atendimentos de fonoaudiologia, psicomotricidade, psicologia e psicopedagogia, além da estimulação precoce, são fundamentais para a integração da criança com (SD) na escola e na vida social. Como destaca a Fonoaudióloga “(...) acredito que a criança com NEE que realiza esse trabalho global em função de todas as áreas, pois eu não trabalho só a área da fono, mas às áreas senso - percepto - cognitiva, socioafetiva e psicomotora, dentro de um enfoque bem global e com apoio dos profissionais de outras áreas” (F1).
Percebi, durante a caminhada nesse processo de inclusão, que o importante é poder, por meio dos atendimentos da área clínica, desenvolver o potencial desse sujeito para que tenha uma integração plena no espaço escolar. Isso aparece na fala do Médico, “(...) Nós da equipe, procurávamos alternativas que pudéssemos de alguma forma, já naquela época, aproveitar o potencial da criança” (M3).
Conforme afirma PUESCHEL (1993), é muito importante que crianças com SD sejam colocadas em situação que consigam um desempenho escolar. Cada criança tem seu próprio potencial, que deve ser explorado, avaliado e depois desafiado. As crianças sentem-se bem com um bom desempenho escolar. É um fator que as encoraja, aumenta sua auto-estima e estimula novas tentativas. Muitas vezes, o incentivo correto pode ser o suficiente para fazer com que a criança com SD possa esforçar-se um pouco mais. Entretanto, se as crianças não se sentirem aceitas, ou perceberem que a professora não quer trabalhar com ela, uma barreira será erguida entre o professor e o aluno, prejudicando o processo de aprendizagem da criança.
Nesta pesquisa, observam-se que as chances de desenvolvimento de potencial cognitivo da criança com (SD) são maiores quando ela está inserida na escola regular, ela não teria essas possibilidades de construção lógica e de raciocínio numa escola especial, como afirma a Psicóloga “(...) tento imaginar esses dois sujeitos numa escola especial e eu vejo que não teriam as condições que tem hoje nem intelectual e social, mesmo tendo as dificuldades que eles tem hoje. Porque são dificuldades que eles conseguem pensar sobre e não estão alienados nelas” (P29). Ela fala sobre um desenvolvimento cognitivo mais avançado, “(...) também circula a questão da sexualidade de outra forma, a questão social, a conduta, o comportamento desse sujeito tem determinadas regras para ser aceito no grupo. Já, na escola especial, o adolescente é tratado como criança, pode ter outro comportamento, e essa conduta inadequada é aceita, porque ele é especial” (P35).
Esta categoria final INTEGRAÇÃO/INCLUSÃO NA FAMÍLIA E SOCIEDADE inclui as questões relacionadas à inclusão social do sujeito com SD, na vida cotidiana dos seus familiares, assim como no processo de integração como desafio na sociedade atual.
A família é o ponto de apoio que fundamentará toda a modificação em termos sociais no que se refere à inclusão desse sujeito que nasceu com uma anomalia genética e que a cada década está rompendo barreiras. Isso fica nítido na manifestação do Médico pesquisado: “(...) em nível familiar, é possível avaliar através dos contatos que tivemos com eles, e sabemos que eles acompanharam todo trabalho e também eles tem participado, no sentido de romper outra
esfera no sentido mais amplo, ou seja, no social, e a escola quando apresentava barreira, conseguimos através desses pais que isso fosse aceito” (M19).
MANTOAN (1997) afirma que os pais têm um papel importante e devem ser fortalecidos para enfrentar o preconceito e expor seu filho em locais públicos, pois essas situações informais funcionam como um processo de sensibilização para pessoas que não convivem com a deficiência, ajudando a redefini-la. A longo prazo, a aceitação em espaços estruturados pode ser mais fácil.
Para a prática da exclusão e da desigualdade serem superadas, surge a integração/inclusão como um processo imprevisível, que pode ser modificável, como afirma a Psicóloga “(...) é um processo que ninguém sabe onde vai dar, a gente não pode dizer vai ser assim, é um processo imprevisível, como tudo na vida. Parece que com o deficiente a gente quer a resposta, mas não se sabe se ele vai se adaptar, gostar da escola. Só estando lá na escola, integrado é que se vai saber” (P19).
Inclusão social é conceituada, para SASSAKI(1997, p.41), como:
“Processo pelo qual a sociedade se adapta para poder incluírem em seus sistemas sociais gerais, pessoas com necessidades especiais e, simultaneamente, estas se preparam para assumir seus papéis na sociedade. A inclusão social é então, um processo bilateral no qual as pessoas, ainda excluídas, e a sociedade buscam, em parceria, equacionar problemas, decidir sobre soluções e efetivar a equiparação de oportunidades para todos.”
A integração do sujeito especial na sociedade, sempre, foi um tabu, pois a exclusão social era algo comum em décadas passadas, como afirma a Professora do aluno A “(...) eu acho que isso é muito bom, a nossa sociedade foi acostumada a excluir qualquer pessoa que tivesse alguma anomalia, qualquer diferença nunca era bem vista. Antigamente se escondia em casa e não deixavam ver. E hoje em dia é benéfica que participem, porque as crianças ditas normais elas crescem, começam a ver que tem dons e habilidades que não aproveitam” (PP1).
Nesta pesquisa, o que observei é que a partir dessa circulação no social, dessa integração, os sujeitos portadores da SD estão conseguindo superar estigmas e a
discriminação, como afirma a Psicóloga, em sua narrativa, “(...) e outro ponto é a questão social, de poder ter outra circulação, vejo especialmente nas crianças com Síndrome de Down, são crianças com menos estereotipias, que no diagnóstico dessa síndrome é uma das características, e muitas das nossas crianças com a síndrome que estão integradas, não apresentam estereotipias, isso é um dado muito significativo. A síndrome não mudou, mas a criança é que conseguiu superar isso. Então o desenvolvimento social conseguiu superar isso” (P11).
Este estudo aponta que nos deparamos com um novo olhar nesse final de século, isto é, a possibilidade de convivermos em nossa sociedade com as diferenças, essa idéia está explicita no depoimento da Psicóloga “(...) a grande questão nesse final de século é se aprender a viver com as diferenças e com toda a heterogeneidade do homem e não mais se pensar no aluno ideal, homogêneo, que aprende igual” (P47).
CONSIDERAÇÕES FINAIS
Com a chegada do novo milênio, tornam-se inquietantes os vários desafios que a escola enfrentará para que contemple a diversidade e a heterogeneidade do alunado, não mais restrita somente àqueles ditos normais.
O presente estudo possibilitou uma efetiva constatação de que alunos com NEE podem e devem frequentar uma escola dita para todos, construindo um novo conceito, o de que nem todos os sujeitos com NEE não devam permanecer em escolas especiais, o tempo todo.A investigação trouxe à tona diversos aspectos referentes à integração do aluno com NEE no ensino regular, que foram revelados pelos profissionais entrevistados.
Fica evidenciado nessa pesquisa, que nesse espaço de socialização do saber que é a escola, todos passam a conviver com as diferenças sem preconceito ou discriminação, aceitando as limitações dos colegas e alunos, porém apoiando-os ao vencerem os desafios. O grupo de colegas é o estímulo na sala de aula, dessa forma, ocorre então a ruptura da discriminação através da (inter)ação e da convivência no cotidiano escolar, enquanto que na escola especial essas crianças não teriam tanta oportunidade de construírem o conhecimento junto às crianças ditas normais.
Os dados obtidos, revelaram a possibilidade desses dois alunos com SD desenvolverem o seu potencial para a aprendizagem formal no meio escolar comum, embora inúmeras dificuldades tenham surgido durante o percurso, que foram superadas a partir dos acompanhamentos sistematizados que eles receberam na área clínica, enquanto que seus pais e seus professores eram também orientados.
A Integração/Inclusão é um processo complexo, em que diversas barreiras são impostas aos professores, como se detectou nas falas dos entrevistados, quando comentam a falta de formação pedagógica e despreparo para trabalharem com a heterogeneidade em sala de aula.
Certamente, neste estudo, não foi meu intuito negar determinados aspectos orgânicos, que são particulares à Síndrome de Down e que limitam muitas vezes o potencial desses sujeitos em realizarem atividades mais complexas, entretanto não pode haver uma supervalorização dessas limitações, uma vez que, no cotidiano, as pessoas não necessitam realizar o tempo todo, raciocínios mais complexos e vivem normalmente.
Ficou constatado que a maior dificuldade centra-se na proposta pedagógica, isto é, na metodologia usada em sala de aula, no currículo, nos recursos educacionais e na avaliação, que ainda permanece muito quantitativa e normativa. De acordo com os dados obtidos, há necessidade de uma adaptação curricular para esse alunado com NEE que frequenta a classe comum. As práticas educativas ainda utilizam-se de metodologias tradicionais, em que o conhecimento está centrado no professor, ao contrário de metodologias mais avançadas, em que o aluno é o protagonista e a comunicação é recíproca.
Nessas escolas, nas quais estão inseridos os alunos com Síndrome de Down, a adaptação curricular permanece insuficiente, faz-se necessário prever atuações dirigidas a facilitar o progresso acadêmico desses sujeitos. Não podemos ver a integração como um processo estandarizado, visto que cada caso e cada situação requerem atuações diferenciadas. Trata-se de um processo com muitas implicações, que os professores da Educação Infantil e Séries Iniciais estão mais predispostos em apostarem nessa prática e apoiarem a transição destes alunos, do que os professores do Ensino Fundamental de quinta a oitava série, pois nessas séries ocorrem maiores mudanças na rotina escolar, devido o maior número de
disciplinas e mudanças de professores, tornando seus trabalhos com estes alunos mais complexo e difícil, algumas vezes provocando resistência a mudanças.
Ficou comprovado que o trabalho direto da Intervenção Precoce, junto aos pais e a esses bebês sindrômicos, tem sido o melhor recurso para vencer as dificuldades nas áreas psicomotora, senso-percepto-cognitiva e socioemocional. Foi, trabalhando e acompanhando o desenvolvimento desses dois sujeitos desde seus primeiros meses de vida, que percebi o significativo crescimento que lhes possibilitou uma comunicação e socialização para serem integrados na Educação Infantil (Pré-Escola) e, posteriormente, nas Séries Iniciais (Ensino fundamental).
Os professores e a equipe escolar mencionaram em suas entrevistas, que o processo de aprendizagem desses alunos modificou-se a partir da mediação com professores e com os colegas ditos normais, havendo uma maximização do potencial cognitivo, que para VYGOTSKY seria o desenvolvimento proximal. Mesmo apresentando uma lentidão de raciocínio que é comum na SD, toda comunidade escolar passou a aceitar as diferenças e a convivência com a singularidade desse sujeito aos poucos foi sendo respeitada.
Ficou evidente, que é importante um planejamento da educação, sendo esta coerente com o futuro social que se espera conseguir. Se queremos uma sociedade integrada, cujos membros convivam e respeitem as diferenças de todo tipo é preciso favorecer a criação desses valores na escola desde a Educação Infantil. Somos todos iguais em direitos, porém diferentes como pessoas. Essas diferenças podem obedecer a distintos estilos cognitivos, ritmos de aprendizagem, interesses, etc., ou podem derivar de alguma discapacidade ou de situações diversas de desvantagem social. Contudo, a educação obrigatória deve atender a todos. Deve-se adaptar o sistema educativo ao aluno e não pretender que o aluno se adapte ao sistema.
Entretanto, ficou explícito a partir das duas escolas pesquisadas, que não foi simples de se conseguir um contexto efetivo de integração. O desconhecimento e o consequente medo por parte das pessoas é um obstáculo às situações em que as pessoas com SD possam conviver com os demais.
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
BARDIN, Laurence. Análise de conteúdo. Tradução de Luís Antero Reto. SP: Martins Fontes, 1995.
BUENO, José Geraldo Silveira. Educação Especial Brasileira - Integração/Segregação do aluno diferente. São Paulo: EDUC, 1993.
CORREIA, Luiz de Miranda. Alunos com Necessidades Educativas Especiais nas Classes Regulares. Porto: Editora Porto, 1997.
DECLARAÇÃO DE SALAMANCA. Enquadramento da Ação: Necessidades Educativas Especiais. In: Conferência Mundial sobre NEE: Acesso e Qualidade - UNESCO. Salamanca/Espanha: UNESCO 1994.
FERREIRA, Julio Romero. A Exclusão da Diferença: a educação do portador de deficiência. Piracicaba: Unimep, 1994.
FONSECA, Vítor da. Educação Especial. Porto Alegre: Artes Médicas, 1995.
JIMÉNEZ, Rafael Bautista. Educación Especial y Reforma Educativa: Necesidades Educativas Especiales. Málaga: Aljibe, 1993.
___. A Integração de pessoas com Deficiência - contribuições para uma reflexão sobre o tema. São Paulo: Memnon, 1997.
MORAES, Roque. Análise de Conteúdo: limites e possibilidades. Porto Alegre: EDIPUCRS, 1994.
PUESCHEL, Siegfried. Síndrome de Down: Guia para pais e educadores. Campinas/SP: Papirus, 1993.
SASSAKI, Romeu Kazumi. Inclusão/Construindo uma Sociedade para Todos. Rio de Janeiro: WVA, 1997.
VYGOTSKY, Lev S. A Formação Social da Mente. São Paulo: Martins Fontes, 1991.


Mario Carretero
Um olhar sobre o construtivismo
                O psicólogo espanhol Mario Carretero conhece bem os prejuízos e traumas causados por uma educação mecânica e autoritária. Estudante na época em que o ditador Francisco Franco governava a Espanha (1936-1975), Carretero lembra-se com pesar das aulas rígidas na Educação Básica. "A única resposta que eu recebia era: guarde as informações de memória." Trabalhando com programas de formação docente, começou a pesquisar o funcionamento do processo de trocas conceituais, maneira pela qual conhecimentos antigos são transformados em idéias novas. Essas mudanças são, segundo ele, determinantes na aprendizagem. Hoje Carretero é catedrático da Universidade Autônoma de Madri e pesquisador da Faculdade Latino-Americana de Ciências Sociais, em Buenos Aires. Nesta entrevista, ele critica o que chama de "simplificações dos conceitos envolvidos no construtivismo", como o de que há somente um conhecimento prévio e que ele pode ser avaliado com uma simples pergunta. Além disso, mostra estratégias para promover um aprendizado significativo.
   Muito se fala sobre conhecimento prévio. O que é isso, exatamente?
                A teoria construtivista evoluiu nos últimos tempos e começou a incorporar não somente as idéias de Jean Piaget (1896-1980), mas também as de Lev Vygotsky (1896-1934) e as da Psicologia cognitiva. Esse processo nos permitiu chegar à conclusão de que há diversos modelos de conhecimento prévio. Alguns estão diretamente relacionados aos conteúdos curriculares — informações sobre a Segunda Guerra Mundial, por exemplo. Existem também conhecimentos prévios gerais. Esses se formam pela utilidade da disciplina que está sendo estudada. Por que aprender isso? Como os pesquisadores levantaram essas informações? Eles não têm relação com assuntos específicos. São muito importantes, mas não tão explícitos.
                Como o conhecimento prévio costuma ser avaliado?
                Muitas vezes o professor acredita que basta entrar na classe e perguntar o que foi aprendido no ano passado. Essa visão é muito superficial. Ninguém aprende alguma coisa partindo do nada, mas sim usando suas capacidades intelectuais, cognitivas e sociais. Para avaliá-las não existe um modelo. O importante é utilizar diferentes métodos para identificar os conhecimentos prévios.
                Quais são os melhores métodos para identificar conhecimentos prévios?
                Um bom caminho é criar problemas em vez de resolvê-los. Isso estimula o pensamento e deixa brechas para verificar que conceitos estão dominados. Além disso, o professor pode mesclar perguntas para a classe com conversas individuais. Selecionando alunos de forma aleatória e dialogando sobre os conteúdos e as idéias de cada um é possível identificar o que a turma realmente pensa e sabe.
                O erro pode ser considerado parte do processo de aprendizagem?
Sem dúvida. Ele não pode ser eliminado ou taxado como uma coisa ruim. O erro é um passo em direção ao saber. Cabe ao professor fazer com que o estudante chegue à concepção correta. Mas isso não significa fazê-lo repetir o que está no livro. O ideal é avaliar se ele obedece a alguma lógica, se tem uma ideia completa. E, acima de tudo, os educadores devem explicar para a turma como ela está evoluindo. Muitas vezes o jovem não tem consciência do que sabe. O metaconhecimento, a consciência do que se domina, é fundamental para a aprendizagem.
                Como o conhecimento prévio pode ser modificado?
                Nessa questão mora o perigo. É comum encontrar profissionais que acham que ele pode ser modificado facilmente. Acreditam estar promovendo a substituição de conceitos dominados por novos quando não estão. O professor faz uma provocação, ouve a resposta, mostra que o conceito é um pouco mais complexo e acredita que a classe vai, automaticamente, construir uma nova idéia sobre o assunto. Nada disso. A construção de um conceito novo é um processo difícil, que demora e demanda esforço. Ao mesmo tempo, as pequenas evoluções de cada dia podem culminar em mudanças conceituais profundas. Não é possível, no entanto, promover essas mudanças mais do que quatro vezes ao ano.
                Se a substituição de um conceito por outro é tão complexa, como ensinar conteúdos novos?
                O currículo deve ter menos conteúdos, vistos com maior profundidade. Acho contraditório falar em construtivismo sem pensar em diminuir o volume de informações. Há instituições que têm mais de 30 grandes temas no currículo. Por que ensinar 15 se nem o primeiro foi compreendido?
                Que conseqüência traz um currículo inchado?
                Há uma aceleração desnecessária, por causa do excesso de assuntos a tratar. No Ensino Médio, por exemplo, os temas são típicos do nível universitário. O livro de uma turma de 16 anos é muito parecido com o dos calouros de faculdade. Não há problema em estudar a fotossíntese, por exemplo, por dois ou três meses. Só assim é possível entender o sentido da Biologia.
                Quais são as causas do excesso de conteúdos?
                O problema começa na 4ª ou na 5ª série, e em todo o mundo. Além de muitos temas curriculares, há a pressão da família e da sociedade. Se um pai percebe que o filho não sabe qual é a capital da Rússia, fica desesperado e se pergunta: "O que ele aprende na escola?" Curiosamente, não causa mal-estar descobrir que o jovem não sabe diferenciar os poderes Legislativo, Executivo e Judiciário. Não se percebe que saber a capital da Rússia não é tão importante, mas entender a diferença entre os poderes é fundamental. O mais importante é compreender o conceito e usá-lo — não decorá-lo. Devemos construir aprendizagens significativas.
                No que consiste uma aprendizagem significativa?
                Ela acontece quando o estudante sente, com a própria vivência intelectual, o que está aprendendo. Ele precisa ter a oportunidade de mesclar teoria e prática. Saber o conceito de densidade, por exemplo, é essencial, assim como compreender de que maneira essa idéia é aplicada para transportar objetos por barco de um lado a outro do planeta. Em situações-problema como essa, o conceito funciona como uma ferramenta. E, assim como um martelo, um instrumento só tem sentido se tiver um uso. Aprender de verdade é manejar os conhecimentos com eficácia, com capacidade de resolver problemas. Mas cuidado: a prática não deve ser repetitiva nem passiva. Isso não tem sentido. O importante é aplicar o conhecimento.
                Há uma nova maneira de pensar a prática docente?
                Sim. Esse foi um problema enfrentado pelo construtivismo nos anos 1980, em vários países. A prática foi posta de lado de forma equivocada. Sem ela a aprendizagem não se consolida, o que dificulta o desenvolvimento cognitivo posterior. Precisamos dar novo sentido à prática, e não eliminá-la. Para aprender não basta compreender.             
                Um novo jeito de ensinar se aplicaria também à disciplina de História, por exemplo?
                Creio que o ensino da História merece outro enfoque, ainda que também sofra com o excesso de temas. Nem tudo sobre a pré-história ou o século 20 é essencial. Melhor seria estudar alguns períodos, com mais profundidade. Além disso, ter consciência de que fazemos a história diariamente é muito mais produtivo do que decorar. É preciso tornar o estudo mais real, mais vivo.
                Fatos recentes devem ser incorporados ao currículo?
                Claro. Normalmente ensina-se a história do país onde a escola está. Isso não tem sentido, já que as nações não são mais o que eram no século 19. Os países estão desaparecendo como agentes da organização econômica e as nações estão sendo substituídas por entidades regionais. Meu passaporte me identifica como sendo da União Européia, não mais da Espanha. É muito mais importante para o aluno espanhol estudar a história da Europa do que a de seu  país.  
                Quais as vantagens da mudança na maneira de ensinar?
                A escola faria mais sentido para os jovens. Eles perceberiam que estudar é uma forma de se ligar ao mundo. Não é fácil prender a atenção deles, menos ainda nas sociedades modernas, em que a educação pública é obrigatória. O pai que deixa o filho fora da escola comete um crime. Como nem sempre o jovem estuda porque quer, só conteúdos atraentes para motivá-lo. Uma pessoa motivada vai em busca de objetivos. E esse empenho só se manifesta se existe afetividade e emoção.

CARVALHO, ROSITA EDLER
REMOVENDO BARREIRAS PARA A APRENDIZAGEM:
EDUCAÇÃO INCLUSIVA
Os distúrbios de aprendizagem são assuntos complexos e polêmicos, bem, como temas urgentes para a remoção de barreiras para a organização do atendimento educacional escolar desses e de outros alunos, considerados com necessidades educacionais especiais.
Segundo o resumo que fiz, este texto tem como objetivo e oferecer subsídios teóricos, apresentar questões para serem debatidas e algumas sugestões práticas para os que se interessam e estudam essas questões.
Conceituando os distúrbios de aprendizagem
A expressão: distúrbio de aprendizagem é utilizada por autores para designar a problemática de alunos que apresentam problemas em aprender e contribuem para aumentar o fracasso escolar.
O processo de aprendizagem dever ser examinado nas dimensões biológicas, cognitiva e social.
A aprendizagem é, um processo extremamente, complexo e que, para ser examinado criteriosamente, impõe a consideração das inúmeras variáveis que se dinamizam e dialeticamente.
Os distúrbios de aprendizagem e a culpabilização do aluno
Alguns autores criticam a expressão, pois no vocabulário distúrbios está implícita a idéia de "perturbação da ordem" ou seja, um desvio da moralidade, o que reforça o modelo clínico.
Alega-se ainda, que a expressão induz à ideia de patologização da aprendizagem , escamoteando os determinantes políticos e pedagógicos do fracasso escolar, atribuindo-a aos distúrbios do aluno.
Mesmo compreendendo que os alunos não são autores de seus problemas, alguns professores costumam afirmar que pouco ou nada podem fazer para a superação das dificuldades desses alunos.
Admitir a existência de um distúrbio de aprendizagem no aluno não implica absolver o sistema educacional de sua próprias responsabilidade. Ao contrário, caracteriza-se como mais um desafio para o aprimoramento das respostas educativas das escolas, estimulando-as a identificar e remover barreiras para aprendizagem de todos os alunos, com ou sem deficiência, com ou ser distúrbio de aprendizagem.
Os distúrbios de aprendizagem e a educação especial
Reconhecer a existência de distúrbios psiconeurológicos na aprendizagem de pessoas não nos autoriza a diagnostica-os como deficientes mentais e, muito mesmo encaminha-los para educação especial, segregando-os.
Os transtornos de aprendizagem como as dislexias, as discalculias, as disgrafias, os distúrbios de atenção, dentre outros exemplos torna-se barreiras para a aprendizagem se forem considerados como manifestações patológicas definitivas, apenas sem levar em conta o papel desempenhado pelas famílias, pelas escolas e pela comunidade.
Alunos com distúrbios de aprendizagem não são conceitualmente, portadores de deficiência, não devendo ser agregados.
Removendo barreiras para a aprendizagem na organização do atendimento educacional escolar
Dentre as inúmeras barreiras existentes para o atendimento escolar de alunos com deficiência, as mais significativas são de cunho atitudinal a frente à diversidade.
As barreiras atitudinais não se removem com determinações superiores. Dependem de reestruturações perspectivas e afetivo-emocionais que interfiram nas predisposições de cada um de nós, em relação à alteridade.
A organização do atendimento educacional escolar, inspirado no paradigma da inclusão, implica a remoção das barreiras atitudinais frente à diferença e, também:
No currículo e nas adaptações curriculares; na formulação do currículo deve-se responder algumas indagações como: por que ensinar?, o que e quando ensinar?, como ensinar?, que, como, quando avaliar?. As adaptações curriculares de acesso ao currículo são referentes à previsão e provisão de recursos técnicos e materiais e à remoção de barreiras que impedem a alguns alunos o acesso as experiências bem sucedidas de ensino-aprendizagem;
Na avaliação contínua do trabalho; a avaliação do trabalho da instituição social escola deve ser continua e permanente, como rotina, inserida no projeto político-pedagógico. Estabelecer semanalmente, com a comunidade escolar para avaliação do trabalho realizado e delineamento das ações futuras, trata-se de prática saudável e urgente;
Na intervenção psicopedagógica; a intervenção pedagógica inclui além das adaptações curriculares, ações de apoio especifico a serem oferecidos aos alunos, individualmente ou em pequenos grupos;
Na qualificação da equipe de educadores; a qualificação da equipe escolar inclui, além dos professores, a direção da escola e todos o que nela trabalham na infraestrutura. A qualificação pode ser em serviço ou em cursos presenciais ou à distancia;
Em recursos materiais; existe ainda escassez de material a ser trabalhado com os alunos, e com os avanços da tecnologia muito dos profissionais não sabem utiliza os equipamentos como exemplo o computador;
E uma nova concepção do especial em educação; a proposta e remover as barreiras para aprendizagem, particularmente na organização do atendimento educacional.
Entendemos que com esse objetivo, poderemos contribuir, definitivamente, para a tão desejada escola de boa qualidade para todos: a escola inclusiva.

CARVALHO, ROSITA EDLER.
Educação inclusiva com os pingos nos is.
Colocar os pingos nos "is" dessa questão é defender que a inclusão envolve a reestruturação das culturas, políticas e práticas das escolas que, como sistemas abertos, precisam rever suas ações, até então, predominantemente elitistas e excludentes. Alerta a autora que a inclusão é um longo processo e não ocorre por decreto ou modismo. Para incluir um aluno com características diferenciadas numa turma dita comum, há necessidade de se criarem mecanismos que permitam que ele se integre social, educacional e emocionalmente com seus colegas e professores e com os objetos do conhecimento e da cultura. A política de inclusão  dos alunos na rede regular de ensino que apresentam necessidades educacionais especiais, não consiste somente na permanência física desses alunos, mas o propósito de rever concepções e paradigmas, respeitando e valorizando a diversidade desses alunos, exigindo assim que a escola defina a responsabilidade criando espaços inclusivos. Dessa forma, a inclusão significa que não é o aluno que se molda ou se adapta à escola, mas a escola consciente de sua função coloca-se a disposição do aluno.
Para entender a educação inclusiva deve-se primeiro entender que a proposta não foi concebida apenas para determinados alunos e sim para todos, sem distinção. Entender que somos diferentes. Essa é nossa condição humana. Pensamos de jeito diferente, sentimos com intensidade diferente, agimos de forma diferente, e tudo isso porque vivemos e aprendemos o mundo de forma diferente. Pensar seriamente na prática da inclusão significa tomar consciência da diversidade dos alunos e valorizá-la. As escolas inclusivas são escolas para todos, o que implica um sistema educacional que reconheça e atenda às diferenças individuais, respeitando as necessidades de qualquer dos alunos. Sob essa ótica, não apenas portadores de deficiências seriam ajudados e sim todos os alunos que, por inúmeras causas, apresentem dificuldades de aprendizagem ou no desenvolvimento.
Não basta incluir é preciso integrar o aluno na classe para que a aprendizagem aconteça, uma vez que integração deve andar junto com a inclusão um completando o outro. Não se pode, em uma ideia inclusiva, dar rótulos ou utilizar modelos de alunos diferenciando-os entre deficientes e não-deficientes, como que essas duas fossem as duas opções possíveis. Essa rotulação não mais existirá quando as diferenças forem entendidas como algo comum e quando aprendermos a respeitá-las e valoriza-las, livres de comparações. Só que para que isso aconteça principalmente os professores precisam ter uma atitude critica perante a sociedade ou então, acontecerá a exclusão dos incluídos dentro da sala de aula.
A dificuldade de aprendizagem dos alunos tem sido atribuída a "defeitos" que os alunos têm como: hiperatividade, disritmia, deficiência mental, etc. estes vem sendo tratados como anormais e não como alunos que precisam ser ajudados. Para mudar este e outras ideias errôneas de educação inclusiva a autora aponta pontos que devem ser revisados como: Quem são os excluídos no sistema educacional, o que contribuem para essa exclusão, por que tantas leis? Remoção de barreiras para a aprendizagem e para a participação, produção sistemática de estudos e pesquisas com análise crítica dos dados, resistências em relação à proposta de educação inclusiva e outros.
Para que se conceba um sistema educacional inclusivo é permitir que os direitos humanos sejam respeitados, de fato. Podendo contar com órgãos públicos que podem e devem ajudar as instituições. Alguns princípios devem fundamentar os sistemas educacionais inclusivos, são eles: direito à educação, à igualdade de oportunidade, escolas responsivas e de boa qualidade, direito a aprendizagem e a participação. As diretrizes do sistema devem nortear a elaboração de planos nacionais de educação para todos, são elas: formular políticas educativas inclusivas; incrementar a inversão de recursos para o desenvolvimento e a aprendizagem de todos; garantir equidade na distribuição de recursos públicos e privados; deixar aberta a participação de diversos setores nas decisões; promover a formação continuada de todos os envolvidos no processo, desde professores a ministros; valorizar o profissional da educação; divulgar informações e usar todos os meios para conscientizar as pessoas; dentre inúmeras diretrizes básicas.
O despreparo dos professores para atuar com a educação inclusiva gera grandes equívocos por parte dos profissionais. Muitos entendem educação inclusiva como uma proposta apenas para deficientes, e desconsidera a integração dos inclusos não acreditando em sua aprendizagem. Confundi inclusão com inserção, privilegia na inclusão a socialização com a ideia de que é o bastante, e acaba por limitar a "leitura de mundo" à sala de aula. Nossas escolas devem ajudar no processo de inclusão deixando de lado seu tradicionalismo e se tornando escolas de boa qualidade, acessíveis a todos, que estimulem e aumentem a participação e reduzam a exclusão. Todo o trabalho da escola deve-se pautar em dar condições para que todos participem do processo de aprendizagem, assim esta deve promover eventos que desenvolvam a cultura, promovam a participação de toda comunidade dentre outras medidas que permitam a inclusão de fato.
O sistema de inclusão encontra barreiras, cabe a toda sociedade resolver, pois somos todos responsáveis pela prevenção de preconceitos e exclusões assim como somos responsáveis pela eliminação das já existentes. A letra da lei diz que os alunos com necessidades educacionais especiais devem ser matriculados e frequentar turmas de ensino regular, porém na realidade nem sempre essa inclusão acontece de fato, seja por falta de conhecimento e formação do professor no assunto ou até mesmo medo e insegurança da família. Esse é o primeiro ponto que deve ser avaliado, a formação dos professores para trabalhar com uma educação inclusiva e também a família deve ser acolhida pela escola pra que não se sinta insegura e acabe por atrapalhar no processo.
Desde o os primórdios da educação pessoas são excluídas do processo outras nem se quer tem a chance de entrar nele. Hoje em dia essa exclusão continua a acontecer, só que discussões vêm acontecendo e projetos estão sendo implantados para tentar mudar essa situação. Entender a educação inclusiva se torna mais simples do que imaginamos, é só querer e lutar por uma educação de qualidade e esquecermos os "rótulos" que a sociedade coloca nas pessoas que não o mesmo "modelo" que a mesma impôs. Nossa sociedade foi construída assim com desigualdades em todos os aspectos, por esse motivo entender a educação inclusiva pode até ser fácil, difícil é fazê-la acontecer. Uma vez que isso também depende das classes médias, altas e dos governantes que nem sempre querem mudar a realidade de desigualdade do país, mesmo sabendo que a educação de qualidade a todos é um passo para uma sociedade sem desigualdades. Cabe aos profissionais da educação começar a mudar a realidade exclusiva de nossas escolas vendo todos os alunos como sujeitos do processo de aprendizagem e considerando a individualidade de cada um.

CARVALHO, ROSITA EDLER
Escola inclusiva: a reorganização do trabalho pedagógico
Entrevista com Rosita Edler Carvalho,
Rosita é autora dos livros "Educação inclusiva: com os pingos nos is", "Escola inclusiva: a reorganização do trabalho pedagógico", "Removendo barreiras para a aprendizagem: educação inclusiva" e "Uma promessa de futuro: aprendizagem para todos e por toda a vida".
Qual os principais pontos abordados pelo livro “Escola inclusiva”?
Para responder à indagação recorri ao próprio livro, reexaminei o sumário e revivi toda a construção do texto, somando as emoções de expressar ideias e experiências com a alegria da produção teórica. E identifiquei alguns pontos que se destacaram, tais como as reflexões do primeiro capítulo que trata das diferenças, para além da diversidade.
Creio que a apresentação da CIF (classificação internacional da funcionalidade) é outro aspecto que o livro traz, contrapondo o modelo social de compreensão da deficiência ao modelo médico de categorização de patologias com os estigmas decorrentes.
Mas, o que considero extremamente importante são as constantes alusões à pesquisa, uma prática que não faz parte, ainda, da cultura das escolas, e que, espera-se, passem a constituir-se em estratégia indispensável para que o trabalho pedagógico de orientação inclusiva possa ser reorganizado, sem romantismos, alicerçado na ‘leitura’ da realidade em seu constante vir-a-ser.
De que forma a educação atual pode se tornar mais inclusiva?
Sem pretender fazer um jogo de palavras, mas valendo-me delas, penso que a forma de tornar a educação atual mais inclusiva é incluir todos e todas nas reflexões sobre o quê falamos quando nos referimos à inclusão. Dizendo de outro modo, creio que estamos todos e todas: educadores, pais, irmãos, comunidade, convidados a pensar no que se pretende nas escolas de orientação inclusiva, isto é uma escola para todos, uma escola que concretize uma promessa de futuro, sem delongas. Entendo que essas reflexões que envolvem a cultura, a política e as práticas pedagógicas devem (ou deveriam) anteceder aos movimentos com os aprendizes.
Qual é, na sua opinião, a maior dificuldade encontrada hoje para que as escolas adotem uma postura inclusiva com relação à educação?
A maior dificuldade é romper com o estatuído, com o que, historicamente, vem sendo praticado. Inclusão é processo e a escola é um espelho da sociedade na qual se insere. E a nossa, infelizmente, ainda está marcada pela desigualdade e por discriminações de toda a ordem. A maior dificuldade está no somatório de dificuldades, extremamente inter-relacionadas, de tal modo que os desafios se agigantam em complexidade.
Nem todas as dificuldades se originam e podem ser resolvidas na e pela escola. Seria, no mínimo, ingênuo supor que assim fosse. Mas as barreiras para a aprendizagem e para a participação para as quais a escola pode contribuir, removendo-as, procuro assinalar no livro, sem a pretensão de esgotar todas as estratégias que podem levar as escolas a assumirem orientação inclusiva.
Qual o papel e a importância da pesquisa neste aspecto?
Numa pergunta anterior eu já havia feito alusão à importância da pesquisa como uma interlocução constante com a realidade que está sempre em movimento.
No caso da educação inclusiva, vejo a pesquisa como indispensável, para que coloquemos os pingos nos “is” na orientação inclusiva que nossas escolas, pretendem assumir, evitando-se a lamentável constatação dos grupos de “inclusos”- como são chamados por alguns professores quando se referem a alunos oriundos de classes e escolas especiais-, presentes nas turmas do ensino regular e que estão à parte. Tratam-se nesses casos de núcleos de reclusão, gerando-se a exclusão na inclusão, talvez uma das mais perversas formas de segregação.
Também precisamos pesquisar a natureza dos liames sociais entre colegas, pois sem integração entre as pessoas a inclusão será simplesmente inserção.


CASTORINA, J.A

Piaget Vygotsky - Novas Contribuições para o Debate
CAPÍTULO I - O DEBATE PIAGET-VYGOTSKY A BUSCA DE UM CRITÉRIO PARA SUA AVALIAÇÃO
          José Antônio Castorina
A discussão sobre as idéias de Piaget e de Vygotsky adquiriu uma notável atualidade no mundo latino-americano. O principal motivo de tal debate reside nas conseqüências divergentes que parecem resultar das teorias na apreciação e orientação da prática educacional.
É necessário dizer, afirma Castorina, "que, para muitos teóricos e profissionais da educação tornam-se evidentes o conflito irredutível e a necessidade de optar entre as mesmas. Tal versão baseada em leituras superficiais, em alguns casos dogmáticas e em outros simplesmente errôneas, dos textos clássicos e das pesquisas mais recentes, impede uma autêntica confrontação, que inclua um exame da natureza das perspectivas e problemas propostos pelos nossos autores. Além disso, dessa forma, evita-se a realização de indagações conjuntas entre piagetianos e vygotskiano: que possam contribuir para a nossa compreensão da prática educativa. "
Para boa parte dos psicólogos do desenvolvimento, psicólogos educacionais e mesmo pedagogos do mundo europeu e também latino-americano, as teorias de Piaget e Vygotsky são duas versões opostas sobre o desenvolvimento intelectual e os processos de aprendizagem.
Reconhece-se que ambas as teorias assemelham-se porque apresentam alguns traços comuns: um estruturalismo fraco, no sentido de que Vygotsky defendeu um estudo inter-relacionado e não reducionista das funções e processos psicológicos, e Piaget insistiu na constituição de sistemas estruturais como a chave do desenvolvimento da inteligência; um enfoque genético partilhado na medida em que as funções psicológicas em Vygotsky e os sistemas de conhecimento em Piaget podem ser estudados apenas em seu processo de formação; e o fato de que tanto Vygotsky quanto Piaget enfatizaram a atividade do sujeito na aquisição do conhecimento e o caráter quantitativo da mudanças no desenvolvimento (Garcia Madruga, 1991).
No entanto, argumenta o autor "para esta versão, as diferenças são mais relevantes do que as semelhanças”. Em Vygotsky, a interação social e o instrumento linguístico são decisivos para compreender o desenvolvimento cognitivo, enquanto em Piaget, este último é interpretado a partir da experiência com o meio físico, deixando aqueles fatores em um lugar subordinado. Além do mais, o processo de desenvolvimento intelectual, explicado em Piaget pelo mecanismo de equilibração das ações sobre o mundo, precede e coloca limites aos aprendizados, sem que estes possam influir sobre aquele.
Ao contrário, para Vygotsky, a aprendizagem interage com o desenvolvimento, produzindo sua abertura nas zonas de desenvolvimento proximal, nas quais as interações sociais e o contexto sócio-cultural são centrais".
Em linhas gerais, continua Castorina, a teoria piagetiana é apresentada como uma versão de desenvolvimento cognitivo nos termos de um processo de construção de estruturas lógicas, explicada por mecanismos endógenos, e para a qual a intervenção social externa só pode ser "facilitadora” ou “obstaculizadora”. Em poucas palavras, uma teoria universalista e individualista do desenvolvimento, capaz de oferecer um sujeito ativo, porém abstrato (“epistêmico”), e que faz da aprendizagem um derivado do próprio desenvolvimento.
A teoria de Vygotsky aparece como uma teoria histórico-social do desenvolvimento que, pela primeira vez, propõe uma visão da formação das funções psíquicas superiores como internalização mediada da cultura e, portanto, postula um sujeito social que não é apenas ativo mas sobretudo interativo.    
Castorina afirma que a comparação padrão está formulada a partir das seguintes suposições:
1) As teorias em debate são respostas a uma série de problemas comuns levantados pelo desenvolvimento cognitivo: o dos "fatores determinantes do desenvolvimento", o da "formação da linguagem e sua intervenção no pensamento", ou o levantado pela "relação entre o individual e o social no desenvolvimento", ou a "redução, dualidade ou interação entre desenvolvimento e aprendizagem".
2) Com relação a tais problemas, são estabelecidas teses mais ou menos opostas, mais ou menos diferentes: uma seqüência universal de formas de pensamento em face de um pro­cesso contextualizado de apropriação da cultura; a linguagem do grupo cultural dirigindo a formação dos conceitos em face de uma história de reestruturação lógico-matemática que utiliza a linguagem unicamente como significante; a constituição dos conhecimentos explicada por "Internalização” da cultura em face de uma explicação por equilibração dos sistemas de conhecimento; o ator dos conhecimentos como sujeito social em face de um sujeito universal e individual; o aprendizado como orientador do desenvolvimento cognitivo em face dos processos de desenvolvimento dirigindo as aprendizagens, etc.
3) O resultado dessa comparação coloca professores e pedagogos diante da opção entre suas teorias do desenvolvimento intelectual e da aprendizagem, bem como diante de duas maneiras de conceber à prática educacional. Explica Castorina que o esforço de Vygotsky foi mostrar que, além dos mecanismos biológi­cos 
apoiados na evolução filogenética e que estavam na origem das funções "naturais”, existe um lugar crucial para a intervenção dos sistemas de signos na constituição da subjetividade! A tese é que os sistemas de signos produzidos na cultura na qual vivem as crianças não são "'facilitadores da atividade psicológica, mas seus formadores. "Na perspectiva adotada para problematizar o desenvolvimento psicológico e particularmente o cognitivo, a transição de uma influência social externa sobre o indivíduo para uma influência social interna encontra-se no centro da pesquisa (Vygotsky, 1979)”.
Mas tanto essa tese, garante o autor, da origem social e não natural do psiquismo superior do interpsicológico ao intrapsicológico, quanto a adoção de uma análise genética da transição estão articuladas e dependem conceitualmente da pressuposição da existência dos sistemas de signos.
A afirmação de que a presença de estímulos criados, junto aos estímulos dados, é a característica diferencial da psicologia humana (Vygotsky, 1979) implica que o estudo genético ocupa-se da aquisição de sistemas de mediação e que o controle consciente da própria atividade depende da utilização daquelas ferramentas psicológicas.
   O enfoque construtivista para interpretar o desenvolvimento dos conhecimentos, salienta Castorina, é uma tentativa de superar o dualismo entre o sujeito e o objeto de conhecimento. O sujeito aparece construindo seu mundo de significados ao transformar sua relação com o real, penetrando cada vez mais profundamente neste último e em sua própria maneira de pensar. Des­ta forma, quando ocorre cada progresso que aproxima o sujeito do conhecimento do objeto, este recua.
Os modelos sucessivos do sujeito permanecem na categoria de aproximações que não podem atingir este limite constituído pelo objeto em suas propriedades ainda desconhecidas (Piaget, 1980).
Para o autor, o empreendimento epistemológico e a tese construtivista são o contexto no qual Piaget avançou na explicitação dos mecanismos e processos psicológicos dos últimos anos da sua obra, tais como as abstrações e generalizações, os conflitos cognitivos, a tomada de consciên­cia ou a criação de possibilidades. Esses mecanismos e processos adquirem seu significado se os situarmos com respeito à posição assumida sobre a relação entre o sujeito e o objeto de conhe­cimento. Eles associaram-se à hipótese nuclear do programa piagetiano: o mecanismo de equilibração entre a assimilação e a acomodação que pretende dar conta do modo pelo qual obje­to e sujeito interagem.
Com relação ao desenvolvimento, o projeto piagetiano visou reconstruir as transições entre as formas "de poder fazer" com o mundo, esclarecendo que cada uma está vinculada aos proble­mas que as crianças possam resolver ao interrogar a realidade - física ou social- ou ao tornar seu o que outros Ihes colocaram. E o processo de transição exprime as reorganizações do "ponto de vista" infantil, da sua forma de significar os objetos de conhecimento.
Vygotsky contrapôs sua perspectiva sobre as relações entre a aprendizagem e o desenvolvimento à apoiada por Piaget.
Segundo ele, os processos de desenvolvimento são independentes da aprendizagem. E mais, os processos de desenvolvimento são condição prévia para a realização de um aprendizado, porém não são alterados por ele.
Ao contrário, explica o autor, para Vygotsky, ambos os processos estão intimamente inter-relacionados, porque a aquisição de qualquer habilidade infantil envolve a instrução proveniente dos adultos, antes ou durante à prática escolar. A própria noção de "aprendizagem" significa processo de ensino-aprendizagem, justamente para incluir quem aprende, quem ensina e a relação; social entre eles, de modo coerente com a perspectiva sócio-histórico (Oliveira, 1993). Assim, a aprendizagem, salienta Castorina, consiste na internalização progressiva dos instrumentos mediadores e é uma aplicação do princípio antes mencionado - todo processo psicológico superior vai do âmbito externo para o interno, das interações sociais para as ações internas, psicológicas.
A atenção de Vygotsky aos processos de aprendizagem deve-se ao fato de os mesmos obri­garem ao processo de mediação e potencializá-Io, de forma que o desenvolvimento cultural da criança equivale à sua aquisição dos sistemas sociais de mediação-representação (Alvarez & Del Rio, 1990).
Vygotsky produz a hipótese da "zona de desenvolvimento proximal", que evidencia o caráter orientador da aprendizagem com relação ao desenvolvimento cognitivo. Isto é, a afirmação da distancia entre "o nível de desenvolvimento real da criança, tal e como pode ser determinado a partir da resolução independente de problemas, e o nível potencial, determinado pela resolução de problemas sob a direção de um adulto ou em colaboração com um colega mais capaz" (Vygotsky, 1979) Trata-se de um "espaço" dinâmico, no qual aquilo que uma criança só puder fazer com a ajuda de outro, no futuro poderá fazer sozinha.
Dessa forma, explica Castorina, "o desenvolvimento do indivíduo e a ulterior consolidação das funções psicológicas estão "precedidos" pela aprendizagem. Nesta, a intervenção de profes­sores ou outros adultos contribui para orientar o desenvolvimento rumo à apropriação dos instru­mentos de mediação cultural."
O autor comenta o alcance das indagações de Piaget e da sua escola sobre a aprendizagem.
Em primeiro lugar, cabe ressaltar que os primeiros estudos tiveram um propósito declaradamente epistemológico: por um lado estabelecer se a percepção era uma leitura direta da experiência e, por outro, se podia haver seqüências de aprendizagem unicamente em função da experiência (Gréco, 1959).
Depois, continua Castorina, os estudos sobre a aprendizagem de estruturas lógicas preten­deram determinar se os reforços empíricos modificavam os conteúdos conceituais ou a forma de inferência. E as conclusões também assumiram um significado epistemológico: para utilizar os resultados da experiência, é preciso que os mesmos sejam assimilados a sistemas prévios de conhecimento.
Concluindo, os estudos de Inhelder e sua equipe (1975) não se ocuparam tanto em defender as teses construtivistas quanto em precisar os mecanismos da modificação estrutural, tentando-se responder a pergunta: é possível produzir uma modificação do nível estrutural do sujeito que apele ao mecanismo espontâneo do funcionamento intelectual?
Os resultados das indagações parecem mostrar que os progressos deveram-se às tomadas de consciência dos conflitos e a uma coordenação gradual de esquemas de conhecimento.
Há de se frisar, diz Castorina, que no caso da aprendizagem e do desenvolvimento, as inda­gações situam-se em planos diferentes, e, por isso, as versões também são distintas. Quando Vygotsky postula o caráter orientador da aprendizagem com relação ao desenvolvimento, está formulando a tese crucial segundo a qual a aquisição dos instrumentos de mediação cultural, isto é, a atividade educacional, é constitutiva do curso do desenvolvimento. Quando Piaget postula a continuidade, salienta o autor, entre desenvolvimento e aprendizagem está pensando nos meca­nismos que dirigem a mudança do "ponto de vista do sujeito Isto é, seja qual for o modo pelo qual lhe são apresentados os problemas ou os objetos a serem conhecidos, entra em funcionamento um processo de reinvenção ou redescoberta devido à sua atividade estruturadora.
Ao citarmos a relação entre aprendizagem e desenvolvimento no contexto da intemalização dos sistemas de mediação, o autor diz compreender a afirmação de Vygotsky, segundo a qual "a aprendizagem organizada converte-se em desenvolvimento mental e coloca em funcionamento uma série de processos evolutivos que nunca poderiam ocorrer à margem do aprendizado"
Segundo Castorina, "os estudos experimentais da equipe de inhelder sobre as aprendiza­gens estruturais contribuíram para esclarecer certos aspectos do mecanismo central da equilibração, como os conflitos entre esquemas de ação".
Compreende-se que esses estudos sobre as aprendizagens não tenham modificado o curso do desenvolvimento dos sistemas de categorias, no sentido de que a aceleração não implicou que os sujeitos saltassem níveis nem deixassem de superar os mesmos obstáculos cognitivos que teriam enfrentado sem a situação experimental; ou que os aprendizes tivessem se beneficiado mais com as incitações do meio segundo a estruturação dos seus esque­mas.
A educação é vista como um desafio para o programa de Piaget.
Para ele, os alunos conseguem adquirir as noções científicas não explicitadas nos materiais de aprendizagem, pela sua atividade de exploração e pesquisa.
Para Vygotsky, o processo de aprendizagem está centrado na internalização de instrumentos culturais, permitindo que a criança avance rumo aos sistemas conceituais.
Para Castorina, a admissão da "zona de desenvolvimento proximal" implica aceitar um con­trole do desenvolvimento pela aprendizagem, quanto ao poder que os saberes escolares exercem sobre a aquisição.
Entretanto, isso não significa que os mecanismos de conhecimento sejam controláveis: é preciso assumir que eles funcionam contextuaImente nas condições do ensino e da interação com os professores, porém sua intimidade permanece fora da consciência do próprio aprendiz. Para um piagetiano, seria indispensável admitir a existência desse mecanismo para enfrentar os desafios supostos pela zona proposta por Vygotsky.
Castorina salienta que "admitindo as diferentes raízes das perguntas, e das perspectivas, não existe incompatibilidade entre o construtivismo e a aquisição de conhecimentos na zona de desenvolvimento proximal.
Mas é necessária a realização de indagações que mostrem efetivamente o desenvolvimento dos mecanismos os universais de apropriação no interior daquela interação com os saberes escola­res e um avanço na reconstrução psicogenética das idéias prévias que correspondem aos conteú­dos curriculares em diferentes domínios.
O autor recorda estudos de orientação piagetiana que evidenciam aquisições fora da esco­la, no desenvolvimento psicogenético como a linguagem e as idéias sobre as instituições sociais i que as crianças não poderiam adquirir sozinhas.
Isto é, cada vez que as crianças deparam-se com objetos simbólicos que exigem "Interpretantes, quer se trate do sistema vocálico na aquisição inicial da linguagem (Sinclair et La, 1985), quer do sistema de representação escrita (Ferreiro, 1986), quer ainda das ordens ou gestos de uma autoridade escolar (Castorina & Gil Antón, 1994), o conhecimento desses objetos só pode ocorrer durante uma complexa interação social.
A internalização da interação interpsicológica, para Vygotsky é o principal mecanismo que explica o desenvolvimento psicológico humano, tendo sido originalmente examinada no contexto da emergência das funções psicológicas guiadas pelas sugestões de outros.
          Muitos educadores interpretaram a internalização segundo os termos de uma transferência da ação externa para um plano interno.
Uma versão que recorda as teses comportamentais da "cópia interna" dos modelos de ação externa, e na qual as crianças são recipientes passivos da socialização.
Pelo contrário, diz Castorina, "os textos de Vygotsky (1977) e dos seus discípulos parecem mostrar que não se trata de uma transmissão, mas de uma transformação. Isto é, de uma modifica­ção da compreensão individual dos instrumentos de mediação cultural como a linguagem, e por­tanto "não é uma transferência de uma atividade externa para um preexistente 'plano de consciência' interno: é o processo no qual este plano interno forma-se" (Leontiev, 1981).
A internalização, para Vygotsky, envolve uma série de transformações: por um lado, toda atividade externa deve ser modificada para tornar-se uma atividade interna, "a internalização trans­forma o próprio processo e modifica sua estrutura e funções" (Vygotsky, 1979); por outro, é uma atividade interpessoal que se converte em intrapessoal."
          Grande polêmica entre Piaget e Vygotsky surgiu com relação a formação de conceitos científicos         ­.
Segundo Castorina, "o pensamento de Vygotsky sobre a formação de conceitos é uma concretização da sua hipótese básica: as formas culturais internalizam-se ao longo do desenvolvimento dos indivíduos e constituem-se no material simbólico que medeia sua relação com os objetos de conhecimento."
Devido a isso, seu problema central com respeito à formação dos conceitos é a dos "meios' que o tornam possível. E da sua perspectiva, a interação dos indivíduos com os objetos do mundo está orientada pelas palavras que representam categorias culturais e que se transformam em ins­trumentos para formar os conceitos.
Dessa forma, a palavra funciona primeiro em seu papel de meio e depois no de símbolo do conceito (Vygotsky, 1977).      
Castorina ressalta que a formação de conceitos cotidianos, desde os conjuntos "sincréticos" até os "pseudoconceitos", é tratada em boa medida por Vygotsky a partir da psicologia individual. Assim, na mesma intervêm processos intrapsicológicos como as associações de propriedades e as abstrações a partir dos objetos. Mas, de qualquer maneira, tais processos seriam insuficientes para formar os conceitos se ao mesmo tempo não interviesse o uso da palavra (Vygotsky, 1977).
No exame da formação dos conceitos científicos, argumenta Castorina, Vygotsky coloca-se na perspectiva da sua emergência no contexto da atividade escolar, ocupando-se em indagar como esta oferece um marco discursivo (o sistema científico) para tal de envolvjmento (Wertsch, 1992). Neste caso, Vygotsky enfoca sua análise nos termos da relação de ensino-aprendizagem como formadora dos processos intrapsicológicos.
Embora os adultos, portadores dos significados sociais desempenhem um papel na constitui­ção dos conceitos cotidianos, no caso da formação dos conceitos científicos os professores intro­duzem-nos explicitamente na escola.
Tais conceitos se sobrepõem ou são identificados com os ensinados na escola e são apre­sentados como um sistema inter-relacionado de idéias.
O autor resume alguns traços específicos da sua formação: basicamente, aquela apresenta­ção sistemática obriga uma atitude metacognitiva dos alunos, isto é, a um domínio e controle cons­ciente do sistema conceitual, bem como a uso deliberado das suas próprias operações mentais; além disso, só os processos de ensino-aprendizagem permitem acesso dos aprendizes aos co­nhecimentos estabelecidos das ciências; também, diferentemente dos conceitos cotidianos, pensamento sobre as idéias científicas não se refere diretamente aos objetos, mas ao conhecimento cotidiano, sobre qual faz "uma generalização de generalizações"; por último cabe ressaltar que tal reconstrução dos conceitos cotidiano à disposição envolve uma interação entre a formação de conceitos científicos e cotidianos (Vygotsky, 1977; Van der Veer Valsiner, 1991).
Por outro lado, continua Castorina, "no programa de Piaget, a pesquisa da constituição dos conceitos científicos também ocupava um lugar primordial, porém a partir de outras perguntas, que são as questões típicas da epistemologia genética: de que maneira a psicogênese das categorias que estão na base das ciências fornecem material empírico para as hipóteses epistemológicas.
Dessa forma, a gênese dos conceitos de causalidade, das conservações físicas e lógico-matemáticas, das noções espaciais, em articulação com as análises histórico-críticas das ciênci­as, permite a busca de mecanismos comuns de construção (Praget & Garcia, 1981).
Castorina ressalta que o termo "conceito" refere-se às grandes categorias que possibilitam a estruturação cognitiva e que não podem ser identificadas com os sistemas conceituais específicos de um domínio de conhecimento, e muito menos com a sua forma escolar.
CAPÍTULO lI - PENSAR A EDUCAÇÃO CONTRIBUIÇOES DE VYGOTSKY
Marta Kohl de Oliveira
          Para Kohl, existe uma situação complexa envolvendo as propostas teóricas e a prática peda­gógica.
Segundo ela, "a questão da relação entre os processos de desenvolvimento e de aprendiza­gem é central no pensamento de Vygotsky. Sua posição é essencialmente genética: procura com­preender a gênese, isto é, a origem e o desenvolvimento dos processos psicológicos. Sua abordagem genética desdobra-se nos níveis filogenético (desenvolvimento da espécie humana), sociogenético (história dos grupos sociais), ontogenético (desenvolvimento do indivíduo) e microgenétíco (desenvolvimento de aspectos específicos do repertório psicológico dos sujeitos), os quais interagem na construção dos processos psicológicos. Sua preocupação com o desenvol­vimento é, pois, uma constante em seu trabalho) marcando claramente sua abordagem sobre os _ fenômenos psicológicos.
Afirma Kohl que dada a importância que Vygotsky atribui à dimensão sócio-histórica do funcionamento psicológico e à interação social na construção do ser humano, o processo de aprendizagem é igualmente central em sua concepção sobre o homem.
Ou seja, ao lado da postura genética que fundamenta seu interesse pelo desenvolvimento sua abordagem específica sobre o desenvolvimento, que leva em conta a inserção do homem em um ambiente histórico e cultural, fundamenta a ênfase que dá à aprendizagem dentro de sua teo­ria.
Em se tratando de Vygotsky aprendizagem está relacionada ao desenvolvimento desde início da vida humana, sendo "um aspecto necessário e universal do processo de desenvolvimento das funções psicológicas culturalmente organizadas e especificamente humanas" (Vygotsky; 1984)         
O percurso de desenvolvimento do ser humano é, em parte, definido pelos processos de maturação do organismo individual, pertencente à espécie humana, mas é a aprendizagem que possibilita o despertar dos processos internos.
O conceito original de Vygotsky não se refere apenas à aprendizagem ou ao ensino, mas um processo global de relação interpessoaI que envolve alguém que aprende, alguém que ensine a própria relação ensino-aprendizagem.
São três as idéias básicas de'Vygotsky:
1) desenvolvimento psicológico deve ser olhado de maneira prospectiva, isto é, para além de momento atual, com referência ao que está por acontecer na trajetória do indivíduo. O conceito de zona de desenvolvimento proximal, talvez o conceito específico de Vygotsky mais divulgado e reconhecido como típico de seu pensamento, está estreitamente ligado (postulação de que o desenvolvimento deve ser olhado prospectivamente: marca com mais importantes, no percurso de desenvolvimento, exatamente aqueles processos que estão embrionariamente presentes no indivíduo, mas ainda não se consolidaram. A zona de desenvolvimento proximaI é, por excelência, o domínio psicológico da constante transformação. Em termos de atuação pedagógica, essa postulação traz consigo a idéia de que o papel explícito do professor de provocar nos alunos avanços que não ocorreriam espontaneamente consiste exatamente em uma interferência na zona de desenvolvimento proximal dos alunos. O único bom ensino, afirma Vygotsky, é aquele que se adianta ao desenvolvimento. .
2) os processos de aprendizado movimentam os processos de desenvolvimento. A relação entre os processos de desenvolvimento e de aprendizado é central no pensamento de Vygotsky: a trajetória do desenvolvimento humano se dá "de fora para dentro", por meio da internalização de processos interpsicológicos. As metas e os processos de desenvolvimento do indivíduo humano, o qual jamais existe enquanto tal rara de um grupo cultura específico, são sempre definidos culturalmente. Um ser humano que passe toda a sua vida no interior de um grupo cultural ágrafo, por exemplo, jamais será alfabetizado. Mesmo possuindo todo o aparato físico da espécie que possibilita aos seus membros o aprendizado da leitura e da escrita.
3) finalmente, a importância da atuação dos outros membros do grupo social na mediação entre cultura e indivíduo e na promoção dos processos inter-psicológicos que serão posteriormente internalizados.
Outro ponto abordado por Kohl é a questão da alfabetização.
Segundo ela, "é importante, no presente contexto, que se discuta brevemente algumas ques­tões referentes aos processos de aquisição da língua escrita. As idéias de Vygotsky, particularmente relevantes para a educação, subsidiam claramente sua concepção sobre o processo de alfabetização.”
A escrita, continua, sistema simbólico que tem um papel mediador na relação entre sujeito e objeto de conhecimento, é um artefato cultural que funciona como suporte para certas ações psicológicas, isto é, como instrumento que possibilita a ampliação da capacidade humana de registro transmissão e recuperação de ideias, conceitos, informações.
Continuando Kohl, a escrita seria uma espécie de ferramenta externa, que estende a potencialidade do ser humano para fora de seu corpo: da mesma forma que ampliamos o alcance do braço com o uso de uma vara, com a "escrita ampliamos nossa capacidade de registro, de me­mória e de comunicação,
Existe uma diferença significativa entre a concepção de Ferreiro e a de VYrFtsé:;- e sobre alfabetização.
Ferreiro centra na natureza interna da escrita enquanto sistema Vygotsky e Luria centra-se nas funções desse sistema para seus usuários.
Kohl afirma que Luria trabalha com a criança da fase pré-silábica de Ferreiro, isto é, com a criança que ainda não percebeu que a escrita representa o som da fala.
Lúcia propõe uma sequência para o processo de aquisição da escrita pela criança, que se refere justamente ao domínio do modo de utilização do sistema  de escrita e de sua função. Inicialmente, a criança passa por uma fase de imitação da escrita, do formato externo da escrita:  faz rabiscos imitam fisicamente a escrita do adulto, sem nenhum valor instrumental. Isto é, quando a criança for solicitada, em um momento posterior,  a  lembrar-se do que escreveu, sua escrita não terá nenhuma utilidade, não a auxiliando na tarefa de recuperação  da informação originalmente registrada.
Em uma segunda fase, a criança passa a utilizar o que Luria chama de "marcas topográficas” registros gráficos distribuídos pelo papel,  cuja posição no espaço poderá auxiliar na “leitura” posterior dessa escrita. A criança procura associar o lugar onde fez as marcas com o conteúdo do registro, evidenciando, assim, maior compreensão da escrita como instrumento auxiliar da memória.
A seguir, a criança passa a produzir uma escrita  claramente relacionada ao conteúdo da fala a ser registrada, fazendo diferenciações de acordo com o tamanho, a quantidade, a forma ou a cor do referente.
Assim, por exemplo, uma marca bem preta pode ser utilizada para representar a escuridão do céu; vários tracinhos podem indicar "muitas formigas”  em oposição a uma formiga, representada por um tracinho isolado; um quadrado grande pode lembrar um cachorro, contrastado com um quadrado pequeno que é seu filhote.
Depois dessa fase, a criança será capaz de utilizar representações pictográficas como forma de escrita, produzindo desenhos simplificados para registrar diferentes conteúdos da fala, garan­tindo assim, a recuperação da informação em momentos posteriores.
Em segundo lugar, afirma Kohl, é fundamental que as duas interpretações sobre o processo de aquisição da escrita sejam confrontadas com dados de pesquisas contemporâneas, que contri­buam para a recontextualização das teorias tendo em vista a condição dos diferentes grupos de crianças que enfrentam a tarefa de dominar o sistema de escrita. E interessante investigar, por exemplo, se a criança a urbana contemporânea passa ou não pelas fases propostas por Luria.
Ele desenvolveu seu trabalho com crianças russas do final da década de 1920, e é razoável supor que o contato que uma criança pequena tinha com a escrita nesse momento, nesse local, fosse muito diferente daquele possível em uma cidade como São Paulo, hoje.
Se, afirma Kohl, "do ponto de vista de Vygotsky, para haver desenvolvimento tem de haver aprendizagem e para haver aprendizagem, especialmente de funções psicológicas superiores em que a cultura é de fundamental importância, é necessário que haja intervenção, no que diz respeito à questão específica da alfabetização, por um lado o desenvolvimento das capacidades de leitura e escrita se apoia na imersão da criança em uma sociedade letrada, em sua participação em um mundo que utiliza a palavra escrita.
Por outro lado, esse desenvolvimento se apoia fortemente em processos de intervenção de­liberada, que ocorrem tipicamente na escola, para que a criança possa dar o salto qualitativo ne­cessário à apreensão do sistema completo, sua estrutura, usos e funções."
CAPÍTULO III - O ENSINO E O APRENDIZADO ESCOLAR
Delia Lerner
Muitos consideram Piaget e Vygotsky antagônicos.
Lerner explica que a oposição é colocada nos seguintes termos:
- os piagetianos colocam em primeiro plano o desenvolvimento operatório ou o funciona­mento cognitivo geral;
- os vygotskianos centram-se na transmissão dos conteúdos escolares, isto é, dos saberes culturais.
- os piagetianos enfatizam a produção individual do conhecimento
- os vygotskianos atribuem grande importância à construção social
- os piagetianos minimizam a intervenção docente
- os vygotskianos consideram esta intervenção fundamental para a aprendizagem.
          Segundo Lerner, "construir conhecimento novo no marco de uma teoria científica é algo muito diferente de aplicar um dogma, é realizar um trabalho crítico permanente para detectar lacunas ou contradições, é apoiar-se no saber já elaborado para penetrar em domínios inexplorados. Assim o entenderam aqueles que, ao empreenderem a análise do fator social do desenvolvimento cognitivo, não só ressaltaram mecanismos que ainda não tinham sido revelados, mas também questionaram algumas propostas prévias e abriram o caminho para a sua superação”.
Em seguida, a autora analisa algumas afirmações:
a) Ensinar é colocar problemas a partir dos quais seja possível reelaborar os conteúdos es­colares. Segundo ela, duas condições são essenciais: deve ter sentido no campo de co­nhecimento dos alunos, porém não deve ser resolúvel só a partir dos conhecimentos que as crianças já possuem. Em outras palavras, uma situação problemática tem de permitir que os alunos ponham em prática os esquemas de assimilação que já construíram e interpre­tem-na a partir dos mesmos, porém estes conhecimentos prévios não devem ser suficien­tes para resolvê-Ia: a situação deve exigir a construção de novos conhecimentos ou de novas relações entre os já elaborados. Também é conveniente que o problema seja rico e aberto, que coloque os alunos diante da necessidade de tomar decisões, que Ihes permita escolher procedimentos ou caminhos diferentes (Douady, 1986; Inhelder, 1992).
b) Ensinar é fornecer toda a informação necessária para que as crianças possam avançar na reconstrução do conteúdo sobre o qual estão trabalhando. A informação, às vezes é ofere­cida diretamente e outras vezes recorrendo a material escrito; em alguns casos, pode as­sumir a forma de uma pergunta e, em outros, adota a de um contra-exemplo destInado a questionar um excesso de generalização. Dessa maneira, em face de uma produção in­fantil que pretende ser uma notícia, porém omite o título, o professor pode frisar "temos que colocar um título porque todas as notícias o possuem", ou pode sugerir "olhe como come­çam as noticias que lemos estes dias e compare com o começo da sua, uma pergunta como "qual é a relação entre este parágrafo e o seguinte?" - por exemplo. Do nosso ponto de vista, continua Kohl, é indubitável que a função do professor é oferecer a informação necessária para as crianças avançarem na construção do conhecimento. A única informa­ção que o professor não dará - precisamente porque se trata de os alunos construírem o conhecimento - é a que corre o risco de obstaculizar o processo construtivo, de impedir que as crianças elaborem suas próprias estratégias para resolver o problema colocado.
c) Ensinar é favorecer a discussão sobre os problemas formulados, é oferecer a oportunida­de de coordenar diferentes pontos de vista, é orientar para a resolução dos problemas colocados. Para a autora, é evidente a importância que têm, para a formação de usuários competentes da língua escrita, as diferentes situações que o trabalho de grupo põe em jogo: não se trata apenas da confrontação entre diferentes hipóteses sobre a natureza do sistema de escrita, mas também das discussões vinculadas às distintas interpretações dos textos lidos, do intercâmbio de informações sobre diversos aspectos do sistema de escrita e da linguagem escrita, das conversações que levam a planejar o que será escrito, da co-­produção de textos, da revisão conjunta dos textos produzidos, do trabalho conjunto para compreender textos difíceis.
d) Ensinar é incentivar a formulação de conceitualizações necessárias para o progresso no domínio da língua escrita, é promover redefinições sucessivas até atingir um conhecimen­to próximo ao saber socialmente estabelecido. Segundo Kohl, em primeiro lugar, trata-se de sistematizar os conhecimentos sobre os quais foi realizado um trabalho em diferentes situações. Cada vez em que um texto é produzido ou revisado,- por exemplo, discutem-se ­entre muitas outras questões problemas referentes à ortografia literal, à acentuação, à pon­tuação. Esses problemas, que apareceram com o uso da língua escrita, originaram dis­cussões e levaram à tomada de decisões específicas para questões também específicas: em certos casos, decidiu-se colocar um "ponto, na mesma linha" e, em outros, uma vírgula ou um "ponto e parágrafo", porque isso era exigido no contexto.
e) Ensinar é fazer com que as crianças coloquem novos problemas que não tenham sido levantados fora da escola. Segundo ela, além de devolver às crianças a possibilidade de elaborar respostas para os problemas colocados pelos outros-, devemos restituir-Ihes o direito de formular novas perguntas. As novas interrogações surgem ao longo do proces­so. Ao tentar resolver o problema colocado pelo professor - escrever uma noticia, por exem­plo - os alunos colocam-se sub-problemas referentes a aspectos especificas (escrevo o título antes ou depois do resto? No corpo da notícia deve ser repetida a informação coloca­da na chamada?) ou perguntam-se sobre a relação entre este tipo de texto e outros (estou olhando o editorial, será que isso servirá? Será que as notícias e os editoriais são escritos da mesma maneira?); as informações proporcionadas pelo professor e as dis­cussões com os colegas também originam o aparecimento de novos problemas; a sistematização dos conhecimentos que foram sendo elaborados nas situações de uso da lín­gua escrita, ao organizar o que se sabe e diferenciá-Ia daquilo que ainda não foi suficien­temente compreendido, também constitui uma fonte de problemas, permite interrogar-se sobre possíveis relações que antes não tinham sido percebidas.
Por outro fado, conclui Kohl, "quando as perguntas dos alunos ocupam um lugar na sala de aula, eles costumam surpreender-nos com inquietações que abrem novos caminhos para a re­construção dos conteúdos que estão sendo trabalhados."
CAPÍTULO IV - SOBRE A NECESSÁRIA COORDENAÇÃO ENTRE SEMELHANÇAS E DIFERENÇAS
Emília Ferreiro
O objetivo do trabalho é esclarecer as semelhanças e a diferenças entre a visão do desenvolvimento da escrita na criança apresentada por Luria e Vygotsky e a visão desse mesmo desenvol­vimento resultante dos próprios trabalhos da autora.
Segundo ela, Luria realizou a pesquisa com crianças neste campo mas em menor medida, enquanto que a síntese apresentada por Vygotsky, que apoia os resultados e interpretações de Luria, inclui este desenvolvimento em um marco mais amplo.
Para Ferreiro "a difusão no Ocidente do texto de Luria sobre o desenvolvimento da escrita na criança” - texto de i 929 - suscitou um amplo movimento de admiração. Muitas de suas ideias coin­cidem com as de Ferreiro, especialmente no que se refere a história da escrita na criança que começa muito antes da primeira vez em que o professor coloca um lápis em sua mão e lhe mostra como formar letras.
Para a autora, "a comparação mais óbvia entre os achados de Luria e os nossos reside na consideração da quantidade de níveis evolutivos distinguidos e no modo de distingui-los. Isto foi o que fizeram, no Brasil, Rocco (1990) e Setúbal (1993). Entretanto, no meu ponto de vista, o mais importante a ser comparado não reside ali.
As diferenças entre Luria (1929) e Ferreiro (1979) situam-se no nível das perguntas que gui­am a experimentação- Ambos têm perguntas que Ihes permitem ver "algo novo" nas produções infantis. Porém não são as mesmas perguntas.
Para Luria e Vygotsky, a escrita é uma técnica sociocultural importantíssima que, depois de aprendida, afeta as funções psíquicas superiores. Luria pergunta-se sobre os mecanismos de apropriação dessa técnica, criada pela humanidade para cumprir duas funções fundamentais: uma função mnemônica e uma função de comunicação.
Luria afirma: "Um adulto escreve algo se ele quiser lembrar-se dele ou transmiti-lo aos outros. As atitudes de grupo desenvolvem-se bastante tarde na criança; portanto esta segunda função daí escrita não aparece quando ela ainda se encontra em seus estágios embrionários”.
Luria cita para sustentar que a função comunicativa da escrita não pode aparecer "nos seus estágios embrionários” - Piaget em Linguagem e Pensamento.
Observe, comenta Ferreiro, "inclusive nas mãos de um leitor tão competente como Luria, Piaget começa a desempenhar um dos papéis mais contraproducentes, o papel que o Piaget pesquisador nunca tentou desempenhar, nem no terreno educacional nem no psicológico: o de criar "proibi­ções", o de ressaltar "o que uma criança não pode fazer".
É claro, continua Ferreiro, que Piaget analisou com a maior atenção as limitações de certo nível de desenvolvimento, porém só depois de ter indicado seus êxitos com relação a um nível precedente. Obras como Nascimento da inteligência e A construção do real são exemplos deste duplo movimento com o qual é analisada cada nova aquisição: os êxitos com relação à etapa precedente; as limitações no tocante à(s) subsequente(s).
Segundo Ferreiro, é importante observar que esse é precisamente, o modo de proceder de' Luria no caso da escrita: Luria esforça-se por ver cada nível distinguido como "positivo" e como "negativo" ao mesmo tempo.
Assim, no enfoque de Luria, a escrita possui duas funções: mnemônica e comunicativa. Dado que a função comunicativa não estaria ao alcance das crianças pequenas, cabe apenas estudar função mnemônica.
Mas observem bem, cita Ferreiro: Luria não trata de identificar que funções a escrita poderia cumprir do ponto de vista de um sujeito em desenvolvimento. Pelo contrário, trata de observar como a criança assume as funções que um adulto atribui à escrita. Em outros termos, como ela chega a utilizar apropriadamente a escrita, em contextos onde também os adultos a utilizariam, para garantir uma recordação exata de um enunciado linguisticamente codificado.
O funcional, portanto, está subordinado à ideia instrumental da escrita.
Ferreiro não coloca as mesmas perguntas. Não caracteriza a escrita como uma técnica, mas sim como um objeto, como um modo particular de existência no contexto sociocultural Quer saber que tipo de objeto é a escrita para uma criança em processo de desenvolvimento. Considera-a um objeto em si, apto para uma indagação epistemológica. Não pensa que seja, a priori, um instru­mento ou uma mera técnica. Por isso não atribui apressadamente à escrita as funções que essa cumpre no adulto.
Além disso, comenta Ferreiro, como o objetivo manifesto da experimentação era "acelerar o processo" e fazer a criança passar dos grafismos indiferenciados a "uma atividade gráfica diferen­ciada", Luria descobre que a introdução de referências numéricos nas orações propostas para ser recordadas, bem como a menção de objetos que podiam ser desenhados facilmente aceleravam a passagem à assim chamada "pictografia".
Aqui também existem diferenças sensíveis com Ferreiro (1979), que não tenta acelerar o processo - mal poderia nessa época tratar de acelerar um processo que desconhece, mas sim inferir, através das produções infantis, a maneira pela qual as crianças concebem a escrita.
Ferreiro se questiona como poderia acelerar um processo desconhecido? Existem duas maneiras de fazer isso:
          1) definir um nível ou estágio final que deve ser alcançado o quanto antes e independente­mente das Interpretações infantis sobre o objeto desse aprendizado;
          2) definir também as etapas desse processo em função de um modelo externo.
Conforme essa última interpretação, “acelerar o processo” não consiste em obter quanto an­tes o nível final, mas sim aqueles níveis definidos como '”superiores", em uma sequência evolutiva, pelo modelo externo.
Acreditamos que seja correto atribuir essa segunda interpretação ao pensamento de Luria (a primeira é mais próxima do comportamentalismo).
Luria observa que certas características do conteúdo das frases apresentadas para ser recor­dadas ajudam a passar dos rabiscos à assim chamada "pictografia": referências quantitativas e substantivos que podem ser desenhados facilmente.
Isso acelera o processo, se - e apenas se - considerarmos que a passagem de formas gráfi­cas não-icônicas para as formas gráficas icônicas é um passo necessário na aquisição da escrita. Naturalmente, Luria não nos dá nenhuma evidência psicológica de tal passo necessário.
De qualquer forma acaba nos deixando na mais absoluta escuridão no tocante à passagem do pictográfico para o alfabético. No texto de 1930, a passagem para esse último período é apre­sentada de maneira brusca, por intervenção de um novo agente cultural.
Uma marcante diferença entre Luria (1930) e Ferreiro (1979 e posteriores) situa-se neste ponto: para Luria o ingresso à instituição escolar criaria por si mesmo, uma ruptura com os conhe­cimentos prévios; para Ferreiro, o ingresso à instituição escolar interage com as concepções prévi­as das crianças, não determinando automaticamente uma passagem de nível conceitual. Ferreiro (1982, 1983) foi capaz de demonstrar isso; Luria nem sequer tentou indagar de que maneira as concepções prévias interagiam com o ensino escolar.
Outra diferença importante entre Luria (1929) e Ferreiro (1979 e seguintes) é esta: Luria falade duas etapas nas quais existe uma substituição de uma técnica por outra.
        Isso é particularmente importante, afirma Ferreiro, porque a ideia de substituição parece totalmente oposta à de construção.
         Ferreiro salienta que "em 1979, acreditávamos que a história da escrita na humanidade já "es­tava escrita", enquanto a história da escrita no desenvolvimento da criança estava "sendo escrita".
Atualmente, a situação mudou de maneira notável.
A produção acadêmica sobre problemas de história da escrita aumentou muito e também se diversificou com a contribuição de profissionais das mais variadas origens.
Por outro lado, o aumento das peças disponíveis a partir de escavações, bem como uma maior precisão nos instrumentos de datação das mesmas, obrigaram a revisar algumas das Inter­pretações mais difundidas.
Considero, diz Ferreiro, "que não é exagerado afirmar que estamos assistindo ao surgimento de um campo multidisciplinar que ainda não tem nome nem localização clara dentro das discipli­nas acadêmicas."
         O único aspecto que considerarei por ser relevante para esta discussão é o referente à ori­gem pictográfica da escrita.
         Recentemente, enfatizou-se uma distinção que, após a sua enunciação, aparece como fun­damental: não confundir a história das marcas gráficas com a história dos sistemas de marcas linguisticamente interpretados.
Os elementos com os quais um sistema notacional é construído podem ter a mais variada origem, pois o homem foi produtor de marcas antes de ser capaz de inventar sistemas de marcas. O aparecimento da escrita não suprime as marcas pictóricas, porque as mesmas serviram e continuam servindo para outras finalidades. O que dizer, então, sobre as histórias repetidas em todos os livros de divulgação que tratam da evolução da escrita e que nos apresentam, por exemplo, a evolução, do desenho da cabeça de boi, sua estilização e finalmente a letra grega alta, posteriormente convertida na nossa A?
A resposta é simples, garante Ferreiro: a história das grafias individuais é uma coisa, a dos sistemas de escrita é outra.

ZÉLIA CAVALCANTI
                Segundo Zélia Cavalcanti Lima (1990): "A brincadeira é meio privilegiado de inserção na realidade : expressa a forma como a criança reflete, ordena, desorganiza, destrói e reconstrói o mundo..." (p.70).
                Esta forma de interagir com o mundo possibilita à criança, transcender padrões impostos e uniformizações pré-estabelecidas que o impedem de buscar a realização de suas necessidades e a construção de sua emancipação, o que deverá ocorrer de forma criativa, e criticar a luz dos fatos, para sua melhoria, bem como de toda a coletividade.
                O que temos observado, porém, é que em nossas escolas, este comportamento é manipulado pedagogicamente, fazendo com que a criança seja sempre dirigida em suas ações e por conseguinte, reprima sua vontade, construindo um determinismo que afasta cada um de uma vida mais digna com suas ambições .
                Neste caso a autonomia é relativizada, ou seja, só existe se for controlada e estiver vinculada a um bem estar comum. Cada um faz o que é necessário para o bem estar do grupo, pormenorizando a própria vontade e satisfação.
                Os Cadernos da Escola da Vila são um conjunto de textos que documentam a história da metodologia de trabalho escolar utilizada na Escola da Vila. São relatórios de atividades em classes de pré-escola e do 1º grau, bem como textos de reflexão metodológica, de origens diversas, relacionados não só ao trabalho dos orientadores e professores, mas também às definições curriculares.
            Alfabetizando fala da aprendizagem da leitura e da escrita visando a uma escola onde todas as crianças encontrem um lugar no qual podem vincular a leitura à possibilidade de chegar ao significado do texto e ao prazer da leitura.
                Essa visão de trabalho é complementada por um conjunto de pequenos textos onde procura-se contribuir com os planejamentos de classe, sugerindo encaminhamentos com diferentes conteúdos relacionados ao processo de letramento.
Magistério 2012/fdrh






    CHAUI, Marilena
Convite à Filosofia
Por que Sócrates é considerado o “patrono da Filosofia”? Porque jamais se contentou com as opiniões estabelecidas, com os preconceitos de sua sociedade, com as crenças inquestionadas de seus conterrâneos. 
Mito da caverna, que serve para explicar a evolução do processo de conhecimento. Segundo ele, a maioria dos seres humanos se encontra como prisioneira de uma caverna, permanecendo de costas para a abertura luminosa e de frente para a parede escura do fundo. Temos, em nossa sociedade, verdades estabelecidas que, embora sejam variáveis, normalmente, não são questionadas. Acreditamos que as coisas e os acontecimentos se relacionam e que podemos manipular essas relações em benefício próprio.  
Acreditamos que as coisas e os acontecimentos se relacionam e que podemos manipular essas relações em benefício próprio. Existem relações de causa e efeito entre as coisas, onde houver uma coisa certamente houve uma causa para sua existência. Maria está mais jovem do que Glorinha, coisas, pessoas, situações, fatos podem ser comparadas e avaliadas, julgados por sua qualidade ou quantidade, podem ser conhecidas e usadas em nossa vida.
Os procedimentos rigorosos de pensamento contribuem diretamente para o verdadeiro conhecimento da ciência, a necessidade de entender filosofia vem desde a Grécia antiga e abrangia os mais diversos tipos de conhecimento o que hoje entendemos como pertencentes à matemática, astronomia, física, biologia a lógica, ética e tantas outras ciências, a filosofia não estudava cada uma dessas ciências separadamente seu objetivo era conhecer toda a realidade sem divisão. 
O homem ao longo da história vem tentando entender e procurando respostas para muito de seus questionamentos, cada ser carrega em si a necessidade de entender suas próprias verdades e as verdades do mundo deixando de ser uma pessoa isolada, e a filosofa tem seu papel fundamental nesse processo. Somos diretamente influenciados pela família, pela sociedade, que acabam ditando as regras influenciando diretamente nosso modo de agir e de pensar, mas Descartes deixa claro que cada indivíduo é livre para sustentar suas crenças e verdades utilizando-se de vários métodos para isso. 
Por muitos anos os primeiros filósofos gregos compartilharam de diversas crenças místicas enquanto desenvolviam um conhecimento racional que chegaria a filosofia, ou seja, a filosofia grega seguiu tentando desenvolver o logos o saber racional em contraste com o mito o saber alegórico, ou seja, o mito é como uma fantasia e o logos a razão. Muitos são os fatores que contribuíram para o desenvolvimento da filosofia na Grécia as viagens marítimas, a criação do calendário entre outros acontecimentos desmistificariam a ilusão das pessoas com relação ao mundo.
             A história da filosofia é marcada por dois períodos distintos a fase inaugural da filosofia grega é marcada como o período pré-socrático composto por Tales, além de Tales podem-se citar outros dois filósofos importantes Anaximandro e Anaxímenes. Entre os objetivos desses primeiros filósofos podemos citar a Cosmologia a tentativa racional de explicar o universo. Chegamos então ao aparecimento de Sócrates.
            Com as cidades virando grandes metrópoles surgem os chamados Sofistas que eram filósofos que defendiam a arte da oratória. Sócrates era contra os sofistas dizia que eles não eram filósofos porque não tinham amor pela sabedoria nem respeito pela verdade.
A proposta de Sócrates era que antes de tudo cada um conhecesse a si mesmo, ou seja, ele passou a fazer com que o povo pensasse sobre outras coisas, que questionassem e não aceitassem tudo que os poderosos queriam passivamente. Sócrates então passa a ser um perigo contra os poderosos foi acusado de vários crimes e condenado ao suicídio.
Esta situação nos remete aos dias de hoje, estamos vendo muitas coisas erradas acontecendo ao nosso redor muitas vezes discordamos da situação, mas continuamos de braços cruzados aceitando as barbaridades de certos políticos sem reagir. Temos memória curta e nas eleições seguintes elegemos novamente quem mentiu quem roubou nos tornado cúmplice dos erros dos poderosos. Então eu me pergunto onde está nossa capacidade de pensar, de saber o que é certo e o que está errado, será que precisamos de um novo Sócrates para nos mostrar novamente qual é o caminho?  Aristóteles discordava em alguns pontos de Platão. Não acreditava que existisse um mundo das ideias abrangedor de tudo existente; achava que a realidade está no que percebemos e sentimos com os sentidos, que todas as nossas ideias e pensamentos tinham entrado em nossa consciência através do que víamos e ouvíamos e que o homem possuía uma razão inata, mas não ideias inatas. Aristóteles afirma que, antes de um conhecimento constituir seu objeto e seu campo próprio, seus procedimentos próprios de aquisição e exposição, de demonstração e de prova, devem primeiro, conhecer as leis gerais que governam o pensamento, independentemente do conteúdo que possa vir a ter. O estudo das formas gerais do pensamento, sem preocupação com seu conteúdo, chama-se lógica, e Aristóteles foi o criador da lógica como instrumento do conhecimento em qualquer campo do saber. A lógica não é uma ciência, mas o instrumento para a ciência. Para Aristóteles, a lógica não era uma ciência teorética, nem prática ou produtiva, mas um instrumento para as ciências. 
A filosofia patrística resultou do esforço feito por Paulo e João e pelos primeiros padres da igreja para conciliar a nova religião o cristianismo, patrística liga-se a tarefa religiosa de evangelização. O desafio da filosofia patrística era conciliar razão e fé. Filosofia medieval abrange pensadores europeus, árabes e judeus. Nesta época a igreja romana dominava a Europa. A filosofia da renascença é marcada pela descoberta de obras de Platão desconhecidas na idade média e de novas obras de Aristóteles, que passam a ser lidas em grego e a receber novas traduções. A filosofia moderna, este período nasce o ceticismo, a dúvida da capacidade da razão humana para conhecer a realidade exterior ao homem. Filosofia contemporânea, é o período mais próximo de nós, parece ser o mais difícil de definir, pois as diferenças entre as várias filosofias ou posições filosóficas nos parecem muito grandes porque as estamos vendo surgir diante de nós. É uma leitura que exige conhecimentos prévios para ser entendida, além de diversas releituras.


                                            COLL, Cesar
O construtivismo na sala de aula
Os professores a e concepção construtivista (Isabel Solé e César Coll) -          O construtivismo não é uma teoria, e sim uma referência explicativa, composta por diversas contribuições teóricas, que auxilia os professores nas tomadas de decisões durante o planejamento, aplicação e a avaliação do ensino. Ou seja, o construtivismo não é uma receita, um manual que deve ser seguido à risca sem se levar em conta as necessidades de cada situação particular. Ao contrário, os profissionais da educação devem utilizá-lo como auxílio na reflexão sobre a prática pedagógica; sobre o como se aprende e se ensina, considerando-se o contexto em que os agentes educativos estão inseridos. Essas afirmações demonstram a necessidade de se compreender os conteúdos da aprendizagem como produtos sociais e culturais, o professor como agente mediador entre indivíduo e sociedade, e o aluno como aprendiz social.
            Tendo em vista uma educação de qualidade, entendida como aquela que atende a diversidade, o processo educativo não é responsabilidade do professor somente. Desse modo, o trabalho coletivo dos professores, normas e finalidades compartilhadas, uma direção que tome decisões de forma colegiada, materiais didáticos preparados em conjunto, a formação continuada e a participação dos pais são pontos essenciais para a construção da escola de qualidade.
            A instituição escolar é identificada pelo seu caráter social e socializador. É por meio da escola que os seres humanos entram em contato com uma cultura determinada. Nesse sentido, a concepção construtivista compreende  um espaço importante à construção do conhecimento individual e interação social, não contrapondo aprendizagem e desenvolvimento. Aprender não é copiar ou reproduzir, mas elaborar uma representação pessoal da realidade a partir de experimentações e conhecimentos prévios. É preciso aprender significativamente, ou seja, não apenas acumular conhecimentos, mas construir significados próprios a partir do relacionamento entre a experiência pessoal e a realidade. A pré-existência de conteúdos confere certa peculiaridade à construção do conhecimento, que deve ser entendida como a atribuição de significado pessoal aos conteúdos concretos, produzidos culturalmente.
            Pensando especificamente o trabalho do professor, o construtivismo é uma concepção útil à tomada de decisões compartilhadas, que pressupõe o trabalho em equipe na construção de projetos didáticos e rotinas de trabalho. Por fim, é importante ressaltar que o construtivismo não é um referencial acabado, fechado a novas contribuições; sua construção acontece no âmbito da situação de ensino/aprendizagem e a ela deve servir.
            2. Disponibilidade para a aprendizagem e sentido da aprendizagem (Isabel Solé)           A aprendizagem é motivada por um interesse, uma necessidade de saber. Mas o que determina esse interesse, essa necessidade? Não é possível elaborar uma única resposta a essa questão. No entanto, um bom caminho a seguir é compreender que além dos aspectos cognitivos, a aprendizagem envolve aspectos afetivo-relacionais. Ao construir os significados pessoais sobre a realidade, constrói-se também o conceito que se tem de você mesmo (autoconceito) e a estima que se professa (autoestima), características relacionadas ao equilíbrio pessoal. O autoconceito e a autoestima influenciam a forma como o aluno constrói sua relação com os outros e com o conhecimento; reconhecer essa dimensão afetivo-relacional é imprescindível ao processo educativo.
            Em relação à motivação para conhecer, é necessário  compreender a maneira como alunos encaram a tarefa de estudar, que pode ser dividida em dois enfoques: o enfoque profundo e o enfoque superficial. No enfoque profundo, o aluno se interessa por compreender o significado do que estuda e relaciona os conteúdos aos conhecimentos prévios e experiências. Já no enfoque superficial, a intenção do aluno limita-se a realizar atarefas de forma satisfatória, limitando-se ao que o professor considera como relevante, uma resposta desejável e não a real compreensão do conteúdo. Importante ressaltar que o enfoque com que o aluno aborda a tarefa pode variar; dessa forma, o enfoque profundo pode ser a abordagem de uma relação a uma tarefa e o enforque superficial em relação a outras pelo mesmo aluno. A inclinação dos alunos para um enfoque ou outro vai depender, dentre outros fatores, da situação de ensino da qual esse aluno participa. Entretanto, o enfoque profundo pode ser trabalhado com os alunos de maneira intencional. Para isso, é preciso conhecer as características da tarefa trabalhada, o que se pretende com determinado conteúdo e a sua necessidade. Tudo isso demanda tempo, esforço e envolvimento pessoal.
            Outro ponto importante a ser ressaltado é que o professor, ao entrar numa sala de aula, carrega consigo certa visão de mundo e imagem de si mesmo, que influenciam seu trabalho e sua relação com os alunos. Da mesma forma, os alunos constroem representações sobre seus professores. Reconhecer esses aspectos afetivos e relacionais é fundamental para motivação e interesse pela construção de conhecimento, tendo em vista que o autoconceito e a autoestima, ligados às representações e expectativas sobre o processo educativo,  possuem um papel mediador na aprendizagem escolar.
            As interações, no processo de construção de conhecimento, devem ser caracterizadas pelo respeito mútuo e o sentimento de confiança. É a partir dessas interações, das relações que se estabelecem no contexto escolar, que as pessoas se educam. Levar isto em consideração é compreender o papel essencial dos aspectos afetivo-relacionais no processo de construção pessoal do conhecimento sobre a realidade.
            3. Um ponto de partida para a aprendizagem de novos conteúdos: os conhecimentos prévios
            Quando se inicia um processo educativo, as mentes dos alunos não estão vazias de conteúdo como lousas em branco. Ao contrário, quando chegam à sala de aula os alunos já possuem conhecimentos prévios advindos da experiência pessoal. Na concepção construtivista é a partir desses conhecimentos que o aluno constrói e reconstrói novos significados.
            Identificam-se alguns aspectos globais como elementos básicos que auxiliam na determinação do estado inicial dos alunos: a disposição do aluno para realizar a tarefa proposta, que conta com elementos pessoais e interpessoais com sua autoimagem, autoestima, a representação e expectativas em relação à tarefa a ser realizada, seus professores e colegas; capacidades, instrumentos, estratégias e habilidades compreendidas em certos níveis de inteligência, raciocínio e memória que possibilitam a realização da tarefa.           
            Os conhecimentos prévios podem ser compreendidos como esquemas de conhecimento, ou seja, a representação que cada pessoa possui sobre a realidade. É importante ressaltar que esses esquemas de conhecimento são sempre visões parciais e particulares da realidade, determinadas pelo contexto e experiências de cada pessoa. Os esquemas de conhecimento contêm, ainda, diferentes tipos de conhecimentos, que podem ser, por exemplo, de ordem conceitual (saber que o coletivo de lobos é alcateia), normativa (saber que não se deve roubar), procedimental (saber como se planta uma árvore). Esses conhecimentos são diferentes, porém não devem ser considerados melhores ou piores que outros.
            Para o ensino coerente, é preciso considerar o estado inicial dos alunos, seus conhecimentos prévios e esquemas de conhecimentos construídos. Esse deve ser o início do processo educativo: conhecer o que se tem para que se possa,  sobre essa base, construir o novo.
            4. O que faz com que o aluno e a aluna aprendam os conteúdos escolares? A natureza ativa e construtiva do conhecimento (Teresa Mauri) - Entre as concepções de ensino e aprendizagem sustentadas pelos professores, destacam-se três, cada uma considerando que aprender é:
- Conhecer as respostas corretas: Nessa concepção entende-se que aprender significa responder satisfatoriamente as perguntas formuladas pelos professores. Reforçam-se positivamente as respostas corretas,  sancionando-as. Os alunos são considerados receptores passivos dos reforços dispensados pelos professores.
- Adquirir os conhecimentos relevantes: Nessa concepção, entende-se que o aluno aprende quando apreende informações necessárias.  A principal atividade do professor é possuir essas informações e oferecer múltiplas situações (explicações, leituras, vídeos, conferências, visitas a museus) nas quais os alunos possam processar essas informações. O conhecimento é produto da cópia e não processo de significação pessoal.
- Construir conhecimentos: Os conteúdos escolares são aprendidos a partir do processo de construção pessoal do mesmo. O centro do processo educativo é o aluno, considerado como ser ativo que aprende a aprender. Auxiliar a construção dessa competência é o papel do professor.
            A primeira concepção está ligada às concepções tradicionais, diferenciada em relação às duas restantes por enfatizar o papel supremo do professor na elaboração das perguntas. As outras duas concepções, pelo contrário, ocupam-se de como os alunos adquirem conhecimentos; no entanto, entendem de formas diferentes esse processo.
            Compreendendo-se que aprender é construir conhecimentos, identifica-se a natureza ativa dessa construção e a necessidade de conteúdos ligados ao ato de aprender conceitos, procedimentos e atitudes. Nesse sentido, é preciso organizar e planejar intencionalmente as atividades didáticas tendo em vista os conteúdos das diferentes dimensões do saber: procedimental (como a observação de plantas); conceitual (tipos e parte das plantas); e atitudinal (de curiosidade, rigor, formalidade, entre outras). O trabalho com esses conteúdos demonstra a atividade complexa que caracteriza o processo educativo, trabalho que demanda o envolvimento coletivo na escola.
            5. Ensinar: criar zonas de desenvolvimento proximal e nelas intervir (Javier Onrubia)
            O ensino na concepção construtivista deve ser entendido como uma ajuda ao processo de ensino-aprendizagem, sem a qual o aluno não poderá compreender a realidade e atuar nela. Porém, deve ser apenas ajuda porque não pode substituir a atividade construtiva do conhecimento pelo aluno.
            A análise aprofundada do ensino enquanto ajuda leva ao conceito de “ajuda ajustada” e de zona de desenvolvimento proximal (ZDP). No conceito de “ajuda ajustada” observa-se que o ensino, enquanto ajuda o processo de construção do conhecimento, deve ajustar-se a esse processo de construção. Para tanto, conjuga duas grandes características: 1) a de levar em conta os esquemas de conhecimento dos alunos, seus conhecimentos prévios em relação aos conteúdos a serem trabalhados; 2) e, ao mesmo tempo, propor desafios que levem os alunos a questionarem esses conhecimentos prévios. Ou seja, não se ignora aquilo que os alunos já sabem, porém aponta-se para aquilo que eles não conhecem, não realizam ou não dominam suficientemente, incrementando a capacidade de compreensão e atuação autônoma dos alunos.
            O conceito de zona de desenvolvimento proximal (ZDP) foi proposto pelo psicólogo soviético L. S. Vygotsky, partindo do entendimento de que as interações e relações com outras pessoas  são a origem dos processos de aprendizagem e desenvolvimento humano. Nesse sentido, a ZDP pode ser identificada como o espaço no qual, com a ajuda dos outros, uma pessoa realiza tarefas que não seria capaz de realizar individualmente. A contribuição do conceito de ZDP está relacionada à possibilidade de se especificar as formas em aula, ajudando os alunos no processo de significação pessoal e social da realidade.  
            Para o trabalho com os conceitos acima arrolados, indicam-se os seguintes pontos:
1) Inserir atividades significativas na aula;
2) Possibilitar a participação de todos os alunos nas diferentes atividades, mesmo que os níveis de competência, conhecimento e interesses forem diferenciados;
3) Trabalhar com as relações afetivas e emocionais;
4) Introduzir modificações  e ajustes ao logo da realização das atividades;
5) Promover a utilização e o aprofundamento autônomo dos conhecimentos que os alunos estão aprendendo;
6) Estabelecer relações entre os novos conteúdos e os conhecimentos prévios dos alunos;
7) Utilizar linguagem clara e objetiva evitando mal-entendidos ou incompreensões;
8) Recontextualizar e reconceitualizar a experiência.
            Trabalhar a partir dessas concepções caracteriza desafios à prática educativa que não está isenta de problemas e limitações. No entanto, entende-se que esse esforço, mesmo que acompanhado de lentos avanços, é decisivo para a aprendizagem e o  desenvolvimento das escolas e das aulas.
            6. Os enfoques didáticos (Antonio Zabala) A concepção construtivista considera a complexidade e as distintas variáveis que intervêm nos processos de ensino na escola. Por isso, não receita formas determinadas de ensino, mas oferece elementos para a análise e reflexão sobre a prática educativa, possibilitando a compreensão de seus processos, seu planejamento e avaliação.
Um método educacional sustenta-se a partir da função social que atribui ao ensino e em determinadas idéias sobre como as aprendizagens se produzem. Nesse sentido, a análise das tarefas que propõem e conteúdos trabalhados, explícita ou implicitamente (currículo oculto), requer a compreensão do determinante ideológico que embasam as práticas dos professores. A discriminação tipológica dos conteúdos, ou seja, a análise dos conteúdos trabalhados segundo a natureza conceitual, procedimental ou atitudinal, mostra-se como importante instrumento de entendimento do que acontece na sala de aula.
            Outro instrumento importante para a compreensão do processo educativo é a concepção construtivista da aprendizagem, que estabelece a aprendizagem como uma construção pessoal que o aluno realiza com a ajuda de outras pessoas; processo que necessita da contribuição da pessoa que aprende, implicando o interesse, disponibilidade, conhecimentos prévios e experiência; implica também a figura do outro que auxilia na resolução do conflito entre os novos saberes e o que já se sabia, tendo em vista a realização autônoma da atividade de aprender a aprender.
            O problema metodológico para o fazer educativo não se encontra no âmbito do “como fazemos”, mas antes na compreensão do “que fazemos” e “por quê”. Na elaboração das sequências didáticas que devem auxiliar a prática educativa deve-se levar em consideração os objetivos e os meios que se tem para facilitar o alcance desses objetivos.
            7. A avaliação da aprendizagem no currículo escola: uma perspectiva construtivista A questão da avaliação do processo educativo tem sido muito discutida. Com o desenvolvimento de propostas teóricas, metodológicas e instrumentais, expressões e conceitos como o de avaliação inicial, formativa e somatória povoam o vocabulário educacional. Junto a isso, construiu-se o consenso de que não se deve avaliar somente o aluno, mas também a atuação do professor, o planejamento de atividades e também sua aplicação. No entanto, muitas questões ainda se encontram sem respostas e se configuram como desafios aos envolvidos com o tema.
            Uma primeira questão a ser levantada é a relação entre a avaliação e uma série de decisões relacionadas a ela, como promoção, atribuição de crédito e formatura de alunos. Essas decisões não fazem parte, em sentido estrito, do processo de avaliação, porém essas decisões devem ser coerentes com as avaliações realizadas. O desafio é alcançar a máxima coerência entre os processos avaliativos e as decisões a serem tomadas.
            Todo processo avaliativo deve levar em conta os elementos afetivos e relacionais da avaliação. Desse modo, o planejamento das atividades avaliativas parte do entendimento de que o aluno atribui certo sentido a essa atividade, sentido que depende da forma como a avaliação lhe é apresentada e também de suas experiências e significações pessoais e sociais da realidade. É preciso levar em conta também o caráter sempre parcial dos resultados obtidos por meio das avaliações, devido à complexidade e diversificação das situações de aprendizagem vivenciadas pelos alunos. Assim, as práticas avaliativas privilegiadas devem ser aquelas que consideram a dinâmica dos processos de construção de conhecimentos.
            Ao contrário das concepções que buscam neutralizar as influências do contexto nos resultados das avaliações, a concepção construtivista ressalta a necessidade de considerar as variáveis proporcionadas pelos diversos contextos particulares. Para isso, recomenda-se a utilização de uma gama maior possível de atividades de avaliação ao longo do processo educativo.
            Partindo da consideração que é na prática que se utiliza o que se aprende, um dos critérios, que devem ser levantados nas atividades avaliativas, é o menor ou maior valor instrumental das aprendizagens realizadas, ou seja, em que grau pode-se utilizar o que se aprendeu, o que se construiu na significação dos saberes. Na medida em que aprender a aprender significa a capacidade para adquirir, de forma autônoma, novos conhecimentos, avaliar os aspectos instrumentais, é de suma importância a qualidade da educação.
Por fim, ressalta-se a necessidade da abordagem da avaliação em estreita ligação com o planejamento didático e o currículo escolar. Dessa forma, “o quê”, “como” e “quando” ensinar e avaliar se unem configurando uma prática educativa global, na qual as atividades avaliativas não estão separadas das demais atividades de construção de conhecimento pelos alunos.
Magistério 2012/fdrh







PREMIER – Pref. Guaíba / 2011

36 - Para Coll (1996), a avaliação diagnóstica é utilizada com finalidade ______________, enquanto que a avaliação formativa exerce a função ______________ de um processo de ensino e aprendizagem.
Assinale a alternattiva que melhor completa as lacunas acima.
a) classificatória – reguladora
b) prognóstica – reguladora
c) classificatória – somativa
d) prognóstica – classificatória.


COLL, C, MARCHESI, A; PALACIOS J.
Desenvolvimento psicológico e educação
PARTE 1- Da Linguagem da deficiência às escolas inclusivas
A educação especial viveu profundas transformações durante o século XX. Impulsionada pelos movimentos sociais que reivindicam mais igualdade entre todos os cidadãos e a superação de qualquer tipo de discriminação, incorporou-se, aos poucos, ao sistema educacional regular e buscou fórmulas que facilitassem a integração dos alunos com alguma deficiência.
Ao mesmo tempo, produziu-se uma profunda reflexão no campo educativo fazendo com que os problemas desses alunos fossem encarados a partir de um enfoque mais interativo, no qual a própria escola devia assumir sua responsabilidade diante dos problemas de aprendizagem que eles manifestavam. O conceito de necessidades educativas especiais (oposto de deficiências) e a ênfase na importância de que a escola se adapte à diversidade de seus alunos foi expressão dessa nova realidade.
As mudanças nas escolas, imprescindíveis para assegurar uma interação educativa positiva, não podiam proceder exclusivamente da reforma da educação especial. A constatação levou a um novo impulso da educação especial em torno das “escolas inclusivas”. O conceito de escolas inclusivas supõe uma maneira mais radical de entender a resposta educativa à diversidade dos alunos e baseia-se na defesa de seus direitos à integração e na necessidade de promover uma profunda reforma das escolas, que torne possível uma educação de
qualidade para todos, sem nenhum tipo de exclusão.
Até meados do século XX as deficiências ou transtornos eram vistos como problema inerente à pessoa, com pouca possibilidade de intervenção educativa e de mudança.Os testes de inteligência eram genéricos. Uma das primeiras escalas de inteligência (de Alfred
Binet, 1904) serviu para separar as crianças que podiam frequentar a escola regular das que
não podiam.
Surgiram, assim, as escolas especiais.
Nos anos de 1950, iniciam-se estudos psicológicos que levam em conta as influências sociais e culturais que podem determinar um funcionamento intelectual deficitário.
Surge a concepção de que a deficiência pode ser motivada por falta de estímulos adequados ou por processos de aprendizagem incorretos, reforçando a possibilidade de intervenção. Paralelamente, as escolas de educação especial continuam se expandindo, em virtude da universalização da oferta educacional nos países desenvolvidos.
Mudanças nos anos 1960 e 1970:
- Nova concepção dos transtornos do desenvolvimento e da deficiência;
- Perspectiva distinta dos processos de aprendizagem e das diferenças individuais;
- Revisão da avaliação psicométrica;
- Aumento do número de professores competentes e atualizados;
- Extensão da educação obrigatória;
- Preocupação com o abandono escolar;
- Avaliação das escolas especiais;
- Experiências positivas de integração.
O conceito de “necessidades educativas especiais” começou a ser empregado nos anos 60.
       Características dessa nova visão:
- Afeta um conjunto de alunos (com características diferentes como: problemas de linguagem, conflitos emocionais, dificuldade na leitura e escrita, atrasos na aprendizagem ou absenteísmo;
- É um conceito relativo (a avaliação nunca deve excluir o contexto das relações);
- Refere-se aos problemas de aprendizagem dos alunos na sala de aula (a escola deve adaptar-se às necessidades do aluno e não ao contrário);
- Supõe a provisão de recursos suplementares.
Detecção e avaliação dos alunos com necessidades educativas especiais (NEE):
- processo sistêmico, interativo e contextualizado (conhecer como foram geradas as dificuldades, o ambiente familiar, descobrir resposta educativa mais adequada);
- considerar potencialidades de desenvolvimento e aprendizagem do aluno;
- escolha de recursos que facilitem o processo;
- impõe à escola reformulação de seus objetivos.
       Posições críticas:
- Dificuldade da escola em identificar quem são os alunos com NEE;
- Amplitude: número de NEE passou de 2% para 20% nos últimos anos;
- Interação aluno NEE / escola / família;
- Sociologia: reprodução na escola da estrutura das classes sociais segrega os alunos NEEs (não possuem “capital cultural”);
- Terminologia mostra visão otimista da educação especial, centrando o problema nas escolas.
Existe o risco de se enfatizarem os problemas relativos a cada uma das deficiências e de se
esquecer de seu caráter interativo e contextual.
Não se deve esquecer que existem características próprias vinculadas a cada tipo específico de limitação ou à origem dos problemas de aprendizagem cuja compreensão pode ajudar a proporcionar a alternativa educativa mais conveniente o os recursos adequados.
Integração educativa:
- necessidade de integração surge dos direitos dos alunos e é a concretização na prática social do princípio da igualdade, sem exclusão;
- é o processo que permite aos alunos serem educados nas escolas regulares;
- depende mais de posturas integradoras do que de uma reforma no ensino;
- não é simplesmente transferência da educação especial às escolas regulares;
Debate sobre a Integração:
- defesa: direito de todos os alunos a não segregação; contribui para o desenvolvimento e a socialização; é positiva para todos os alunos, já que aprendem de maneira individualizada; desenvolve atitudes de respeito e solidariedade.
- críticas: a escola regular não oferece educação tão completa como a escola especial; a escola regular não dispõe de recursos e professores especializados; alguns pais confiam mais na escola especial.
Conclusão: a integração é, antes de tudo, um processo dinâmico e mutável, cujo objetivo
central é encontrar a melhor situação educativa para que um aluno desenvolva ao máximo suas potencialidades e, por isso, pode variar conforme as necessidades dos alunos e o tipo de resposta que as escolas podem proporcionar. Por essa razão, a forma de concretizar a integração pode variar à medida que as necessidades educativas dos alunos vão se modificando.
Formas de Integração:
- Física: classes especiais em escola regular, com compartilhamento de alguns locais como pátio;
- Social: alunos de classes especiais realizam parte das atividades em conjunto com outros alunos da escola regular;
- Funcional: integração completa entre todos os alunos;
- Comunitária: se produz na sociedade quando o aluno deixa a escola.
ESCOLAS INCLUSIVAS
- Necessidade de educar todos os alunos na mesma escola e empreender reforma do conjunto do sistema educacional.
- Resposta a uma disposição da declaração universal dos direitos humanos: “os poderes públicos têm a obrigação de garantir um ensino não segregador, que se prolongue posteriormente na integração à sociedade, a todos os alunos, sejam quais forem suas condições físicas, sociais ou culturais.”
Declaração de Salamanca (1994 – Unesco)
- toda criança tem direito fundamental à educação e deve-se dar a ela oportunidade de alcançar e manter um nível aceitável de conhecimentos;
- cada criança tem características, interesses e necessidades de aprendizagem que lhes são próprios;
- os sistemas educacionais e programas devem ser aplicados levando-se em conta essas características e necessidades;
- as pessoas com NEE devem ter acesso às escolas regulares, que deverão integrá-las em uma pedagogia centrada na criança.
“Antes a educação especial era definida em função das crianças com uma série de problemas físicos, sensoriais, intelectuais ou emocionais. Nestes últimos 15 ou 20 anos, ficou claro que o conceito de necessidades educativas especiais tinha de ser ampliado a fim de incluir todas as crianças que, qualquer que fosse o motivo, não se beneficiam do ensino escolar.” (Declaração de Salamanca).
PARTE 2: A PRÁTICA DAS ESCOLAS INCLUSIVAS
Declarações de uma professora que trabalha em uma escola de integração:
 “Sempre vi com bons olhos a integração das crianças com alguma deficiência. Quando a escola teve de decidir, votei a favor. Achava justo que tais crianças estivessem na mesma escola junto com seus irmãos e vizinhos. No entanto, agora estou me dando conta de que ensinar a esses alunos é bastante complicado. Dou aula de matemática no ciclo superior da EGB.
Não sei o que fazer para que todos os alunos acompanhem a matéria. Tenho dois programas, um para a maioria dos alunos e outro para os de integração, mas a preparação e a organização da aula supõem um grande esforço da minha parte. Já poderia haver livros e materiais adaptados a tais situações. Quando entra a professora de apoio e trabalha na sala de aula com esses alunos ou os leva para outra classe, fico muito mais tranquila. Inclusive acho que dessa forma vão aprender mais. De qualquer forma, acho que não seria bom que fossem para uma escola especial.”
A avaliação da Integração:
O debate sobre as vantagens e os inconvenientes da integração educativa impulsionou muitas pesquisas e estudos, porém os resultados não chegaram a conclusões efetivas. Os itens seguintes apresentam um panorama sobre os critérios de êxito da avaliação, os diferentes tipos de estudos, os principais resultados obtidos e as perspectivas futuras.
Critérios de êxito:
Para avaliar satisfatoriamente um programa de integração, é preciso definir antes que objetivos se pretendem ao incorporar alunos com NEE na escola regular. Não basta conhecer leis e  políticas inclusivas.
Para Hodgson, Clunies-Ross e Hegarty (1984), existem dois tipos de critérios para determinar o maior ou menor grau de êxito de um programa de integração: os que se referem às mudanças provocadas pelo programa no desenvolvimento das crianças com NEE e os que se referem às mudanças produzidas na própria escola.
Para a maioria dos estudos, um critério de avaliação da integração foi o desenvolvimento dos alunos nos aspectos: cognitivo(rendimento escolar), integração social, autoestima etc, comparando os resultados com os obtidos pelos colegas de classe sem NEE.
Outros estudos, porém, avaliaram o impacto da integração nas escolas, com critérios como organização, funcionamento, formação de professores, o ensino na sala de aula, o desenvolvimento do currículo. Também se formulou como critério de êxito a integração dos alunos NEE na sociedade: como vivem, que independência têm, suas relações e atitudes, relacionando os resultados aos de escolas especiais.
Os estudos comparativos:
A maior parte dos estudos clássicos teve como finalidade julgar o efeito da integração nos alunos com NEE e comprovar os benefícios em determinadas dimensões: aprendizagem, desenvolvimento social, autoestima, personalidade etc.
O problema desse enfoque para determinar os resultados obtidos é a limitação. Os alunos são estudados no contexto escolar, sem levar em conta, por exemplo, o ambiente familiar. É impossível comparar crianças da escola integrada com as da escola especial.
Estudos sobre as condições de integração:
Essas novas pesquisas admitem a integração como fato consumado, um direito das pessoas com NEE, e buscam analisar quais são as condições mais adequadas para que a experiência integradora contribua para uma educação de maior qualidade.
As dimensões dessas pesquisas são: projeto educacional e curricular da escola, funcionamento e organização do ensino em sala de aula, atitudes dos pais, professores e alunos em relação à integração. Normalmente são pesquisas com escalas de atitudes e questionários.
A pesquisa qualitativa:
Como as pesquisas quantitativas são insuficientes em fenômenos complexos que se produzem nas realidades sociais, surgiu o método qualitativo de Hegarty e Evans, 1985. Seu objetivo é conhecer a realidade social das escolas de integração, sua cultura, o ambiente em que os alunos aprendem e as relações sociais que estabelecem com seus colegas.
Sem a pretensão de criar modelos de escola, a pesquisa propôs detectar práticas positivas e os benefícios da integração para todos os alunos.
Resultados: efeitos da integração nos alunos
Mesmo sendo impossível comparar alunos com NEE de escolas especiais com os de escola de integração, alguns fatores foram conclusivos.
- Alunos com NEE que estudam com alunos mais competentes tendem a progredir mais rapidamente;
- Escolas de integração avaliam mais seus projetos acadêmicos; - Grupos cooperativos heterogêneos têm mais possibilidades de melhorar a competência social e a autoestima dos alunos;
- A avaliação da aprendizagem nas escolas de integração não compara os alunos; analisa os avanços pessoais.
       Fatores que favorecem a integração:
1- Projeto compartilhado
2- Currículo adaptado
3- Organização flexível
4- Atitudes positivas da comunidade escolar
1- Projeto compartilhado
Um projeto elaborado em conjunto pela equipe de professores, no qual a educação dos alunos com NEE é um dos principais objetivos, revela-se um poderoso instrumento de mudança.
A qualidade de um projeto assim depende de duas variáveis: existência de uma equipe docente coordenada e atitudes positivas dos docentes.
2- Currículo adaptado
O objetivo da integração não é que os alunos estejam com seus colegas, mas que participem de um currículo comum. Isso requer a adaptação de conteúdos, dos métodos pedagógicos e da atenção aos alunos. Hagarty identificou um conjunto de práticas que favorecem a aprendizagem: instrução baseada na necessidade do aluno, materiais e procedimentos que permitam ao aluno avançar no seu próprio ritmo; aumento da responsabilidade dos estudantes por sua própria aprendizagem e cooperação entre os alunos.
3- Organização flexível
Para serem integradoras, as escolas têm de mudar sua cultura, sua organização física e a
forma de trabalho entre os docentes. O isolamento dos professores em sala de aula é uma barreira que dificulta a integração. Todo o trabalho docente deve ser compartilhado.
4- Atitudes positivas da comunidade escolar
Uma porcentagem significativa dos estudos destacou a importância das atitudes dos professores, pais e alunos na integração.
Programas de formação dão mais confiança aos professores. Atitudes positivas dependem da competência e da segurança profissional.
Além da formação docente, a escola integradora precisa de apoio financeiro (para adaptações) e de profissionais especializados (para orientação).
OS DILEMAS DA INCLUSÃO
Norwich (1993) fala em “dilemas” ao referir-se às escolhas que devem ser feitas para atender alunos com NEE, pois toda escolha tem consequências negativas e positivas. Ele apresenta quatro dilemas:
- Currículo comum: um aluno NEE deve aprender conteúdos iguais ou diferentes aos de seus colegas?
- Identificação: conhecer os problemas dos NEE ajuda ou marca esses alunos negativamente?
- Pai/Professor: no momento das decisões, quem tem maior influência?
- Integração: os NEE aprendem mais na classe comum ou na especial?
 Desses dilemas, segundo Norwich, o mais simples de resolver tem sido o “Pai/Professor”. A relação pai-professor tem mostrado convergência de opiniões na maioria dos casos estudados.
       Currículo comum X currículo diferente A interação educativa baseia-se na manutenção de um currículo comum para todos os alunos. Aqueles com graves problemas de aprendizagem incorporam-se à escola para ter acesso a experiências de aprendizagem similares aos seus colegas. A atenção às diferenças individuais faz parte das estratégias educativas. O problema surge quando a adaptação para o NEE supõe a modificação significativa do currículo comum.
Um currículo centrado unicamente em conteúdos conceituais, que pressupõe avaliações normativas e iguais, lança ao fracasso os alunos com mais dificuldades.O estudo de Nortiwich incluiu várias perguntas aos professores sobre como resolver esse dilema. A resposta mais comum foi a seguinte:
- Proporcionar tantas experiências iguais de aprendizagem quanto possível, ao mesmo tempo em que se levam em conta as necessidades individuais. Manter o equilíbrio. Isto é difícil e requer compromisso e recursos.
Integração/identificação
Não é fácil resolver esses dois dilemas, nem para os que têm responsabilidade pela política educacional quanto para o professor que enfrenta a situação na sala de aula. Enfatizar as vantagens que a integração proporciona à socialização dos alunos com NEE pode fazer com que se esqueça que também é necessário o avanço desses alunos em outras dimensões do conhecimento.
É necessário um equilíbrio entre as demandas que parecem contraditórias. Como se alcança o equilíbrio?
- A natureza das oportunidades educacionais que são proporcionadas caracteriza-se por sua
limitação e seu baixo nível de exigência. A situação obriga a refletir sobre as formas de avaliação desses alunos, quais são suas dificuldades e que tipo de resposta educacional é mais adequada.
Assim, a ênfase principal deve estar na proposta curricular. A escola deve organizar sua atividade de tal maneira que se evitem as estratégias menos inclusivas e que se potencialize o compromisso dos professores da turma com seus alunos NEE.
Em síntese, o trabalho do professor é essencial. O professor é considerado o principal recurso para a instrução dos alunos NEE. Isso pressupõe um esforço para melhorar a formação e a competência profissional.
CONDIÇÕES DA INCLUSÃO
O avanço das escolas inclusivas não é fruto apenas do esforço individual dos professores ou das atitudes positivas do conjunto da comunidade educacional de uma escola. É, mais do que isso, expressão da confluência de um amplo conjunto de condições que tornam possível uma resposta satisfatória nas escolas regulares.
Contexto político e social:
No âmbito educacional, Marchesi e Martín (1998) diferenciaram três ideologias principais: liberal, pluralista e igualitária.
- Liberal: acentua a concorrência entre as escolas e os resultados acadêmicos dos alunos. Assim, essas escolas têm mais dificuldades para elaborar projetos inclusivos.
- Pluralista / Igualitária: essas escolas não dão importância apenas ao rendimento escolar, mas também à socialização dos alunos e à formação de atitudes solidárias, procurandooferecer uma boa educação a todos os alunos. São as mais adequadas para promover a inclusão.
Contexto da escola:
Cada escola tem uma ampla margem de atuação para avançar no sentido de uma maior inclusão. AS experiências destacam alguns fatores que têm maior incidência na mudança das escolas: modificação da cultura e da organização da escola; compromisso com a mudança; transformação dos currículos; desenvolvimento profissional dos professores; e uma liderança efetiva.
O trabalho do professor em sala de aula deve partir da compreensão de como os alunos aprendem e de qual é a melhor forma de lhes ensinar. A concepção construtivista tem se mostrado mais eficiente nesse processo.
Com relação aos alunos, é preciso observar: seus conhecimentos prévios, sua atividade mental construtiva e sua motivação para aprender.
Quanto aos conteúdos, não se pode ignorar o objetivo: cada aluno deve avançar, pouco a pouco, até ter controle de estratégias que o ajude a aprender por si mesmo.  
PARTE 3- PROBLEMAS DE APRENDIZAGEM - ATRASOS MATURATIVOS E DIFICULDADES DE APRENDIZAGEM DIFICULDADES DE APRENDIZAGEM (DAs):
- GRAVES: provenientes de lesão ou dano cerebral, comprometimento motor, linguístico, cognitivo. São irreversíveis.
- INESPECÍFICAS: não afetam o desenvolvimento de modo a impedirem a aprendizagem; não há razão que as justifique. Suas causas podem ser instrucionais e/ou ambientais. Geralmente são de mais fácil solução.
- ESPECÍFICAS: aspectos afetados: desenvolvimento fonológico, memória, atenção. A aprendizagem necessita de intervenção psicopedagógica oportuna e eficaz. Podem ser evolutivas.
CAUSAS DAS DAs:
- INTRÍNSECAS: herança, disfunção cerebral mínima ou atrasos maturativos;
- AMBIENTAIS: ambientes familiares e/ou educativos pobres, projetos inadequados;
- Combinação das duas anteriores.
TEORIAS NEUROLÓGICAS
- Herança
- Dano cerebral
- Disfunção cerebral mínima
TEORIAS SOBRE DÉFICITS DE PROCESSOS PSICO(NEURO)LÓGICOS SUBJACENTES
- Perceptivos
- Linguísticos
TEORIAS SOBRE ATRASOS MATURATIVOS
       Neurológicos:
- Do hemisfério direito
- Do hemisfério esquerdo
       Psicológicos:
- Da atenção
- No processamento ativo e espontâneo da informação
TEORIAS INTEGRADORAS
- Baseadas em processos psicológicos subjacentes
- Baseadas no processamento da informação
TEORIAS CENTRADAS NO AMBIENTE SOCIAL E EDUCATIVO
- No ambiente sociológico
- No ambiente educativo (familiar e/ou escolar)
CONCEITO DE ATRASOS MATURATIVOS
A distinção entre os conceitos de dois tipos de atrasos maturativos (1- atraso no desenvolvimento; 2- atraso mental recuperável) é possível por meio do QI (quoeficiente de inteligência). Enquanto que 1 refere-se a casos de QI 90 a 95; 2 refere-se a QI 60 a 65. As consequências desta classificação são injustas, pois o contexto psicológico não é considerado.
MATURAÇÃO: Num primeiro momento, acreditava-se que o desenvolvimento pessoal seria regulado por fatores internos (genéticos); mais tarde, foi entendido como um caráter pré-determinista, admitindo a influência do ambiente de forma limitada. Finalmente o conceito de maturação passou a ter um significado muito aberto, às vezes ambíguo e confuso, no qual a maturação era equiparada à aquisição de “disposições” ou “disponibilidades” que dariam lugar ao desenvolvimento de certas capacidades, devido a mudanças fisiológicas, mas com intervenção substancial de fatores externos.
Ponto comum: aprendizagem, idade cronológica e desenvolvimento.
MATURAÇÃO E APRENDIZAGEM:
- Nem todo desenvolvimento é de origem maturativa;
- A maturação tem a ver com disposição;
- É o momento em que tanto aluno como escola estão em condições de realizar o processo de ensino-aprendizagem com facilidade e eficácia.
IMPORTÂNCIA DA IDADE:
A maturação acontece quando a idade cronológica, biológica e psicossocial coincidem.
A idade é o principal indicador para determinar as DAs.
ORDEM E SEQUENCIAMENTO NO DESENVOLVIMENTO:
Para os defensores das DAs como consequência dos atrasos maturativos, as necessidades são as mesmas tanto para os NEEs quanto para os DAs e para pessoas consideradas normais. O que muda é o ritmo de evolução. Assim, um aluno com DA teria um desenvolvimento neurológico e psicológico mais lento. Quando obtêm atenção especializada evoluem ainda que mais lentamente até um nível de competência aceitável.
Quando não, tendem a ficar estáticos em uma etapa do desenvolvimento por muito tempo.
Estima-se que os DAs tenham uma diferença de 2 a 4 anos em relação aos colegas sem DA. A partir da adolescência essa diferença não é mais perceptível.
ATRASOS ENTENDIDOS COMO DÉFICITS:
Quando se acredita que DA é problema apenas do aluno que “não está maduro”, a tendência é “esperar amadurecer”, como um processo natural e espontâneo.
Os Alunos com DA, no entanto, “amadurecerão” em condições adequadas de desenvolvimento e de acordo com o seu tipo de DA.
Uma das intervenções psicopedagógicas necessária é avaliar as condições de desenvolvimento e o tipo de DA do aluno
ATRASOS PSICOLÓGICOS
DIFICULDADE DE APRENDIZAGEM (DA)
-Na atenção (Badwin, 1976)
-Na coordenação motora
-No desenvolvimento da atenção (Ross, 1976)
-Afeta todas as aprendizagens dos primeiros anos de escolaridade.
-Dificuldades na adaptação (em particular à escola)
-No desenvolvimento perceptivo-visual (Mialaret,
1972; Edfeldt, 1980; Kaphart, 1960)
-Na aquisição do esquema corporal e lateralização.
-No desenvolvimento da coordenação dinâmica
geral e visuomotora.
-No desenvolvimento de processos
psicolinguísticos básicos. (Inizan, 1979; Mialaret,
1972)
-No desenvolvimento fonológico
-Dificuldades na aprendizagem da leitura
e da escrita.
-Afeta as aprendizagens da pré-escola e
das séries iniciais.
-Dificuldades na aprendizagem da leitura
e da escrita.
-Atrasos na articulação.

-Na produção ativa e espontânea de estratégias de
aprendizagem e de solução de problemas (Hagen,
1972)
-No desenvolvimento da memória de trabalho e da
metamemória (Browns, 1980; Hulme e Mackenzie, 1994)
-Afeta todas as aprendizagens
(particularmente as escolares)

-Dificuldades na aprendizagem da
leitura, da escrita e da matemática.


IMPLICAÇÕES PARA A INTERVENÇÃO PSICOPEDAGÓGICA:
Segundo pesquisas, entre 2% e 4% da população escolar tem DA, sendo 80% destes do sexo masculino. Assim, é aconselhável tomar medidas estruturais de prevenção e diagnósticos
precoces para intervenção psicopedagógica específica.
Essas intervenções consistem em detectar no desenvolvimento das pessoas e no ambiente elementos que permitem antever possibilidades de ação.


CORRÊA, ROSA MARIA.
Dificuldades no aprender - um outro modo de olhar
O livro propõe uma abordagem diferente: a análise do não aprender e as diferentes naturezas dos obstáculos que o sujeito encontra no processo de construção do conhecimento
Rosa Maria Corrêa, psicóloga formada pela PUC Minas, especialista em Psicologia Educacional e mestre em Educação pela UFMG, lança o livro Dificuldades no aprender - um outro modo de olhar.
A partir da sua experiência como professora no curso de Psicologia da PUC Minas, a coordenação e supervisão de projetos de atendimento psicopedagógico à população, à instituições educacionais e de saúde, além de coordenar projetos de Sociedade Inclusiva na PUC Minas, faz uma análise diferente do processo ensino-aprendizagem.
“O professor ensina, se esforça, mas um grande número de alunos não aprende conforme o que é esperado por ele”. A partir desta ideia, os alunos passam a ser rotulados, e é comum que a escola mantenha políticas e práticas de ensino ineficazes, válidas por si só, ou mude de ismos em tentativas inúteis. 
Neste livro, o que se propõe é uma abordagem diferente: analisamos o não-aprender e as diferentes naturezas dos obstáculos que o sujeito encontra no processo de construção do conhecimento, tomando-os como parte inerente do processo. 
Teorias construtivistas e a Psicanálise, como o leitor poderá constatar, podem ser um suporte para o ponto de vista mais compatível com as ideias de uma escola mais inclusiva e mais comprometida com a formação e o desenvolvimento saudáveis dos alunos.
 “É hora de o professor buscar o reconhecimento e a qualificação dos progressos do aluno, examinar os obstáculos e dificuldades na aquisição do conhecimento escolar e redimensionar o seu papel, na busca de sucesso em suas propostas educacionais." - fala Rosa, na contracapa do livro.


COSTA, MARISA VARRABER (org.)
A Escola Básica na Virada do Século: cultura, política e currículo
Texto '' Discutindo a escola básica em tempos de neoliberalismo''. -
            O livro proporciona um panorama de reflexões e recoloca em debate a escola básica, e nos faz pensar as relações entre educação e poder. Michel Aplle , chama a atenção para a importância teórica e politica de nós professores , nos voltarmos para as abordagens pós-modernas que concebem a escola como conectada as relações de dominação e exploração , é preciso perceber a complexidade da relação entre poder e conhecimento.
Texto: A Mcdonaldização da escola -
O modelo Mcdonalds tem demonstrado, graças à universalização do Big Mac e das batatas fritas, uma comprovada capacidade para sair-se bem no mercado de alimentação "rápida". A escola pelo contrário, no que se refere as suas funções educacionais, não tem sido tão bem sucedida, de acordo com a ótica empresarial defendida pelos neoliberais. A possibilidade de construção de um mercado escolar competitivo depende da difusão de rigorosos critérios de competição interna que regulem as práticas e as relações cotidianas da escola. A educação deve ser pensada como um grande campeonato.
Texto: Consumindo o outro: branquidade, educação e batatas fritas baratas.
Este texto trata da discussão  das lutas de educadores ativistas para a construção de uma educação mais democrática. Onde Michel Apple relata uma história, que quando passava por uma estrada rural, havia intervalos regulares de pequenas placas de sinalização plantadas na terra, com o símbolo de restaurante de fast food muito famoso dos EUA, fazendo com que a população dessa região migrasse para o centro, onde perderam direitos básicos como, saúde e educação. Por sua vez a empresa já estava empolgada com a oportunidade, pois assim iriam transferir parte de sua produção para a Ásia, uma vez que a nação asiática não aprova os sindicatos e o custo para a implantação seria menor. A partir disso o autor fala sobre o conceito de branquidade e uma das ideias é de relação colonialista, onde não há ou é muito baixa a remuneração. Então durante o período militar na Ásia, não havia escolas, professores, hospitais e muito menos infraestrutura para isso, pois existiam mecanismos muito inteligentes para não fornecer estes serviços.
Texto: Descolonizar o currículo: estratégias para uma pedagogia crítica
Dois ou três comentários sobre o texto de Michael Apple 
No olhar a cerca do discurso de Michel Apple, Tomas Tadeu da Silva aborda conceitos, conexões sociais e políticas ligadas à constituição do currículo reportadas às relações de poder entre educação e sociedade. Promove um entendimento claro da relação social e seu valor pedagógico, desmistificando o senso comum em torno das corporificações do currículo. Como elemento para formação histórica no descolonizar o currículo propõe estratégias que interrompem a dialética vigente e cotidiana, apontando para despertá-lo pela mudança aberta e significativa, reforçando assim a identidade social e a produção do conhecimento.
Texto "A infância como construção pedagógica 
Quando a infância é estabelecida no século XVIII, a pedagogia começa a ser desenvolvida, com os direitos da criança de ser tratada como qual. Preocupa-se então com o lugar e o momento, onde se ensinará a criança, uma vez que na infância possui-se a maior capacidade de aprender; assim se tornou mais fácil para que a criança tenha a noção de espaço dentro da sociedade. Para individualizar a infância é necessário constituí-la como uma essência e nomeá-la para designar uma diferença que terá  de ser institucionalizada em escolas. 
Texto "A educação escolar na virada do século"
Este capítulo traz alguns trechos da música do rapper Gabriel o pensador, onde ele critica a escola dizendo que o aluno só estuda para passar de ano e que após a prova ele esquece tudo. Os meios de comunicação de massa desempenha um papel fundamental, ele cria / destrói personagens, mas a importância da televisão não se limita a época de eleição, ela está presente no cotidiano dos telespectadores.

          CARMEM CRAIDY E GLÁDIS E. KAERCHE

            Educação Infantil, pra que te quero?

            A fase do desenvolvimento em questão é a mais importante da vida do ser humano, pois é dos 0 aos 7 anos que os indivíduos formam a sua concepção de mundo e internalizam conceitos. Para tanto, é importante que pais e mestres saibam muito bem desse desenvolvimento e tenham claros seus objetivos, pois toda a informação dada à criança será armazenada e a partir dela estabelecerá suas relações.
            O livro está dividido em 13 capítulos escrito por especialistas da área que buscam um diálogo com o leitor. Abordam desde os propósitos da escola infantil ao longo da história, as novas definições da legislação segundo a Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (LDB) e o Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA), os estágios do desenvolvimento infantil segundo Piaget, Vygotsky e Wallon, e reflexões sobre literatura, música, ciências, artes, ludicidade, aquisição da linguagem falada e escrita, organização do tempo e do espaço durante as aulas. Também há debate sobre temas de saúde, incluindo até o calendário de vacinas e uma breve abordagem sobre as doenças mais comuns da infância. Um prato cheio!
            Atualmente, é muito comum que os filhos fiquem em pré-escolas durante o horário de trabalho dos pais. Algumas crianças, como já acompanhei, permanecem ali durante as 12 horas de funcionamento. O que a escola deve proporcionar nesse tempo? Segundo os autores, é dever da escola educar e cuidar, ou seja, desenvolver o cognitivo e a psicomotricidade, sem fazer desse ensino um processo mecânico, sem afetividade, sem um olhar atento. Educar cuidando e cuidar educando.
            A escola não é aquele espaço onde a criança apenas aguarda o retorno os pais — ela deve visar o desenvolvimento global do aluno. Sendo assim, é necessário compreender cada estágio de desenvolvimento das crianças, traçar objetivos e auxiliar para que cada um alcance o seu, ao seu tempo. Cuidar é ter a sensibilidade de olhar para cada dificuldade, para cada sintoma de febre, fome, e outras tantas coisas comuns do cotidiano escolar.
Educar e Cuidar são atos que devem respeitar a individualidade do aluno, reconhecendo-o como sujeito de direitos, como prevê a Lei.

Reflexões sobre o Cuidar na Educação Infantil

            Relativas ao cotidiano escolar, a adaptação ao novo ambiente, relacionamento escola/pais, alimentação, uso de chupetas, choro, a tirada das fraldas, fazem parte do cuidar, do estar com olhar atento. Precisamos, enquanto responsáveis pelos pequenos, lembrar que cada um tem o seu ritmo de desenvolvimento, e que serão diferentes reações para as mesmas situações, caso contrário, podem resultar em experiências negativas que são desnecessárias, não é mesmo?
O professor que trabalha com essa faixa etária precisa conhecer e estar atento as fases do desenvolvimento, pois as crianças crescem e evoluem muito rápido. São os 7 anos da vida em que mais desenvolvemos. Por isso faz-se necessária a compreensão dos estágios de desenvolvimento segundo Piaget, Vygotsky e Wallon.
            Estejamos preparados para ser responsáveis por crianças, no caso de doenças e acidentes comuns nessa faixa etária. Nesses momentos, o conhecimento a piori torna-se fundamental, principalmente com relação a prevenção. Ainda, ter claro conceitos de ambiente, higiene, sono e uso de medicações (o livro contém até um calendário de vacinas!).
Temos uma bagagem cultural que nos diz, inconscientemente, que menino age de uma maneira e que meninas agem de outra, que boneca é brinquedo de menina e carrinhos, de meninos. Muitos professores não se dão conta quando chamam atenção das crianças por seus comportamentos, que são naturais e espontâneos, já rotulando e descarregando uma série de pré-conceitos culturais nos nossos pequenos. Meninos que brincam com bonecas podem ser grandes pais no futuro, ao invés de homossexuais, como alguns julgam. Vamos deixar nossas crianças livres desse tipo de pensamento e livres também para poderem fazer as suas escolhas.

Reflexões sobre o Educar na Educação Infantil

            O livro traz uma série de dicas de atividades para organizar melhor o tempo e o espaço na educação infantil. Conforme cada faixa etária, as atividades são diferentes e o tempo em detrimento das mesmas também, e isso é sempre interessante analisar antes — por isso o planejamento. Quanto menor a criança, menor o tempo em atividades dirigidas e maior deve ser o tempo destinado ao brincar. Sobre a organização do espaço também ficam dicas de como melhor aproveitar o espaço externo e interno e as competências que podem ser desenvolvidas.
Muitas vezes deixamos de nos questionar sobre o desenvolvimento da criança e na Páscoa, por exemplo, vamos presenteá-la com um livro (ou eleger um título para a hora do conto, na escola). Ótimo! Que criança não gosta de história? Porém, essa hora do conto pode ir por água abaixo se o livro escolhido não estiver de acordo com a faixa etária. Por isso, é necessária atenção. Vamos nos lembrar de acompanhar o processo de aquisição de conhecimentos, lembrar que as crianças não são um depósito que vamos despejando as informações. O desenvolvimento infantil requer calma e muito zelo.
            Vamos fazer do livro parte do dia a dia da criança! A hora do conto é o momento de formar os futuros leitores, e o ambiente desafiador do ponto de vista linguístico estimulará o interesse pela escrita.
            Achamos uma graça quando as crianças estão nos seus jogos espontâneos de faz-de-conta, imitando pais, professores, o apresentador da televisão, o personagem do desenho animado. Para as crianças, porém, além de ser prazeroso, é uma atitude séria. Através das brincadeiras e da imitação é que as crianças vão compreendendo o mundo em que vivem. Colocar o sapato da mãe é uma forma da menina se sentir integrante do mundo e aprender, se desenvolver. Através da brincadeira, o professor pode observar o que a criança carrega dentro de si, procurando descobrir quais são os desejos que ela representa enquanto brinca, e brincando, fazer as mediações, ajudando dessa forma na superação de si mesmo em busca do desenvolvimento.
Um capítulo que chamou muito a minha atenção foi sobre as práticas musicais. A falta de consciência quanto a nossa prática faz com que acabemos reproduzindo modelos que não estão de acordo com os objetivos que sonhamos alcançar. A simples repetição de ‘musiquinhas’ infantis, reproduzidas em datas comemorativas, não vai fazer com que a criança desenvolva aspectos da musicalidade. E música não é só cantar. É tocar, é pesquisar sons, é apreciar, é compor, por que não? É confeccionar instrumentos, é saber quem é o compositor. Dessa maneira, estamos contribuindo de fato em sua formação.

http://www.lendo.org/educacao-infantil-pra-que-te-quero-carmem-craidy-gladis-kaerche/









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